Situação de inoperância do RU

Após dois anos de pandemia, os estudantes ao voltarem às aulas presenciais se deparam com situação precária nas universidades federais. Isso ocorre em parte devido à política de corte de gastos do governo Bolsonaro e em parte devido ao processo de terceirização dos serviços e descaso das reitorias. 

MARCOS VIEIRA pela Juventude Já Basta!

Após quase dois anos sem atividades presenciais regulares nos campi da Universidade Federal do ABC devido aos protocolos de saúde adotados devido a pandemia de Covid-19,  a Pró-reitoria de Assuntos Comunitários e Políticas Afirmativas da UFABC (ProAP), em reunião com entidades estudantis no mês de Maio de 2022, deliberou sobre situação do Restaurante Universitário da UFABC (RU). O encaminhamento foi que seguiria inoperante nos dois campus, Santo André e São Bernardo do Campo, mesmo com o retorno às aulas presenciais da universidade, que foi reestabelecido no início do mês de Junho.

No intuito de mitigar os impactos que a ausência RU causaria no retorno presencial, foram tomadas medidas paliativas que, conforme citado anteriormente, “já estavam previamente acordadas com as entidades estudantis.” A mais importante delas consiste na oferta de marmitas à comunidade universitária subsidiadas a um valor de R$11,00, “não inclusos neste valor: talheres, suco e sobremesa para evitar custos adicionais com aquisição de talheres descartáveis na cantina).”

Outra medida utilizada foi a instalação de micro-ondas nos refeitórios dos restaurantes dos dois campi para aquecimento das refeições trazidas pelos alunos e servidores. Também foi mantido o pagamento do Auxílio Alimentação Excepcional de R$13,50 por refeição para discentes, “de acordo com os critérios estabelecidos pela PROAP”, e que só foi possível ser fornecido devido a realocação do valor do subsídio anteriormente pago à empresa do restaurante universitário. 

A UFABC reitera que, no âmbito da administração universitária, “as abruptas limitações no orçamento têm deixado cada vez mais complexa a tarefa de garantir as bases para a inclusão e para a permanência estudantil, o que continua sendo prioridade nas diretrizes orçamentárias.” Porém, a demora em retomar o restaurante universitário, além de um prejuízo à comunidade acadêmica, impacta também servidores e os trabalhadores que prestam serviços às empresas terceirizadas de alimentação, que em meio a uma das maiores crises de desemprego do Brasil, ao não serem contratados ficam sem seus investimentos e são empurrados aos crescentes índices de desemprego e da pobreza.

Sobre contratação do serviço de RU

Segundo a universidade, “desde antes da definição do retorno presencial, em abril de 2022, a PROAP vem encaminhando as devidas tramitações para garantir a contratação da prestadora deste serviço à comunidade UFABC”. Mesmo com todos os termos de contratação adiantados, a abertura do processo para ampla concorrência dependia da confirmação de que o retorno às atividades presenciais seria integral. “Isso porque as informações quantitativas sobre o número de pessoas que circulam diariamente nos campi, assim como, a estimativa diária de refeições, são variáveis definidoras para precificação deste serviço e fundamentais para garantir interesse das empresas em participarem do processo licitatório.”

A UFABC ainda salienta que “somente a partir do início da operação do RU, o serviço de fornecimento de marmitas poderá vir a ser suspenso. O acordo firmado com as cantinas tem prazo oficial até 17/9 e só pode ser interrompido antes da data estipulada mediante comum acordo.”

Essa, a nosso ver, não é uma justificativa plausível, pois, mesmo com a presença de alunos especiais é totalmente possível fazer uma previsão da quantidade de alunos que iriam retomar às aulas presenciais através de pesquisas prévias e outros meios. Assim em uma demora injustificável, na segunda-feira, 30 de maio, às vésperas do retorno presencial, finalmente o contrato com a Real Food foi formalizado e a empresa segue em reuniões com as equipes administrativas e de Nutrição da UFABC para definir o prazo de início de sua prestação de serviço na Universidade (prazo este, a mais de um mês ainda indefinido), e que deve fornecer as refeições pelo valor integral de R$14,88, cada uma (incluindo suco e sobremesa), sobre o qual será aplicado o subsídio de 60% para discentes.

