“Sentimento que não espairo; pois eu mesmo nem acerto com o mote disso ― o que queria e o que não queria, estória sem final. O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem”
João Guimarães Rosa. Grande Sertão: Veredas
Para começo de conversa
Neste momento pré-eleitoral de intensa polarização política da luta de classes em todo o mundo, em que a situação está indefinida pela relativa anulação de forças entre os dois polos, e de crise estrutural, crescentes ameaças golpistas e possibilidades de derrotar a extrema-direita se as massas forem às ruas no Brasil, lançamos pelo Polo Socialista Revolucionário a pré-candidatura a deputado federal da Bancada Anticapitalista.
Essa é uma imensa tarefa política assumida diretamente pela jovem militância da corrente Socialismo ou Barbárie, da Juventude Já Basta e das Vermelhas, mas que conta também com o apoio de companheiros e companheiras de outras organizações políticas, militantes organizados e independentes.
O presente Manifesto de Lançamento da pré-candidatura da Bancada Anticapitalista se destina a ser um instrumento aberto de discussão na vanguarda sobre os elementos de análise, caracterização e política para que sejam enriquecidos e possam dar forma a um documento programático mais amplo e profundo, não se limitando a ser apenas um apanhado disperso de eixos programáticos voltado para a propaganda eleitoral, mas um pequeno guia coletivo para a luta de classes.
Polarização e indefinição da correlação de forças
Partimos de uma caracterização política da realidade mundial sabendo que a dinâmica política no Brasil, apesar de suas gigantescas dimensões, como qualquer país do mundo – principalmente quando se trata de países não independentes ou imperialistas – não pode deixar de ser influenciado pela realidade-mundo. Basta ver o impacto que a inflação mundial do preço dos combustíveis e de outros insumos têm tido sobre a nossa economia. Assim, neste manifesto queremos partir do cenário político mundial como uma das determinações da realidade nacional que marcam a complexa situação brasileira.
A guerra na Ucrânia, junto com a pandemia e a crise econômica marcam uma nova etapa da história, do capitalismo, da luta de classes e da necessidade cada vez mais imperiosa da classe trabalhadora e dos oprimidos retomarem a luta anticapitalista e a luta pelo socialismo em todo o mundo. Partimos de uma caracterização que é comum à nossa corrente: a de que vivemos em um cenário de polarização social e política crescente em todo o mundo. Considerando que temos uma polarização em que o polo que mais pesa é o da direita, o polo mais à esquerda – resistência das massas – tem crescido e produzido fenômenos políticos que contrabalançam a conjuntura mundial, fazendo assim com que acabe não se resolvendo para um lado ou para outro.
O mundo pós-pandemia deixou mortos nos quatro pontos cardeais do globo por uma doença causada pela relação alienada entre o homem e a natureza que produz falhas metabólicas capazes de suscitar patógenos como o que causou a Covid-19, que matou cerca de 15 milhões de pessoas e que expressa a crescente crise socioambiental que coloca a vida humana – e uma série de outras espécies em risco. Como expressões disso, temos a polarização política nos Estados Unidos em que a vitória de Biden não fez o trumpismo ceder sua pressão e deixar de ser responsável por importantes retrocessos ao mesmo tempo em que as pressões pelo lado dos explorados e oprimidos tampouco deixam de atuar e crescer. Da mesma forma, assistimos em pleno inverno europeu uma importante onda de greves, na América Latina vitórias eleitorais de formações sociais-liberais, como as de Boric no Chile, Petro na Colômbia, e rebeliões no Equador, no Panamá e em Sri Lanka contra o aumento do preço dos combustíveis.
Como parte deste cenário, a guerra na Ucrânia (o primeiro conflito na Europa entre Estados e por zonas de influência desde a segunda-guerra) ao mesmo tempo que se configura como um conflito interimperialista – no qual as massas não puderam ainda atuar diretamente – pressiona a situação mais à direita, a crise econômica, social e política – a inflação e crescimento da miséria em todo o mundo, somada por uma das maiores crises migratórias da história – suscita de greves, lutas e rebeliões, fazendo assim com que o pêndulo político não vá categoricamente para a direita ou para a esquerda.
Em meio a essa polarização, há uma relativa anulação de forças entre os dois polos, estabelece-se um centro político que, em geral, aparece como predominante na luta de classes, nos processos de organização, nas formações e representações eleitorais. O nível de luta de classes atual, e todas as suas mediações, tende a fazer surgir processos mediados no campo político parlamentar, o que explica a vitória de coalizões eleitorais mais ao centro esquerda na América Latina, ou mesmo nos EUA, ou seja, mais liberais-sociais do que sociais-liberais, como foi no início dos anos 2000 na América Latina.
