Por Beto Vieira e Gabriel Barreto
O SEMASA (Serviço Municipal de Saneamento Ambiental de Santo André) completa em outubro próximo 50 anos de existência. A autarquia está entre as empresas mais bem avaliadas do setor e, graças aos seus serviços, Santo André está entre as cidades com melhores índices de prestação de serviço ambiental. O SEMASA é responsável pelo abastecimento de água, coleta de esgoto, drenagem, varrição de ruas, coleta e armazenamento dos resíduos sólidos e, ainda, fiscalização ambiental.
Nos últimos vinte anos, uma suceção de erros dos governos do município, juntamente com a política de privatização do governo do estado através da SABESP colocaram a empresa na rota da privatização. Durante o mandato do prefeito Celso Daniel, a prefeitura decidiu contestar judicialmente o preço da água fornecido pela Sabesp que é quem tem a autorização da agência estadual para a captação e distribuição da água tratada no estado. Ao não repassar o preço aos consumidores o SEMASA deixou de pagar o preço cobrado pela Sabesp, o que gerou uma suposta dívida que ultrapassa R$ 3,6 bilhões – segundo a cobrança judicial -, causa essa que foi ganha pela Sabesp.
Para solucionar tal impasse, o atual Prefeito Paulo Serra (PSDB), alinhado com o Governo Doria, está prestes a entregar para a Sabesp a parte mais rentável do SEMASA, que é o setor de água e esgoto. Há claras semelhanças deste caso com o processo de privatização de outras autarquias do setor público a nível municipal, estadual e federal realizadas por uma série de governos de orientação neoliberal. Os setores mais rentáveis são justamente os primeiros a serem vendidos em trocas desvantajosas e praticamente simbólicas.
No caso de Santo André, não é vendido para a população o discurso de que há déficit ou “rombo” nas contas da autarquia, mas de que há uma dívida com a SABESP sobre a qual pouco se sabe sua origem. Na verdade, a intenção do governo de São Paulo, que é alinhado com o prefeito de Santo André, é aprovar um acordo semelhante ao que foi adotado em Diadema em 2013. Nesta época, o município do grande ABC aprovou a entrega da SANED (Companhia de Saneamento Básico de Diadema) para a SABESP para que fosse encerrada uma dívida de 1.1 bilhão.
O município de Mauá segue na mesma linha, também em dívida com a SABESP e pode ter parte de seus serviços entregues. Ou seja, são governos neoliberais que tem como uma de suas estratégias transferir empresas locais, mesmo quando não são onerosas, para a SABESP. Empresa cada vez mais submetida a uma lógica rentista e privatista.
E a SABESP nisso tudo?
Além de demonstrar a generalização da situação do SEMASA, precisamos fazer alguns apontamentos.
Numa análise rápida da situação pode parecer que se trata da passagem de um serviço prestado por uma empresa pública municipal para uma empresa pública estadual que presta o mesmo serviço a nível estadual, uma troca simples que não afeta em nada a população. Por isso, devemos procurar entender o caráter da SABESP sob a lógica de mercantilização dos recursos naturais. É uma empresa de capital misto com suas ações listadas na bolsa de valores de Nova York desde 2002.
O acionista maior é o Estado, isso permite manter certa aparência diante de questionamentos. Porém, ao mesmo tempo, quase metade das ações são controladas por investidores que podem estar preocupados com muitas coisas, menos com o uso sustentável dos recursos naturais pela empresa. O único desejo destes investidores é que as ações da SABESP sejam cada vez mais valorizadas para que possam realizar cada vez mais lucros especulativos.
Durante esse processo de abertura de capital da SABESP, é importante destacar que, por ao menos cinco anos, desde a abertura das ações na bolsa de valores, não havia nenhum órgão regulador das atividades da empresa. A Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo (ARSESP) foi criada em 2007 e seus diretores são escolhidos pelo governo estadual tucano.
A criação de agências reguladoras é uma medida defendida por diferentes frações da burguesia, os reformistas afirmam que a regulação é uma forma de conter os “abusos do poder econômico”, um Estado regulador que visa criar normas e criar mecanismos jurídicos que podem abalar a “harmonia social”.[1]
Existem denúncias publicadas sobre o caráter da SABESP, ativistas e técnicos no assunto denunciam que a distribuição, a qualidade, os investimentos em infraestrutura e uma política de redução no consumo não fazem parte da agenda da empresa.
Devemos recordar também a crise hídrica no Sistema Cantareira de 2014 que afetou milhões nos grandes centros urbanos e em cidades do interior do estado de São Paulo. Nessa época, alguns especialistas já alertavam e anunciavam que a crise de abastecimento não era culpa de São Pedro.[2] Nesse sentido, vai a incorporação de parte do SEMASA para a SABESP, não é à toa que justamente o serviço de água e esgoto está sendo cobiçado.
Como ficam os trabalhadores do SEMASA?
Toda negociação do prefeito com a SABESP está sendo feita sem nenhuma consulta e nem mesmo informação aos cerca de mil funcionários do SEMASA. É como se todos fossem um produto sendo negociado e sem nenhuma consideração aos trabalhadores da empresa e à população de Santo André.
É necessário que o prefeito Paulo Serra abra espaço para participação dos trabalhadores em todo processo de negociação com a SABESP para que possam se colocar contrários a essa medida. Mas é preciso ir além, apesar de não haver ameaça iminente de perda dos empregos, é preciso encarar a experiência de outros municípios que passaram pela mesma situação, como estão hoje os trabalhadores da SANED, em Diadema, por exemplo? Essas transformações levaram a cortes de empregos e precarização?
A manutenção do SEMASA sob a administração de Santo André é do interesse dos trabalhadores e da maioria da população andreense! No entanto, precisamos lutar também por um SEMASA sob controle dos trabalhadores e da população andreense!
Somos contra água e esgoto estarem sob controle de uma SABESP rentista, sem compromisso com o meio e com a população e com ações na bolsa de valores para benefício único e exclusivo de seus acionistas!
[1]Fundação Perseu Abramo: https://fpabramo.org.br/2013/10/07/o-estado-como-agente-executor-regulador/