Nos dias 24, 25 e 26 de Abril de 2023 será realizado em São Francisco o primeiro Congresso Internacional dos Trabalhadores por Aplicativos.

Por Agustín Sena – 1º de dezembro de 2022

O evento é convocado pela coordenação Alianza Unidxs World Action, que reúne organizações de trabalhadores por aplicativos de todo o mundo, depois de ser proposto pelo SiTraRepA (Sindicato de Base de Trabajadores de Reparto por Aplicación) na Argentina.

A SiTraRepA surgiu em meio à pandemia, quando entregadores argentinos de empresas como Rappi e PedidosYa iniciaram uma série de reivindicações sobre as condições de trabalho e contratação no setor, marcadas por uma forte precarização do trabalho. No processo, eles criaram o que é agora o primeiro sindicato nacional neste novo ramo de trabalho, que luta pelo reconhecimento no Ministério do Trabalho e já acumulou 2.000 sindicalizados em todo o país. Ao longo do caminho, membros do sindicato argentino participaram em várias ocasiões do Fórum contra a Uberização do Trabalho em Bruxelas, talvez o primeiro precursor do Congresso dos Trabalhadores de Aplicativos.

Um importante evento fundacional

Belen, Secretária Adjunta da SiTraRepA disse à IzquierdaWeb que o Congresso de São Francisco será “um importante evento fundacional” para os trabalhadores do setor. “Estamos falando de um novo ramo da economia que dá forma a um novo setor da classe trabalhadora”, disse ela, referindo-se ao fenômeno da chamada gig economy.

As plataformas de aplicativos têm atraído a atenção internacional nos últimos anos. Não apenas por causa de sua ascensão meteórica durante a pandemia, mas também por causa das formas precárias de contratação sob as quais mantêm os trabalhadores. Empresas gigantes como PedidosYa e Rappi na América Latina, mas também a Amazon e Uber a nível internacional são casos exemplares deste novo “modelo de negócios” baseado na precarização.

Para a Secretária Adjunta da SiTraRepA, o fenômeno dos aplicativos trouxe “novos regimes de exploração” para o mercado de trabalho, mas também “novas formas de organização e resistência” por parte dos trabalhadores do setor.

Trabalhadores do mundo, uni-vos

O Congresso dos Trabalhadores por Aplicativos será o primeiro evento deste tipo e reunirá trabalhadores de todo o mundo para compartilhar suas experiências organizativas e sindicais. Desta forma, eles esperam fortalecer a luta pelos direitos trabalhistas neste novo ramo de trabalho.

O Congresso terá como slogan “Gig workers of the world, unite! We are workers, not collaborators! We want our unions and full labour rights! Somos trabalhadores, não colaboradores! Queremos nossos sindicatos e todos os direitos trabalhistas”.

“Essa é a ideia principal”, diz Emilse, Secretária de Imprensa da SiTraRepA, “de compartilhar experiências e construir um plano de luta  internacional contra esse esquema que as empresas fazem pelos aplicativos.”

O evento contará com a presença de delegações de diferentes países das Américas, como Estados Unidos, Argentina, Colômbia, México, Equador, Brasil e Paraguai. Representantes dos trabalhadores de aplicativos europeias também estarão presentes. São organizações que trabalham há meses para estabelecer uma coordenação internacional dos trabalhadores do setor, assim como para lutar pela melhoria das condições de trabalho e da legislação trabalhista em seus respectivos países.

Entre os convidados se destacam lideranças do novo sindicalismo do século XXI. É o caso dos trabalhadores da Amazon, que vem da conquista do seu primeiro sindicato a partir das bases nos Estados Unidos, e da Starbucks, que caminham no mesmo sentido.

A luta contra os gigantes da precarização

O Congresso de São Francisco terá vários painéis tratando das condições de trabalho por aplicativos, da legislação trabalhista no setor em condições pós-pandêmicas, da coordenação internacionalista na luta do setor e dos desafios do sindicalismo de base no século XXI. Além das organizações sindicais e dos trabalhadores, participarão dos painéis pesquisadores e assessores jurídicos especializados em trabalhos por aplicativo e na legislação do setor, agora objeto de debate em todo o mundo.

Uma assembleia e uma mobilização nas ruas de São Francisco também estão previstas. A cidade que sediará o primeiro Congresso de Trabalhadores por Aplicativos é a sede do famoso conglomerado do Vale do Silício e é a sede de importantes empresas do setor, como a Uber. Há alguns meses, esta empresa multibilionária estava no olho do furacão depois de vazados os seus arquivos. O vazamento maciço de documentos expôs as táticas de lobby parlamentar que permitiram à multinacional contornar a legislação trabalhista em dezenas de países.

Não é surpreendente que São Francisco (e Califórnia) seja um dos lugares onde os trabalhadores por aplicativos estão fazendo suas exigências serem ouvidas. Lá, os motoristas da Uber e outros aplicativos como Lyft, agrupados na Mobile Workers Alliance (MWA), estão dando passos concretos em direção à sindicalização. Hoje eles estão agrupados no California Gig Workers Union.

Não faz muitos anos, São Francisco viu o nascimento e a difusão do novo império tecnológico, com algumas das empresas mais rentáveis (e precárias) do planeta. Além do Uber, empresas como Google, Facebook, Apple, Yahoo, Tesla, Twitter e a própria Rappi estão agora sediadas na região. A fortuna de magnatas como Mark Zuckerberg e Elon Musk foi construída no Vale do Silício.

O “lado B” da história do Vale do Silício é a realidade de milhões de trabalhadores por aplicativos, aqueles que giram a roda da fortuna dos magnatas e, em troca, recebem uma precarização crescente. Mas os trabalhadores por aplicativos estão começando a fazer ouvir suas vozes.

“Vemos que no mundo existe um setor de trabalhadores que está começando a se organizar a partir da base, como fizemos em nosso país com o SiTraRepA, criando sindicatos de base, organizando-se pelos direitos trabalhistas”, diz a Secretária de Imprensa do sindicato argentino, explicando as razões do chamado para o primeiro Congresso de Trabalhadores por Aplicativos. “Parece-nos importante poder ir ao coração deste processo, que está ocorrendo especialmente nos Estados Unidos, e também trazer nossa experiência, para compartilhar nossa luta contra as novas formas de exploração que vêm com o trabalho por aplicativos”.

Parece que, em 2023, a cidade testemunhará importantes passos sindicais e organizacionais para os trabalhadores de aplicativos.