Um Primeiro de Maio cheio de desafios

A necessidade premente da mobilização independente dos trabalhadores para derrotar Bolsonaro

Enfermeira durante protesto simbólico e homenagem aos trabalhadores da saúde no Dia do Trabalho, em Brasília. Foto: Mateus Bonomi/AGIF - Agência de Fotografia/Estadão

O Dia Internacional dos Trabalhadores no Brasil foi marcado pela catástrofe sócio sanitária, responsabilidade direta do governo Bolsonaro e de todos setores da classe dominante que lhe dá apoio, mas também pela renovação da expectativa de que apenas a luta pode mudar a vida. Para que essa esperança se concretiza em um movimento que possa de fato mudar as coisas, é preciso superar a acomodação da esquerda, a estratégia de conciliação de classes e apostar, de fato, na mobilização dos trabalhadores e dos oprimidos.

ANTONIO SOLER 

Neste Primeiro de Maio, depois de ter batido o recorde de 400 mil mortes por Covid-19, o genocida Bolsonaro, como era de se esperar, não fez nenhum gesto voltado aos trabalhadores. Ao contrário disso, em uma feira de ruralistas em Uberaba (MG), discursou reafirmando todo o rosário de extrema direita, reacionário, antipopular e antioperário que caracteriza o seu governo.

Para acariciar os patões do campo, falou contra os movimentos sociais que levam “terror ao campo”, a proteção dos povos indígenas, a regulamentação da Emenda Constitucional 81[1] e a legislação que protege matas e florestas. Defendeu o latifúndio monocultor, que segundo ele está sendo ameaçados por “agentes públicos no país”, e os atos negacionistas de extrema direita deste domingo. Ao se referir à defesa da “democracia”, inverte totalmente o seu significado, manifesta-se abertamente contra a luta pela reforma agrária e medidas de distanciamento social na pandemia. “Temos a satisfação de ver bandeiras verdes e amarelas por todo o país”, afirmou Bolsonaro.[2] 

Superar ofensiva reacionária dos últimos anos

Enquanto o negacionista neofascista Bolsonaro ameaça diariamente os direitos democráticos e governa para os patrões com a cumplicidade do Congresso e da justiça, chegamos a esse Primeiro de Maio com um terrível agravamento da situação socioeconômica da classe trabalhadora no Brasil.

Temos em nosso país mais de 125 milhões de pessoas (cerca de 60% da população) que sofrem com insegurança alimentar (falta de alimentação diária suficiente) e 19 milhões vitimadas diretamente pela fome. Além disso, o desemprego bate recordes e chega a 14,4% em abril e a informalidade ultrapassa 50% da força de trabalho.

Nos últimos anos vimos perdendo direitos históricos. Isso ocorreu nos governos Lula e no de Dilma. Além de não avançarem para reformas de fato para não enfrentar a burguesia – ficando apenas em medidas social-liberais -, tivemos, também, ataques econômicos e políticos contra os trabalhadores. Basta ver a contrarreforma da Previdência do setor público no primeiro governo Lula, o corte de direitos e benefícios no segundo governo Dilma que, diante da crise econômica, cometeu estelionato eleitoral (traiu as promessas de campanha) e tomou medidas diretamente neoliberais, e uma série de outras medidas contra os nossos interesses enquanto classe.

No entanto, foi depois da manobra reacionária que tirou Dilma do poder é que tivemos ataques mais duros aos direitos dos trabalhadores. No governo Temer tivemos o teto dos gastos primários que reduz drasticamente o financiamento nos setores sociais em benefício do capital financeiro e a reforma trabalhista que flexibiliza, retira direitos e enfraquece as negociações coletivas.

Com Bolsonaro, além do governo postar abertamente na catástrofe sanitária responsável por parte significativa das mais de 400 mil mortes – o Brasil é o segundo país em que mais morrem pessoas por Covid-19 no mundo -, veio a reforma da Previdência Social que, ao possibilitar aposentadoria apenas com 40 anos de contribuição praticamente, impossibilita a ampla maioria da classe trabalhadora de se aposentar.

Orçamento federal para aprofundar fome, desemprego e desigualdade

Agora, apesar desta catástrofe sócio sanitária vivida pelos trabalhadores, não temos nenhuma política pública em vista para combater essa situação.

O Orçamento Federal de 2021 aprovado pelo Congresso dedica 2,236 trilhões para o pagamento da dívida pública. Este valor, que está fora do teto dos gastos por não fazer parte das despesas primárias, corresponde a 50% do total de despesas federais neste ano. Em termos comparativos à prioridade que o Governo e o Congresso dão para o combate à pandemia, ficou fora do teto dos gastos apenas R$ 43 bilhões dedicados à renda mínima. Um valor de R$250, no maior valor, mensais durante 4 meses para cada desempregado, ou seja, valor muito longe de garantir a sobrevivência de mais 60% da população.

Enquanto destina R$ 49 bilhões para emendas parlamentares, retira R$30 bilhões de despesas obrigatórias e emergenciais, tais como: saúde, educação e Previdência Social, setores que já penam com o subfinanciamento crônico.

