Crescimento eleitoral e necessidade de construir uma alternativa política independente
Nuclear a militância nos locais de trabalho, estudo e moradia, construir a luta unitária contra o neofascismo nas ruas
APRESENTAÇÃO
- O PSOL teve uma participação significativa nessas eleições, ampliou sua bancada de deputados federais e estaduais, elegendo 10 federais e 18 estaduais e superou a antidemocrática cláusula de barreira, atingindo cerca de 3% do eleitorado;
- Apesar do método equivocado da direção do partido em relação ao debate interno sobre tática eleitoral, candidatura a presidente e programa, o partido constituiu uma aliança eleitoral com setores partidários e do movimento social que ampliaram a sua inserção na vanguarda;
- Somado a isso, a participação política do PSOL nas eleições, suas propostas de reversão de todas as contrarreformas de Temer e o combate que fez a Bolsonaro, levou a renovação do interesse por nosso partido e grande afluência de companheiros/as interessados em participar como filiados/militantes;
- Apesar desses resultados, sabemos que poderíamos ter avançado mais, que existem problemas políticos, metodológicos e organizativos a serem enfrentados para darmos conta dos desafios que vêm pela frente com a eleição de um governo com características bonapartistas e apoiado por setores protofascistas;
- Estamos assim convidando os/as companheiros/as para discutir, contribuir com a formulação e assinando esse Projeto de Balanço Eleitoral de 2018. Para tanto, dispomo-nos ao debate franco e fraternos com o objetivo de preencher lacunas, corrigir equívocos, aprofundar caracterizações e linhas políticas, tudo isso objetivando construir um documento que sirva para aprofundar nossa formação militante, melhorar nossa intervenção na realidade e organizar o nosso partido na base para enfrentar os enormes desafios que vêm pela frente.
AVANÇO DO REACIONARISMO NO MUNDO, CRISE E POLARIZAÇÃO
- A eleição de Bolsonaro ocorre em uma situação mundial marcada por uma crise econômica prolongada. Crise iniciada em 2008 que impactou profundamente a economia dos países da América Latina a partir de 2012 devido à queda mundial do preço das commodities. No Brasil, a crise provocou estagnação econômica, asfixia financeira do Estado para os gastos nos serviços públicos, queda do rendimento do trabalho e desemprego em massa;
- A crise econômica mundial foi pano de fundo para rebeliões populares em escala mundial que derrubaram ditaduras incrustadas há décadas em países do Norte da África e também para convulsões sociais em várias partes do mundo contra cortes orçamentários e ataques aos direitos sociais;
- Essa onda de rebeliões populares, devido aos seus limites políticos, organizativos e estratégicos, não conseguiu derrotar os regimes políticos que enfrentaram e nem os ataques neoliberais aos direitos dos trabalhadores, o que levou a um processo de reabsorção desses processos e volta a “normalidade”;
- Contexto que permitiu um novo giro político à direita na situação mundial, expresso em fenômenos como a eleição de Trump nos EUA, o Brexit (Britain Exit) na Inglaterra, o ascenso neofascista no parlamento em países da Europa, a derrocada dos governos de conciliação de classes e a eleição de governos neoliberais na América Latina. Entramos, desta forma, em uma situação política mundial que convive com uma polarização político-social que produz fenômenos contraditórios com a tendência predominante à direita;
- A manutenção da crise econômica prolongada, a crise do bloco europeu, a guerra comercial entre EUA e China e a luta de classes que se dá em várias partes do mundo, ocorre a partir de ondas de choque entre governos e setores expressivos da população trabalhadora, da juventude, das mulheres e dos oprimidos, estabelecendo uma importante contra-tendência que faz com que essa situação mundial seja marcada por uma “’bipolaridade”. A título de exemplo, o dia seguinte à eleição de Trump, um populista de extrema-direita, foi seguido de um massivo movimento de mulheres que reuniu mais de um milhão nas principais cidades dos EUA em protesto às posições misóginas do presidente recém-eleito;
- Estamos em uma situação marcada por uma polarização que não permite a estabilização duradoura do cenário político de forma que a classe dominante imponha seus pacotes neoliberais, suas contrarreformas, seus ataques aos direitos democráticos sem que ocorram importantes processos de resistência.