Desta forma, temos uma polarização assimétrica em que a reação é o polo mais forte sem que o polo da resistência, lutas e levantamentos populares pela esquerda deixem de atuar constantemente, fazendo com que a conjuntura, por enquanto, não tenha um desenlace categórico. Caracterização que pensamos ser extremamente útil tanto para fugir do derrotismo quanto do facilismo. Ambas visões unilaterais da realidade que povoam a mente da esquerda socialista brasileira e que apenas servem para desarmar para as dramáticas tarefas que temos pela frente, como a da construção a partir de um balanço das revoluções do século XX, da luta e da construção concreta de organizações revolucionárias de vanguarda em vários países articuladas por uma internacional socialista revolucionária que possa ser de fato um fator importante na luta dos trabalhadores.
Brasil: a conciliação lulista como estratégia permanente
Não cabe nesse manifesto de lançamento um recuo histórico detalhado, porém para ir à caracterização da nossa conjuntura atual, bem como os desafios que se desdobram dela para uma pré-candidatura independente dos patrões e da burocracia lulista, ou seja, socialista revolucionária, como é a Bancada Anticapitalista, não podemos nos furtar em colocar de forma rápida os grandes balizamentos que nos fizeram chegar a atual situação política.
No Brasil a polarização, o bipolo que assistimos atualmente no cenário mundial, em que um polo anula o outro, mas ambos seguem retroagindo um sobre o outro sem uma solução clara de continuidade, manifesta-se de forma distinta. O polo da direita se faz sentir com mais força, pois desde ao menos 2018 vivemos abertamente uma situação reacionária, não contrarrevolucionária, em que uma correlação de forças de derrota histórica tenha sido imposta, mas sim uma correlação de forças nitidamente desfavorável. Entretanto, a atual equação de forças políticas e sociais poderia ter sido revertida, pois tivemos duas conjunturas de ascensão da luta ampla da vanguarda, uma em 2020 e outra em 2021, que poderia ter gerado uma explosão popular, um levante que tivesse questionado seriamente Bolsonaro, o arrancado do governo e o jogado na cadeia.
Desde a ascensão do bolsonarismo não vivemos mais a polarização típica das décadas anteriores, aquela que havia entre o PT e o PSDB durante os anos 1990 e a primeira década deste século, ou seja, entre duas forças exclusivamente parlamentares, entre direita e esquerda da ordem. A direita, inicialmente capitaneada pelo PSDB, não aceitou o resultado das eleições de 2014 e colocou em curso um movimento de rua pró impeachment que derrubou Dilma Rousseff, abriu definitivamente as portas para as contrarreformas, para a prisão de Lula e eleição de Bolsonaro sem que o PT esboçasse uma reação à altura dos fatos, assumindo uma posição de sobrepor os acordos institucionais à luta direta pelas ruas.
Certamente que o bolsonarismo é um fenômeno de responsabilidade da classe dominante, que precisava de um governo bonapartista de extrema-direita para impor os duros ataques, porém, afirmamos reiteradamente que não podemos deixar a política de conciliação de classes do PT – que se repete na forma de farsa com a fórmula Lula-Alckmin – fora da equação para que entendamos o conjunto dos elementos que nos trouxeram até aqui e como enfrentá-los. Ou seja, os anos 90 não existem mais, ao contrário da pregação da grande mídia da polarização entre Lula e Bolsonaro, vivemos hoje uma pseudo polarização, pois ocorre entre uma força que combina a atuação parlamentar e extraparlamentar (bolsonarismo) e uma força exclusivamente parlamentar (o lulismo e seus satélites).
A eleição de Bolsonaro em 2018 foi resultado de várias ofensivas reacionárias, golpes e manobras parlamentares/judiciais com o apoio do imperialismo, da classe dominante e das forças armadas. Diante da crise econômica a conciliação de classes lulista não servia aos olhos da classe dominante para impor níveis muito maiores de exploração e opressão, portanto, se fez necessário um governo burguês puro sangue diante da crise estrutural do capitalismo e a consequente queda da taxa de lucro da classe dominante. Mas diante do curto-circuito institucional e do forte sentimento antissistema a partir de 2013, da crise econômica, do lavajatismo, do impeachment de Dilma e da desmoralização de Temer e dos partidos tradicionais, a classe dominante viu as suas alternativas políticas tradicionais, como Alckmin, derreterem nas eleições de 2018.