Para as políticas de proteção ao emprego e crédito para pequenas empresas o valor estimado é de R$15 bilhões, apenas 30% do que será destinado para emendas parlamentares. Deixam de fora do orçamento, por exemplo, R$ 2 bi para a realização do Censo do IBGE, 2700 pesquisadores que se cadastraram no CNPQ ficarão sem bolsa e a agricultura familiar vai ficar sem R$ 1,35 bi de investimento.

Ou seja, como vimos, enquanto chegamos a 400 mil mortes e morrem 3 mil pessoas por dia na segunda onda de contágio – já estamos gestando terceira onda e novas cepas do vírus -, o grosso do orçamento está destinado à remuneração do não menos genocida capital financeiro.

Sem mobilização independente não há saída para os trabalhadores

Nesse Primeiro de Maio começamos a ver esboçadas algumas reações da classe trabalhadora ao genocídio sócio sanitário. Foram realizadas ações por todos os países, carreatas, colagens de faixas e atos pela internet. Porém, o que a grande mídia deu mais destaque foi para os atos bolsonaristas que, apesar de pequenos na maior parte das capitais, tomaram as ruas sem máscara e sem distanciamento social.

Como se transformou em um padrão, o ato do primeiro de maio organizado pelo PT e CUT contou com a participação das centrais sindicais pelegas e políticos da classe dominante, como Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Baleia Rossi (MDB) e Ciro Gomes (PDT). Mas tivemos atos virtuais organizados pela esquerda, PSOL, PSTU, CSP e Intersindical que souberam honrar os Mártires de Chicago e a tradição de independência de classe dos trabalhadores.

Nesse Primeiro de Maio, uma das questões centrais que se coloca para a classe trabalhadora no Brasil é a necessidade de uma luta global contra esse governo, pois estamos em um momento da luta em que bandeiras parciais são totalmente insuficientes para dar conta das nossas necessidades imediatas e históricas como classe.

Ao mesmo tempo em que precisamos lutar por medidas como vacina para todos já – o que é apenas possível com a luta pela quebra das patentes -, renda mínima de um salário-mínimo e lockdown nacional para salvar vidas, não podemos descuidar da luta para pressionar a CPI da Covid, pelo fora Bolsonaro genocida e por Eleições Gerais.

Esse desafio enorme contra um governo de extrema direita – ou contra qualquer um – não se faz apenas como medidas parlamentares, como quer fazer crer a direção do PT e parte até da direção do PSOL. Precisamos, ao contrário do que faz Bolsonaro e seus seguidores, tomar as ruas, organizar a luta com distanciamento social e equipamentos de segurança para organizar ações diretas com segurança sanitária e dialogar com os milhões de trabalhadores que saem de casa todos os dias para a mais dura luta pela sobrevivência.

Da mesma forma, a nossa luta imediata não pode ser desconexa da luta por uma alternativa política dos trabalhadores. Ao contrário do PT e de Lula, que organizaram o Primeiro de Maio com a burguesia, não podemos construir uma saída política, um governo como fruto das eleições de 2022 ou da luta direta em um processo de radicalização em parceria com a classe dominante.

Esse é o sentido da traição aos nossos interesses que o lulismo vem aplicando não é de hoje, vide as políticas que levam à frente desde os anos 1990. Esses mesmos setores da classe dominante que se dizem “democráticos”, foram os que estiveram à frente do impeachment sem crime, da prisão de Lula sem provas e de todos ataques contra os trabalhadores e oprimidos no Brasil. 

Por essa razão, não podemos confundir um só instante a necessidade da unidade de ação para derrotar Bolsonaro com todos que são contra os ataques aos direitos sociais, de frente dos movimentos sociais para lutar em defesa de um programa mínimo e da frente de esquerda para lutar por uma saída política dos trabalhadores. Esquecer esse bê-á-bá da política classista, como faz a direção do PT e parte da direção do PSOL, é jogar toda a luta independente na lata do lixo e se apressar em defender uma frente eleitoral com a burguesia e a um governo burguês de conciliação de classes, que como já feito anteriormente, só serve para preparar novas derrotas.

Por isso, somada à luta por Vacina para todos; Renda mínima; Lockdown nacional; Fora Bolsonaro e Eleições Gerais, precisamos lutar também para construir uma Frente de Esquerda Independente dos Patrões e Pelegos para constituir a força política necessária para impor a partir da luta direta um governo dos trabalhadores que possa tomar medidas contra toda forma de exploração e opressão.

Viva o Primeiro de Maio

Quebra de patente e vacina para todos já 

Renda mínima de um salário

Lockdown nacional para salvar vidas

CPI para valer, fora Bolsonaro genocida

Eleições Gerais

Por um governo dos trabalhadores sem patrões e pelegos


[1] Aprovada em 2014, prevê a desapropriação sem indenização de propriedades em que for constatada a presença de trabalho escravo.

[2] Além disso, em uma clara defesa dos atos negacionistas de extrema direita – realizados em sua maioria sem máscaras e nenhum cuidado com distanciamento social enquanto morrem cerca de 3 mil pessoas por dia pela Covid-19 – que foram realizados ontem afirmou que agora, ao contrário de outros governos que faziam referência as cores e símbolos da luta histórica dos trabalhadores.