UM GOVERNO SEMIBONAPARTISTA
- É nesse marco político mais geral que se insere a eleição de Jair Bolsonaro. Uma eleição que confirma o giro à direita da situação mundial e que tem impacto político internacional, na América Latina e, principalmente, no seu Cone Sul;
- Bolsonaro teve no segundo turno da eleição 55,13% dos votos válidos e Haddad 44,87. Quando se olha pelo lado dos votos totais foram 49,85% para Bolsonaro, 40,6% para Haddad, 7,43% votos nulos e 2,14% de brancos e 21,3% não compareceram à eleição. Tendo como base de comparação o segundo turno de 2014, houve um crescimento significativo de votos nulos, de 4,6% a 7,43%, nos votos brancos, de 1,7% a 2,1%, já as abstenções se mantiveram estáveis;
- Somados abstenções, votos brancos e votos nulos, temos um total de 28,87% do eleitorado que não deu aval para nenhum dos dois candidatos, número que somado aos 40,6% que obteve Haddad equivale a um total de 69.47% da população que não deu aval eleitoral para o futuro governo;
- Existe um questionamento latente do regime, das instituições e dos partidos que não se fechou desde 2013, por mais que o pêndulo tenha girado fortemente para a direita. Evidentemente, isso não significa que a eleição não tenha servido como instrumento de legitimação do futuro governo. Mas, o resultado eleitoral e a “onda democrática” formada contra o neofascismo, indicam que Bolsonaro não sai totalmente legitimado do processo;
- Soma-se a esse cenário o fato de que, tirado toda a cortina de fumaça em torno do “mito” antipetista, que irá combater implacavelmente a corrupção, vão restar os duros ataques econômicos, políticos e sociais contra a maioria do povo. Ataques esses que se enfrentaram com um movimento dos trabalhadores, das mulheres, dos negros e da juventude que têm grandes reservas de combatividade que pode gerar crise política, instabilidade e polarização;
- Estamos em meio a uma situação política com características reacionárias e diante de um governo (semi)bonapartista que pode abrir as portas para uma mudança qualitativa do regime, mas tendemos a choques políticos entre esse governo e sua base protofascista, de um lado, e o movimento dos explorados, dos oprimidos e em defesa dos direitos democráticos, de outro. Choque político não-eleitoral, mais real, portanto, que o seu resultado não pode ser definido antes do embate.
AVANÇO DA ONDA REACIONÁRIA
- Nesse projeto de balanço cabe pontuarmos para aprofundamento posterior quais foram as principais razões que permitiram esse fenômeno eleitoral de extrema-direita que abarcou parte importante do grande capital, da classe média alta e dos trabalhadores;
- A eleição do neofascista Bolsonaro tem o objetivo de estabelecer uma situação reacionária preventiva para suspender o direito à organização/mobilização e, a partir daí, impor contrarreformas regressivas em todos os campos, o extermínio da juventude negra em nome da segurança pública e privatizações generalizada das riquezas nacionais;
- Esse quadro só pode ser compreendido a partir de um giro político-eleitoral à direita capitaneado pela grande burguesia, pelo capital financeiro, pelas igrejas neopentecostais e setores da classe média alta. Esses são os setores que dão o “consentimento ativo” para esse projeto, daí sai seus financiadores, intelectuais, operadores, publicistas e lideranças;
- Mas esse projeto só pôde obter vitória eleitoral ao arrastar setores amplos da classe média, dos trabalhadores e dos mais pobres. Pesquisas eleitorais demonstram que Haddad contou com o apoio da maior parte da população de baixa renda, das mulheres e da população nordestina. No entanto, Bolsonaro só chegou à presidência com votos de parte significativa desse eleitorado que acabou por lhe dar “consentimento passivo”;
