Morreu na última quinta-feira aos 82 anos Edson Arantes do Nascimento, mais conhecido como Pelé , lenda indiscutível do futebol e o maior goleador de todos os tempos. Junto com ele, morre um pedaço da euforia das massas que assistiram um brasileiro tricampeão mundial fazendo história e transformando o jeito que vemos o esporte.

Pedro Cintra

Pelé, mais do que um gênio com a bola no pé, foi um símbolo do brasileiro negro vencedor no país marcado pelo mito da democracia racial e pelo colonialismo escravista brutal. Seu triunfo com a camisa da seleção brasileira representou para as massas trabalhadoras a expressão mais próxima da emancipação do Brasil de sua posição de colônia. Sua trajetória alimentou a ideia do Brasil destinado a ser uma potência intrusa na ordem dos países de “primeiro mundo”, uma previsão que nunca chegou a se concretizar.

Sua atuação extraordinária em 58 com apenas 17 anos de idade, além de ser peça central ao lado de seus companheiros no primeiro título brasileiro em Copas, calou de uma vez por todas aqueles que associavam as derrotas anteriores da seleção à presença de jogadores negros em campo. 

Pelo seu simbolismo no imaginário das maiorias, sua figura foi apropriada e transformada em propaganda ufanista da ditadura militar em pleno “milagre econômico”, feito que aconteceu às custas do achatamento do salário mínimo e da perda da liberdade de organização dos operários.

Edson conviveu com seus duros poréns: teve uma postura passiva diante da ditadura, esteve distante das lutas sociais do seu próprio país e foi Ministro do Esporte do governo neoliberal de FHC. Em sua vida, encarnou contradições como qualquer um, algumas mais amargas do que outras, mas nenhuma maior que a sua importância para a cultura popular e para o futebol.

Pelé foi absoluto, mas não inquestionável, assim como deve ser.  Reivindiquemos sua memória a partir da alegria das multidões que se encantavam ao vê-lo desfilar nos gramados e sentiam, alguns pela primeira vez, que era possível vencer.