A ilha da América Central que, contra as marés da história, continua a ser uma colônia dos Estados Unidos, acaba de entrar com toda razão na lista de países que foram comovidas por rebeliões populares. Com a queda do governador, inúmeras questões se abrem e podem se aprofundar com o tempo: a política de ajuste e a catástrofe social da ilha não foram embora com Roselló.
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Como já dissemos anteriormente em outros textos, a faísca que levou a ira popular porto-riquenha foi desencadeada pelo o escândalo dos vazamentos de conversas privadas de Roselló com seu círculo íntimo do governo.
Como dissemos anteriormente em outros textos, a faísca que desencadeou a ira popular porto-riquenha foi desencadeada por o escândalo dos vazamentos de conversas privadas de Roselló com seu círculo mais íntimo do governo. Neles, o grupo de altos funcionários ligados ao governador foram flagrados em frases de desprezo e ódio contra os setores populares, a oposição, as mulheres e a comunidade LGBT. Esse foi o estopim.
Mas a realidade é que o regime político porto-riquenho vinha mexendo com pólvora há pelo menos quatro anos. Não se pode explicar semelhante incêndio político no país “apenas” por uma faísca. Muito menos se pode dar como resolvidos os problemas. O partido político de Roselló continua no poder e o seguirá após a efetiva renúncia do governador em agosto. E como a maré humana da Marcha do Povo transbordou as ruas, as celebrações também foram os protagonistas do dia de ontem à noite.
Em 2015, Porto Rico entrou em default e já havia percorrido um longo caminho de ajustes para pagar em dia a dívida com seus credores crise arrastada até o momento da queda de Roselló. Já dissemos que essa política levou quase metade da população à pobreza. Para agravar a situação, o povo porto-riquenho não tinha voz nem voto na política econômica de austeridade que se aplicava no país: os Estados Unidos, por meio da lei PROMESA, constituíam um comitê interventor com plenos poderes para administrar o orçamento de Porto Rico. Assim, o status de fato de “colônia” ianque de Porto Rico foi evidenciado apesar de não ter esse nome formalmente na ONU.
Somado a isso, o furacão Maria ocorrido em setembro de 2017 devastou a infraestrutura do país e a reconstrução foi altamente mais dura porque à administração política sustentou o ajuste mesmo em meio à catástrofe. Boa parte da população vive sem eletricidade há um ano e se calculam que as mortes produto da catástrofe variam entre 3 mil a 4 mil pessoas.
E para alimentar ainda mais o fogo provocado pelo o ajuste e a devastação de um furacão, os porto-riquenhos acompanharam as investigações do escândalo de corrupção envolvendo o partido de Roselló, Partido Nuevo Progresista (PNP) durante meses. Seis funcionários acusados de corrupção de US $ 15 milhões foram envolvidos no escândalo.
A soma do ajuste e do roubo de fundos no meio de uma catástrofe natural foi uma grande provocação e acabou desencadeando o que talvez tenha sido a mais profunda crise política que a ilha experimentou. Para que se tenha uma ideia, foi responsável pelo ajuste na educação a americana Julia Keleher. Ela foi vendida a população como uma “profissional” com a neutralidade e técnica de alto nível internacional e que devido a seu caráter de agente internacional dos bancos tinha que ser extremamente eficiente. Qual foi sua política? Fechar 442 escolas em plena catástrofe, demitiu 5.000 professores e destinou seus recursos para os bolsos de seus amigos de Wall Street. E, de passagem, cobrou uma gorda comissão por seus serviços. Hoje, ela esta presa indiscutivelmente acusada de corrupção, óbvio. Podemos aprender muito com este caso sobre tecnocratas liberais partidários de ajustes enquanto se dizem imparciais e verborragiam contra a “política”.
A democracia capitalista de Porto Rico já pôs em funcionamento as comportas do sistema para conter a crise. Com a renúncia de Roselló procuram recuperar terreno politico – ocupado pelos protestos – para acabar com a crise agora exposta: que caia o rei mas que se conserve a monarquia, que Roselló caia mas o sistema político que lhe permitiu governar continue, que os corruptos e ajustadores caem para dar mais vida longa ao ajuste e a corrupção, uma vez que os principais porta-vozes da classe capitalista, seus diários, o parlamento, todos aqueles que apoiaram Roselló largaram suas mãos antes dele cair, sabiam que era insustentável.
Um fato marcante é que o que precipitou a queda Roselló foi a Marcha Popular de meio milhão de pessoas e da entrada incipiente de trabalhadores na luta por meio de suas antigas organizações sindicais. A chamada para a mobilização em massa foi acompanhada pela adesão a greve de várias organizações de trabalhadores.
A queda de um governo profundamente detestado frequentemente abre mais perguntas do que respostas. Fica pendente, assim, a construção de uma saída política que questione o capitalismo colonial de Porto Rico.
Tradução: José Roberto Silva