- Pensamos que temos que encontrar as razões para esse processo na crise econômica mundial que atingiu o Brasil em cheio no ano de 2012. A queda acentuada do preço das commodities provocou uma queda brutal na balança comercial, nas contas correntes do governo e acentuou o déficit fiscal, colocando abaixo o edifício econômico montado sob a produção de bens primários;
- Assim, começa uma operação no interior da classe dominante no sentido de se inclinar para a ruptura com o pacto social lulista por considerar que era necessário reestabelecer um “governo burguês normal” no Planalto, pois o lulismo pelas suas relações com o movimento social não poderia levar a fundo os ajustes e as contrarreformas necessárias para um novo período de valorização do capital;
- Primeiro, a classe dominante inclinou-se paulatinamente para a solução do impeachment, impondo o reacionário governo Temer. Como esse não foi capaz de aplicar todas as medidas consideradas “necessárias” e “urgentes”, parte significativa da classe dominante inclina-se para o estabelecimento de um governo bonapartista (autoritário) que crie as condições política necessárias para impor até o final as contrarreformas;
- Esse giro reacionário se deu em base a uma operação ideológica que contou com importantes frações da burguesia (agroindústria, indústria de armas, altas finanças e etc.), da intelectualidade, da grande mídia, das igrejas neopentecostais e do comando das forças armadas, objetivando convencer frações das massas de que o grande entrave para o crescimento econômico, para a criação de emprego, para a melhoria dos serviços públicos são os esquemas de caixa 2 orquestrados sob “comando do PT e de Lula”;
- Toda operação ideológica inverte a realidade, mas não pode ser apenas uma “invenção” para ser convincente, precisa apoiar-se em elementos da realidade – mesmo que sejam parciais. No caso concreto, essa ideologia, que reduz as questões nacionais aos esquemas de Caixa 2 sob “comando do PT”, acabou colando de forma irreversível na classe média e em frações da classe trabalhadora, pois encontrou elementos reais. Nesse sentido, a operação Lava Jato, dirigida de forma seletiva contra o PT, acabou sendo funcional para a ofensiva reacionária, dando a “materialidade” necessária para o sucesso dessa ofensiva político-ideológica e, finalmente, abrindo caminho para a vitória de Bolsonaro;
- As políticas do lulismo – sistematicamente movidas dentro do critério da conciliação de classes, do respeito aos estreitos limites da institucionalidade burguesa, quando a própria burguesia já tinha esgarçado o regime, e das traições e manobras contra a mobilização dos trabalhadores – foram, por sua vez, corresponsáveis para que chegássemos a essa situação;
- Quando esteve à frente do governo federal, o lulismo não fez nenhuma reforma de fato em 12 anos. No final do primeiro mandato de Dilma, responde à crise econômica com políticas anticíclicas, mas sem que tenha efeitos duradouros. Assim, o crescimento da renda do trabalho, do crédito ao consumo, das bolsas sociais e da ampliação do acesso à universidade pública e a outros serviços foram logo solapados diante da recessão;