Luta das Universidades Federais diante de um projeto de desmonte 

As universidades federais sofreram um corte de 7,2% nos seus orçamentos assinado pelo governo federal em 03 de junho, o que pode prejudicar o investimento em pesquisas e até levar a oferta de um número menor de vagas nos próximos semestres. O percentual de corte inicialmente era o dobro, no dia 23 de maio de 2022 o Ministério da Educação na gestão atual de Victor Godoy, chegou a anunciar o corte de 14,5% para as universidades federais, o que prejudicaria duramente o trabalho e o funcionamento. O bloqueio do orçamento só foi reduzido para 7,2% depois de muita negociação que durou uma semana,  e só foi reduzido após mobilização das universidades na esfera política. O professor Dácio Roberto Matheus, reitor da UFABC, relatou em matéria ao Repórter Diário o drama que o conselho universitário da instituição vive para manter as atividades com menos recursos.

Os sucessivos cortes na educação e os recentes escândalos de corrupção no MEC que vêm ocorrendo no governo Bolsonaro, apontam para um projeto de desmonte do ensino superior orquestrado desde que passou a vigorar o Teto de Gastos emplacado sobre o falso manto discurso de austeridade fiscal.

Conhecida como “Teto de Gastos” a Emenda Constitucional (EC) 95/2016., limitou por 20 anos os investimentos públicos do Governo Federal. Logo, a soma das despesas de áreas como defesa, educação, segurança pública, previdência, saúde e todas as outras não pode ultrapassar o investimento do ano anterior, corrigido apenas pela inflação (mesmo diante do aumento populacional).

Em 2019, no primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro, a verba para investimento nas universidades federais despencou para R$ 760 milhões – apenas 27,34% do que foi aplicado em 2010. O gráfico abaixo mostra como esse impacto refletiu sobre UFABC.

Figura 1 – Orçamento da UFABC – Custeio e Investimento, de 2013 a 2021 (valores nominais em milhões de reais)

Qual a saída?

Diante de um governo reacionário que não respeita e valoriza a produção do conhecimento científico, ficaremos cada vez mais reféns da lógica do capital financeiro e distantes das nossas potencialidades de crescimento e de desenvolvimento. Portanto, é preciso que toda a sociedade e principalmente a comunidade acadêmica, duramente afetada, retome as mobilizações que historicamente, fazem parte do DNA dos movimentos estudantis. 

Não se pode ter uma saída favorável sem que seja imposta pela mobilização e organização, obviamente que tirar Bolsonaro do poder é fundamental, porém isso não será feito sem mobilização. Além disso, não basta apenas votar contra Bolsonaro, pois o próximo governo só tomará medidas favoráveis a partir das mobilizações nas ruas.

Em âmbito nacional, temos que enfrentar a luta contra  a Emenda Constitucional 95/2016 e a política do governo Bolsonaro que com fins eleitorais quer reduzir os impostos dos combustíveis através da redução de ICMS dos estados, o que repercutirá na falta de verbas para os setores sociais. Enquanto a EC 95 estiver vigente e Bolsonaro não for retirado do poder, os cortes serão cada vez mais constantes. É preciso lutar nas ruas para derrubar a EC 95, pois será difícil para nosso país avançar na qualidade da educação.

Somente teremos saídas favoráveis em âmbito nacional e local se estivermos mobilizados. O exemplo da demora em relação ao restabelecimento do RU só pode ser entendido pelo processo de terceirização dos serviços nas universidades e por uma gestão burocratizada que está distanciada das necessidades da nossa comunidade. Por isso, além da luta macro contra a EC 95 e contra esse governo neofacista, a mobilização permanente nos âmbitos locais para atender às nossas reivindicações imediatas, contra os processos de terceirização/privatização dos serviços e pela democratização da gestão Mas isso, apenas poderemos conquistar reivindicações imediatas e novas reivindicações, e avançar na luta por uma universidade pública inclusiva para todos retomando o valioso sentido do movimento estudantil, como um grande instrumento de luta da juventude trabalhadora.

Fontes:

https://www.ufabc.edu.br/noticias/informe-proap-sobre-restaurante-universitario-e-retorno-presencial 

https://g1.globo.com/educacao/noticia/2022/06/03/ministro-diz-que-governo-diminuiu-para-r-16-bi-o-corte-na-verba-das-universidades-federais.ghtml

https://www.reporterdiario.com.br/noticia/3111619/universidades-federais-lutam-para-evitar-corte-de-vagas-e-em-pesquisa/

https://g1.globo.com/educacao/noticia/2020/08/23/universidades-federais-perdem-em-10-anos-73percent-da-verba-para-construir-laboratorios-fazer-obras-e-trocar-computadores.ghtml

https://www.ufabc.edu.br/noticias/corte-de-18-no-orcamento-de-2021-coloca-em-risco-funcionamento-da-ufabc