Deborah Lorenzo – trabalhadora da atenção primária em saúde e Júlia Bachiega – juventude Já basta!

Retrospectiva da pandemia

O período pandêmico no Brasil esteve marcado, desde o início, pela veiculação desenfreada de informações falsas, que tiveram como principal porta-voz o presidente Jair Bolsonaro. Desde a crítica ao uso de máscaras e ao isolamento social, até as mais recentes e criminosas afirmações desincentivando a vacinação de crianças, Bolsonaro e seus apoiadores se portam como inimigos do povo brasileiro.

Bolsonaro segue desferindo ataques constantes à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), ao Sistema Único de Saúde (SUS) e a outras entidades médicas, em uma tentativa constante de desmoralização das mesmas e de seus trabalhadores, que tem como real objetivo o desmonte e privatização de serviços públicos essenciais. 

Com o avanço da variante Ômicron no Brasil e no mundo, o negacionismo bolsonarista ganhou novo impulso, pautado na ideia de ineficácia da vacina e da, incomprovada, “imunidade de rebanho”. No entanto, vale ressaltar que, com o avanço da imunização contra a Covid-19, o número de óbitos diminuiu drasticamente em diversos países, evidenciando a eficácia da vacina contra o desenvolvimento de formas graves desta doença. 

O cenário atual 

O ano mal começou e o país enfrenta uma onda de casos de síndrome gripal. Sem nenhuma retaguarda de insumos básicos para diagnóstico e tratamento, os profissionais e pacientes sofrem com os efeitos da política de desmantelamento do SUS, sobretudo da atenção primária à saúde.

Unidades básicas de saúde foram os primeiros locais a sentirem o baque desta nova onda. Os poucos insumos disponíveis logo se esgotaram. Faltam testes rápidos para Covid-19 e Influenza, medicamentos rotineiros como analgésicos, anti-inflamatórios e xaropes para tosse. Até mesmo equipamentos de proteção individual para os trabalhadores, máscaras, toucas e luvas, estão sendo racionados.

Como consequência das condições precarizadas de trabalho e da crescente exaustão e adoecimentos dos profissionais, o Sindicato dos Médicos de São Paulo (SIMESP), com o apoio de diversos órgãos sindicais da saúde, divulgou no dia 13 de janeiro uma “Carta aberta dos trabalhadores da saúde atuantes nas UBS do município de São Paulo”. O documento revela a dura realidade destes trabalhadores, além de mencionar a superexploração do trabalho com longas jornadas, acúmulo de funções e horas extras contabilizadas apenas como banco de horas, que jamais poderão ser descontadas.

Houve uma tentativa de mobilização por parte das lideranças sindicais em 19 de janeiro. A proposta era uma paralisação das unidades básicas de saúde, UPA e AMA. Contudo, a adesão foi baixíssima, o que reflete os desafios para organizar uma classe cujo nível de consciência política é ainda muito baixo, sem comentar as manobras de repressão e contenção orquestradas pelas organizações sociais de saúde que gerenciam parte considerável destes serviços.

Recentemente, o Ministério da Saúde, via Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos (SCTIE), divulgou uma nota técnica no mínimo criminosa. No documento divulgado em 20 de janeiro a atualização das diretrizes terapêuticas para o tratamento farmacológico da Covid-19 reitera a já mundialmente superada utilização do kit Covid, exaustivamente constatado ineficaz pela comunidade científica mundial. E não para por aí, o documento apresenta uma tabela com as supostas tecnologias para o manejo da doença e sua eficácia conforme os estudos sugerindo que a Hidroxicloroquina (sim, ela voltou!) possui eficácia comprovada, enquanto as vacinas não. Inadmissível! 

É evidente o alinhamento político entre o Ministério da Saúde e Bolsonaro. A nota técnica foi assinada por Hélio Angotti Neto, ultra defensor do tratamento precoce e bolsonarista que, à revelia das recomendações de especialistas – que baniram a utilização do “kit Covid” e recomendam a vacinação, assim como a adoção de protocolos terapêuticos embasados em experiências por todo o mundo – voltou a defender o emprego da Hidroxicloroquina e implantar dúvidas acerca da segurança e eficácia das vacinas.

Pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), apoiados pela FAPESP, publicaram uma carta no Journal of Medical Virology, na qual afirmam que todas as mutações presentes na variante Ômicron, exceto uma, estão presentes nas demais cepas. Isto implicaria diretamente na afirmativa de eficácia das vacinas desenvolvidas até o momento, sobretudo como barreira para o desenvolvimento de complicações e formas graves da doença. 

Segundo Ricardo Durães-Carvalho, pesquisador da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp) apoiado pela FAPESP e coordenador do estudo: “Os dados disponíveis até agora nos fazem crer que as vacinas atuais são de fato eficazes, respeitando as devidas proporções, contra todas as variantes do vírus. E possivelmente serão contra as outras cepas que vierem a surgir”.

O fato é que, até o momento, esta nova cepa tem demonstrado alta taxa de transmissibilidade e doença leve naqueles com esquema vacinal completo ou com reforço.  A OMS já aponta a Ômicron como a responsável pela maioria dos casos de Covid no mundo, em relatório epidemiológico de 11 de janeiro a estimativa era de cerca de 60% dos casos. Dados estes que o bolsonarismo se esforça em distorcer, Bolsonaro continua com seu tom de deboche, exaltando a chegada da nova variante, declarando a pandemia por encerrada e desincentivando a única saída possível para o problema, a vacinação.

A educação é outro setor diretamente afetado pela negligência sanitária em que vive o nosso país, visto que escolas pelo mundo todo contam com estratégias de detecção de casos através de testagem sistematizada, protocolos sanitários e equipamentos de proteção individual adequados para manterem suas atividades regularmente, e sem as quais não é possível um retorno seguro. No Brasil, até o momento, a volta às aulas presenciais está mantida apenas para a educação infantil, fundamental e médio, estando ainda indefinida a situação das universidades. 

Fica evidente a necessidade de reivindicar condições minimamente seguras para o retorno às aulas em todos os níveis, uma vez que estes espaços, sobretudo as universidades, são território de formulação e disputa política e não podem  mais ser abdicados.

Vacina, máscara e testagem em massa já!

O panorama brasileiro apenas coloca em perspectiva aquilo que já denunciamos há tempos, a política de desumanização e mercantilização da saúde, da vida, que Bolsonaro emprega para manter-se no poder e articular privilégios.

Repudiamos qualquer interferência ideológica nos protocolos e diretrizes publicadas pelo ministério da saúde referentes ao manejo da Covid-19. 

Exigimos o avanço da vacinação com a quebra das patentes e um programa Nacional de imunização bem definido, estruturado nacionalmente e que abranja todas as faixas etárias. Bem como protocolos sanitários padronizados, disponibilização de EPI adequado, além de um esquema de testagem em massa que assegure o retorno às atividades presenciais em todos os níveis de ensino. Pelo retorno presencial das universidades, espaços fundamentais para a luta e construção política!

Nos solidarizamos com os trabalhadores da saúde, que enfrentam sérias dificuldades neste momento. Está mais uma vez sobre seus ombros o fardo de contornar a crise sanitária causada pelo governo de Bolsonaro. Estamos juntos nesta luta!

https://pt.unesco.org/news/diante-da-onda-da-omicron-os-paises-conseguem-manter-suas-escolas-abertas 

https://www.poder360.com.br/coronavirus/oms-rebate-fala-de-bolsonaro-sobre-omicron-ser-bem-vinda/ 

http://conitec.gov.br/images/Audiencias_Publicas/Nota_tecnica_n2_2022_SCTIE-MS.pdf 

https://simesp.org.br/noticiassimesp/carta-aberta-trabalhadores-saude-atuantes-nas-ubs-municipio-sp/

https://tab.uol.com.br/noticias/redacao/2022/01/31/carlos-carvalho-o-medico-traido-por-negacionistas-no-enfrentamento-a-covid.htm 

https://www.saopaulo.sp.gov.br/spnoticias/omicron-tem-mutacoes-ja-vistas-em-cepas-anteriores-e-isso-explica-eficacia-das-vacinas/