- Vivemos, a partir de então, queda brutal de investimentos do capital, desemprego em massa que atinge dezenas de milhões, queda brutal da renda dos trabalhadores, ampliação da precarização e piora acentuada dos serviços públicos. Logo no início do segundo mandato, Dilma comete “estelionato eleitoral” e impõe medidas neoliberais, mas sem que tenha resultados práticos, acaba, assim, sofrendo impeachment em junho de 2016;
- Inclua-se a esse processo econômico e às respostas dadas pelo lulismo, os esquemas de corrução que envolveram a compra de votos de parlamentares para aprovar projetos do governo – conhecido como “Mensalão” – no final do primeiro governo Lula. Depois os esquemas de financiamento eleitoral ilegal (caixa 2) dos grandes partidos por empresas e os esquemas que envolveram a Petrobras. Processos esses que envolveram o conjunto dos partidos burgueses, mas que por uma operação político-ideológica-midiática bem-sucedida conseguiu responsabilizar quase que exclusivamente o PT diante das massas;
- A responsabilidade do PT para o atual cenário não se refere apenas ao seu reformismo sem reformas quando esteve 12 anos à frente do governo e aos esquemas de corrupção, uma vez que o lulismo atuou sistematicamente para tirar os movimentos sociais das ruas. Quando eclodiu junho de 2013 reprimiu o movimento, em seguida tentou coopta-lo, para em 2014 novamente reprimir em aliança com todas as forças reacionárias brutalmente greves e manifestações contra a Copa do Mundo;
- Após a reeleição com pouca margem de votos de Dilma em 2014, a repressão as manifestações estudantis e populares realizadas no período anterior, ajudaram a criar as condições políticas favoráveis para a ofensiva reacionária e para que em 2015 e 2016 as ruas fossem tomadas por manifestações massivas de direita com pautas abertamente reacionárias capitaneadas pela classe média alta;
- No governo Temer, desmobilizou a poderosa greve geral em 28 de abril de 2017 e não mobilizou efetivamente contra a reforma trabalhista, em 2018 não enfrentou a Intervenção Militar no Rio de Janeiro, não lutou por justiça diante execução política de Marielle Franco cometida pelo narcoestado do Rio de Janeiro, entregou Lula a “justiça” e na campanha eleitoral preferiu não voltar sua artilharia contra Bolsonaro no primeiro turno, pois considerava que seria o candidato mais fácil de ser abatido no segundo turno;
- Temos assim à corresponsabilidade política do PT pela onda reacionária que vem se construindo nos últimos 4 anos e que culminou na vitória de Bolsonaro. Esse conjunto de táticas que tiraram das ruas as lutas, as manobraram, as enfraqueceram e as traíram em nome da centralidade que a burocracia dá para a disputa eleitoral, para a conciliação de classes e para o controle burocrático das organizações dos trabalhadores. Conjunto esse de elementos que, certamente, propiciaram as condições ideológicas-políticas-eleitorais para a vitória eleitoral de Bolsonaro;
- No entanto, como já indicado acima, temos importantes reservas de combatividade entre as mulheres, os negros, a juventude e setores da classe trabalhadora que serão testadas daqui por diante. Além disso, setores da classe trabalhadora que votaram em Bolsonaro a partir da ilusão criada de que é o “único” que pode enfrentar os problemas nacionais, diante dos ataques direitos que sofreram do próximo governo – que nomeia corruptos para seu ministério, ameaça a organização independente dos trabalhadores e anuncia para esse ano o apoio a reforma da previdência de Temer – tendem a dar-se conta de que foram manipulados. Assim, essa vitória eleitoral terá que passar pelo escrutínio das ruas, das mobilizações e da resistência em cada lugar de trabalho, ensino e moradia.
