POR REDAÇÃO
O SEMASA é uma empresa pública de Santo André, cidade do ABC Paulista, que presta serviço de saneamento ambiental no município. Essa empresa, por políticas de gestões anteriores, teria gerado uma suposta dívida bilionária com a SABESP. Com a justificativa de saldar essa dívida, o prefeito da cidade, Paulo Serra (PSDB), encaminhou para a Câmara dos Vereadores um Projeto de Lei que na prática significa um processo de privatização. Para entender melhor esse processo, Beto Vieira, militante do PSOL e histórico militante da região do ABC, concedeu-nos uma entrevista sobre o tema e as lutas que estão sendo travadas para defender que a empresa continue estatal e passe a ser controlada pelos munícipes e trabalhadores.
SoB – Fale um pouco da sua trajetória como militante e como funcionário público de Santo André.
Beto – Completei agora em abril quarenta anos de militância social. Tudo se iniciou nas greves dos metalúrgicos de 1979, depois desse período fui para a construção civil de São Bernardo do Campo, onde atuei como “cipeiro” (membro da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes – CIPA) e Diretor do Sindicato. Fui Assessor Parlamentar em Santo André e há dez anos estou funcionário do SEMASA, onde também já fui cipeiro e atualmente faço parte de um grupo de oposição sindical à atual gestão do Sindicato dos Funcionários Públicos de Santo André.
SoB – Quando foi fundado o SEMASA e quais os serviços que presta à população da cidade de Santo André?
Beto – Em 1969, é uma empresa cinqüentenária, faz aniversário agora em outubro. O fornecimento de água, capitação de esgoto, coleta e destinação final do lixo, varrição de ruas e fiscalização ambiental, é este o conjunto de serviços executado pela empresa. É bom salientar que levantamentos anteriores demonstram que o SEMASA possui um patrimônio material que supera R$10 bilhões, sem falar no seu patrimônio imaterial, que são mais de cento e vinte mil clientes e setecentos e quinze mil consumidores mensais.
SoB – Gestores alegam haver uma dívida bilionária (R$ 3,6 bi) do SEMASA com a SABESP, qual é a origem e procedência dessa dívida?
Beto – O SEMASA produz apenas 5% da água que abastece a cidade, os outros 95% compra da SABESP – empresa de economia mista que tem o governo do Estado como sócio majoritário. No final dos anos 1980, o SEMASA decidiu contestar o valor cobrado pela Sabesp pela água fornecida, já que o preço cobrado pela empresa estadual chegava a ser quase o dobro do valor da água produzido pelo SEMASA, isso acabou no decorrer do tempo gerando uma suposta dívida bilionária, já que houve uma cobrança judicial com decisão favorável a SABESP. Segundo informes, uma primeira decisão cria uma dívida de R$1.2 bilhões e uma segunda, já arbitrada em primeira instância, acrescenta R$2,4 bilhões, totalizando um montante de R$3,6 bilhões de divida.
SoB – Qual é o principal teor do PL 20/2019 enviado pelo prefeito Paulo Serra para a Câmara dos Vereadores?
Beto – É um projeto autorizativo, em que o prefeito pede que os vereadores lhe deem carta branca para negociar com a SABESP a transferência do nosso sistema de água e esgoto. A justificativa do prefeito é que com essa transferência, estaria resolvido o problema com a pseudo dívida e ainda teria um investimento de R$ 700 milhões em infraestrutura em vinte anos.
SoB – Vivemos um processo intenso de mercantilização dos recursos naturais, notadamente dos recursos hídricos, existe alguma relação entre a privatização da SABESP e sua atual lógica rentista com o PL 20?
Beto – Totalmente vinculado, precisamos atentar para uma política nacional neste sentido, é só vermos as medidas que vêm sendo tomada em todas as instâncias de governo. No Senado Federal, a Comissão de Constituição e Justiça acaba de dar parecer favorável à uma Medida Provisória que muda a responsabilidade da gestão do saneamento, que hoje é dos municípios e dos estados, para o governo federal. É uma decisão privatista e que tem como relator o senador Tarso Jereissati (PSDB), que também é sócio da Coca-Cola, uma das empresas que atua de forma pesada pela privatização da água. No Estado de São Paulo, o governo João Dória (PSDB) atua como real representante da iniciativa privada e já decidiu pela privatização da SABESP. Aqui, em Santo André, o prefeito Paulo Serra (PSDB) tenta através do PL 20/19 entregar a água e o esgoto, principal fonte de renda do SEMASA e bem de primeira necessidade da população para a SABESP, ou seja, para os empresários. Portanto, não resta a menor dúvida de que estamos na rota dos defensores da iniciativa privada, e a água foi transformada em mercadoria lucrativa dos capitalistas.
SoB – Esse projeto foi enviado na surdina pela prefeitura para ser votado a toque de caixa, como foi à reação dos trabalhadores e dos munícipes de Santo André? Quais são os próximos passos para a resistência?
Beto – Exato, esta é mais uma das características da política do Prefeito Paulo Serra, prima pela falta de democracia. É bom salientar que o PL não foi discutido pela população e muito menos pelos funcionários. Nem o COMUGESAN, que é o Conselho responsável pelos pareceres administrativo da empresa, foi consultado. O PL foi protocolado na Câmara por volta das 14h30m já com pedido de sessão extraordinária para ser votado em segunda votação no mesmo dia. Felizmente esse plano foi descoberto e houve uma movimentação via rede social nos grupos que mantemos, conseguimos dessa forma mobilizar cerca de 150 pessoas para impedir a tramitação. Essa mobilização somada à participação da oposição na Câmara, permitiu que o PL ficasse parado na Comissão de Constituição e Justiça. Ou seja, o plano dos entreguistas falhou neste primeiro momento. Nós já estamos há mais de três anos nesta luta, criamos o movimento O SEMASA É NOSSO e, em assembleia dos Trabalhadores do SEMASA, elegemos uma Comissão para organizar a luta contra a entrega. Nessa mesma assembleia, decretamos Estado de Greve Permanente. Atualmente, a principal tarefa é manter a mobilização dos funcionários e, também, a vigilância aos vereadores de oposição. Além de iniciativas Jurídicas, estaremos todas terças e quintas-feiras na Câmara Municipal, pois a qualquer momento a base do prefeito pode levar esse PL entreguista à votação.