PSOL PRECISA CONSTRUIR ALTERNATIVA INDEPENDENTE
- Estamos diante de grandes perigos, mas também de desafios históricos que podem colocar a classe trabalhadora no Brasil em outro patamar de organização. Para tanto, precisamos elaborar de forma coletiva um balanço político-eleitoral que prime por um esforço de análise concreta objetivando encontrarmos os pontos de apoio para o fortalecimento do nosso partido democraticamente pela base para que esse possa avançar na direção de um número maior de categorias, movimentos e setores sociais de maneira que possa contribuir com os enormes desafios que têm os explorados e oprimidos. Nesse sentido, não cabe nenhuma forma de facilismo ou derrotismo diante da atual situação, cabe, sim, procurarmos afinar nossas estratégias e principais táticas de luta e organização para o próximo período;
- Nessas eleições, houve debacle da direita tradicional, tsunami de extrema-direita, resiliência da esquerda institucional e crescimento da esquerda socialista. O PSL de Bolsonaro passou de 1 para 52 deputados, o MDB de 66 para 34 e o PSDB de 54 para 29. Já o PT amargou um recuo, mas manteve-se como a maior bancada da Câmara dos Deputados com 56 parlamentares (eram 62), elegeu 5 Governadores (eram 7) e a “onda democrática” no final da campanha permitiu que não tivesse uma derrota acachapante na eleição presidencial. Assim, apesar da ofensiva política que Ciro Gomes, o PT se manterá como um importante, senão o principal, ator da oposição institucional a Bolsonaro;
- O PSOL saiu eleitoralmente fortalecido das eleições, conseguiu superar a cláusula de barreira com cerca 3% dos votos (era necessário 1,5%), na disputa para governador no Estado do Rio de Janeiro alcançamos 15% dos votos e obteve 2.783.669 votos em todo o país. O partido elegeu 10 deputados federais (eram 6) e 18 deputados estaduais. Em São Paulo elegemos 3 deputados federais (eram 2);
- No ABC, Bolsonaro obteve 66,84% e Haddad 33,1% dos votos. Os candidatos da região alinhados com Bolsonaro e, consequentemente, com os prefeitos que o apoiaram tiveram resultados eleitorais distintos. Os políticos burgueses da região em SCS e de SBC conseguiram eleger deputados, mas em SA nenhum dos candidatos apoiados pelos prefeitos das cidades foram eleitos. Em relação a centro esquerda, o resultado é ainda mais negativo, o PT conseguiu eleger apenas dois deputados na região em SBC.
- As candidaturas do PSOL da região obtiveram uma importante votação, atingindo alguns milhares de votos. Algumas candidaturas já eram nomes conhecidos da região e outras apresentarem-se pela primeira vez. Além disso, houve iniciativas inovadoras, como as da campanha coletiva e das atividades comuns de campanha. O lançamento dessas candidaturas, além de contribuir para o coeficiente eleitoral, ampliam a inserção do partido na região e em vários seguimentos dos explorados e oprimidos. Ampliação que deve ser patamar para uma campanha de filiação e organização do partido em núcleos;
- Diante da crise do PT nacional e na região, abre-se a possibilidade para que essas candidaturas ocupem maior espaço na próxima eleição. Para isso será necessário que a direção do partido em nível estadual e regional aposta nesses e em novos nomes que irão surgir através de apoio político, organizativo e financeiro efetivo;
- Em relação ao balanço político da nossa campanha, precisamos apontar algumas questões. Primeiro, no que pese o fato de que o partido avançou nessas eleições em sua inserção, número de deputados federais e estaduais e obteve importantes votações em alguns estados da federação, portanto, saiu com uma balanço eleitoral positivo, pensamos que a linha levada pela direção da campanha não permitiu que a candidatura de Guilherme Boulos se colocasse como uma clara alternativa de massas ao lulismo;
- Na verdade, por mais que a candidatura nacional tenha sido uma aliança entre PSOL, PCB, MTST. MIDIA NINJA e APIB, não houve grande descontinuidade na linha adotada pelo partido nos últimos anos. Ou seja, o PSOL soube se colocar corretamente contra o impeachment, participou e impulsionou organizações de frente única alternativas à direção cutista, como a Frente Povo Sem Medo, atos de unidade de ação contra o avanço reacionário, como o das Diretas Já!, contra a prisão de lula e por justiça para Marielle. No entanto, a política de frente para lutar e de unidade de ação do partido sofrem sistematicamente da ausência da diferenciação política, que faz com que a linha do partido não se coloque de forma abertamente independente do lulismo;
- Não podemos desconsiderar, como fazem alguns setores do partido, que nessa eleição a esquerda socialista sofreu com o “emparedamento” entre o avanço da extrema-direita, de um lado, e o lulismo, de outro. Calou fundo o voto útil em Haddad e em Ciro, portanto, houve razões objetivas para que não tivéssemos uma votação de massas na candidatura presidencial, que ficou com 0,58% dos votos;
- É incerto, assim, dizer que com outra linha teríamos ganho massivamente votos nulos, brancos ou convencido alguma franja que se absteve em votar na candidatura Boulos. No entanto, no que pese que houve um processo objetivo no qual a esmagadora maioria dos eleitores ficou entre o antilulismo de viés reacionário e entre o lulismo ou cirismo para resistir à barbárie neofastista, era, em primeiro lugar, estrategicamente necessário entrar na disputa com um projeto radicalmente oposto a “tudo o que está aí”, que se colocasse como o principal adversário do neofascismo, mas, que, ao mesmo tempo, fosse uma alternativa totalmente independente à burocracia lulista;
- Além de um dever estratégico, essa linha demonstrou também potencial eleitoral, o que foi relativamente demonstrado em algumas votações proporcionais e majoritárias do PSOL pelo país. Nesse sentido, voltamos ao problema da linha oficial do partido, que corretamente aposta na frente única e na unidade de ação, mas o faz sem uma sistemática diferenciação com o lulismo. E foi exatamente essa toada reproduzida na campanha presidencial de Guilherme Boulos;
- O acerto do partido em relação à luta contra o impeachment, à organização unitária contra as reformas de Temer, à luta contra a prisão de Lula e ter centrado a campanha na luta contra Bolsonaro, acabou sofrendo de um enorme unilateralismo político devido à ausência quase absoluta de diferenciação com o lulismo antes e depois das eleições. É difícil mensurar eleitoralmente todas as consequências dessa linha, mas, certamente, do ponto de vista da construção de um forte partido para a luta de classes que se coloque como alternativa de massas ao lulismo, perdermos oportunidades valiosas para nos fortalecermos política e eleitoralmente frente ao PT e aos demais aparatos;
- Foi sim um grande acerto dar centralidade à unidade de ação e às frentes contra o avanço do reacionarismo. Porém, essa tática desprovida da diferenciação sistemática colou a campanha do PSOL a do PT, o que não permitiu aproveitar amplamente a possibilidade de atrair para o partido setores da juventude, das mulheres, dos negros e dos trabalhadores que buscam uma bandeira ética, democrática e radical para se organizar;
- Se, de um lado, fazer diferenciação sem apostar nas frentes e na unidade de ação é um tremendo erro sectário, que desarma os trabalhadores para as lutas e que só enfraquece as organizações que levam essa linha, de outro lado, a correta tática unitarista sem uma diferenciação que passa pela sistematicamente pela exigência de que o lulismo mobilize – em outras conjunturas é necessário dar mais peso para as denúncia – é um erro praticamente simétrico. Pois além de não apresentar uma alternativa estratégica à falência do reformismo sem reformas, não aposta na construção de um partido para a ação e na mobilização como atividade central. Já, do ponto de vista da tática eleitoral, essa ausência de diferenciação fez com que o PSOL deixasse de aparecer como uma alternativa radical para amplas camadas que buscam uma alternativa ao lulismo;
- Por isso, opinamos que a linha levada por Boulos e pela direção da campanha foi em boa medida a continuidade da linha majoritária que o partido vem desenvolvendo nos últimos anos. Uma linha semi-independente do lulismo, que foi colocada à prova nessas eleições e não passou. Uma linha que deve ser superada por uma abordagem que se apoie nas necessidades, lutas e organização mais imediatas dos explorados e oprimidos, mas que faça as pontes necessárias com as tarefas anticapitalistas, com a organização sindical, popular e estudantil independente dos trabalhadores e, também, com a necessidade de construir um partido que supere o PT, seu programa, métodos e organização.
DEMOCRACIA INTERNA PARA FAZER FRENTE AO NOVOS DESAFIOS
- Como último ponto desse projeto de balanço eleitoral, não podemos nos furtar à questão dos métodos utilizados para a aliança eleitoral que teve à frente a candidatura Boulos;
- No último Congresso Nacional do PSOL, realizado em dezembro de 2017, foi aprovada uma resolução ambígua em relação ao que seria a candidatura do PSOL em 2018, ou seja, “uma candidatura própria que amplie o debate de reorganização da esquerda, que tenha como lastro programático o processo democrático e participativo construído pela plataforma VAMOS mais o acúmulo programático do partido”;
- Essa resolução não deixava claro que a direção do partido queria uma aliança eleitoral com o MTST e que se fosse aceita por esse movimento, o/a candidato/a à presidente não seria do PSOL. Na verdade, essa resolução foi uma manobra que procurou esconder do partido a verdadeira linha da maioria, ou seja, constituir uma aliança eleitoral com o MTST que teria Guilherme Boulos à frente. Depois do Congresso de 2017, uma vez feito o acordo com o MTST, que já vinha sendo processado na surdina, sem uma discussão clara com a base do partido, a Conferência Eleitoral de março desse ano acabou sendo apenas um ritual formal;
- Ao optar por não definir claramente qual era a tática que estava sendo posta em ação e ao realizar todos os movimentos políticos sem que uma ampla discussão tática e programática fosse feita pela base, o lançamento da pré-candidatura de Boulos na “Conferência Cidadã” antes da Conferência Eleitoral do PSOL foi um espetáculo de desrespeito à democracia interna do partido, o que acabou tendo influência na mobilização efetiva da base para a campanha eleitoral;
- Além disso, ao não fazer um debate interno sobre o programa eleitoral e deslocar as decisões programáticas para a PLATAFORMA VAMOS, foi imposto um programa que cria um fosso entre as tarefas imediatas e as de transição e que desconsidera totalmente que para obter conquistas mínimas ou democráticas cada vez mais será necessário lutar por medidas anticapitalistas e por outra estrutura de poder;
- Esse método serviu para que a direção do PSOL impusesse sua linha sem uma real discussão com a base do partido, o que levou a um programa eleitoral rebaixado, com a mesma lógica petista, e a uma tática de unidade de ação sem diferenciação. Uma combinação política que fez com que a candidatura de Boulos perdesse força político-estratégica e, também, eleitoral;
- Para finalizar, a semi-independência tática, programática e organizativa do PSOL com o lulismo levada pela direção tem claros desdobramentos organizativos. Essa estratégia manifesta-se na ausência de nucleação de base, de imprensa partidária militante, de disputa com a burocracia dos espaços operárias e estudantis e de uma formação militante que prepare para os próximos enfrentamentos;
- Assim, lutar para uma reorientação política e organizativa do PSOL é um desafio crucial, pois o momento exige um partido organizado pela base, formado no socialismo militante e que se prove nas eleições e principalmente nos enfrentamentos da luta de classes que se fazá mais dura daqui em diante.
Assinam:
Andreia Silva – PSOL São Bernardo do Campo
Antonio Soler – PSOL Diadema
Alexsandro Rodrigues de Brito – PSOL Diadema
Bonifácio Ribeiro – PSOL São Bernardo do Campo
Camila Suno – PSOL Baixada Santista
Gabriel Manhãs Barreto – PSOL São Paulo
Gabriela Motta – PSOL Belo Horizonte
José Roberto Silva – PSOL Baixada Santista
Juliana Reis – PSOL Baixada Santista
Luciano Matias – PSOL São Paulo
Luis Eduardo Mattaraia – PSOL São Paulo
Martin Camacho – PSOL São Paulo
Maurício dos Santos – PSOL São Bernardo do Campo
Naiara Vieira – PSOL Santo André
Rebecca Moura – PSOL São Paulo
Renato Assad – PSOL São Paulo
Roberto Borges – PSOL Baixada Santista
Roberto Vieira – PSOL Santo André
Rosi Santos – PSOL São Paulo
Renata Martinoni – PSOL São Bernardo do Campo
Sandra Loffreda – PSOL São Bernardo do Campo
Sara Vieira – PSOL São Bernardo do Campo
Severino Felix – PSOL São Bernardo do Campo
Suellen Cerqueira – PSOL Mato Grosso
Sueli Alves – PSOL São Bernardo do Campo