O que poderia ter sido uma forma de astúcia da história, com a volta do PT ao poder com Lula em 2018, foi, na verdade, um processo interrompido com as suas condenações sem prova pela Lava Jato, por sua prisão por Sergio Moro e pela pressão que fez o alto comando das forças armadas sobre o julgamento do seu habeas corpus pelo STF em abril de 2018. Tudo isso somado à crise política, à crise econômica e à facada fez brotar como alternativa a figura de Bolsonaro, eleito em outubro de 2018 consolidando a atual situação reacionária.
Insistimos que se faz importante tomar nota de que toda essa movimentação à direita do pêndulo político no Brasil não foi apenas obra da classe dominante e de seus vários agentes no estado, pois a estratégia ultra conciliadora do lulismo no poder, de reprimir a juventude e os trabalhadores em 2013, de impor um estelionato eleitoral em 2014 e de aceitar passivamente o impeachment e a prisão de Lula facilitaram a ofensiva reacionária. Da mesma forma, as mais recentes ondas de protesto a partir da reação das torcidas organizadas em junho de 2020 contra as ameaças golpistas em meio a pandemia e em 2021 a partir da mobilização do movimento negro em maio foram todas boicotadas por Lula, pela direção PT e pela direção do PSOL. Ou seja, a imposição de uma correlação de forças desfavorável em 2018 e sua continuidade até hoje tem como agente principal a classe dominante, mas contou também com a colaboração da direção traidora do movimento de massas que é principalmente Lula e seu movimento político, o lulismo.
O golpismo tem a ofensiva política
Bolsonaro uma vez eleito, desde a sua posse, iniciou suas as ameaças golpistas. Hoje se constitui uma espécie de governo bonapartista que atua o tempo todo para fechar o regime, ou seja, para avançar à conformação de um regime também de caráter bonapartista. Teve-se no início um governo conformado por representantes do neoliberalismo, da Lava Lato, das forças armadas e do neofascismo, governo que conseguiu impor a terrível reforma da Previdência que restringe de forma drástica o direito à aposentadoria, o desmonte de políticas públicas, o descontrole do desmatamento e o armamento da sua base social.
É já no início um governo que ataca sistematicamente todas as instituições da democracia burguesa – inclusive o Congresso Nacional – para impor o bonapartismo de extrema direita, mas que devido a crises, a queda de popularidade, a perda do apoio do lavajatismo, a gestão genocida da pandemia, a ameaça de impeachment e saída de Sergio Moro do governo, rendeu-se ao presidencialismo de coalizão dando-lhe um feitio de extrema direita. O governo então se reorganiza aproximando-se em 2021 do Centrão, passa parte importante dos fundos, controle das pastas ao fisiologismo e alinha-se ideologicamente de forma mais intensa com as alas mais reacionárias das forças armadas.
Desde então, Bolsonaro passa a fazer sistemáticos ataques não mais ao Congresso Nacional, mas aponta todas as suas armas contra o STF, o processo eleitoral e as urnas eletrônicas. Sabedor de que não pode se reeleger por meios normais devido ao genocídio durante a pandemia que foi responsável direto ao menos por 50 mil mortes e pela catástrofe econômica e social que assola o país alavancando 33 milhões de miseráveis, mais de 10 milhões de desempregados e 50 milhões de precarizados. Esses elementos não poderiam deixar de ter impacto sobre a popularidade do governo, o que restringe, até então, a intenção de voto em Bolsonaro em cerca de 30%. Por essa razão, Bolsonaro, e sua base política no Congresso sabem que não podem vencer a eleição presidencial e manter o controle do parlamento apenas por meios legais/institucionais. Movem-se em dois sentidos para chegar em outubro em condições de competitividade eleitoral e com um clima político que lhes permitam manter-se no poder, ganhando ou perdendo nas urnas.
Do ponto de vista institucional temos duas Emendas Constitucionais que podem mudar o cenário político até outubro, o PLP 18, que limita o ICMS (imposto estadual) sobre os combustíveis e a PEC 15, que aumenta o valor do Auxílio Brasil até dezembro. Para controlar o preço dos combustíveis, um dos principais itens da inflação e da baixa popularidade de Bolsonaro – somada a nova troca do Presidente da Petrobras como forma de pressão direta sobre a empresa para que não haja novos aumentos de preço até outubro, em junho a Câmara aprovou o projeto de lei complementar, que limita as alíquotas do ICMS sobre combustíveis, energia, transportes e comunicações de 25% para 18%. O projeto prevê um gatilho de compensação dada pelo governo quando a queda da arrecadação geral de cada estado chegue a 5%, porém, sem compensar a inflação do período.
A PEC 15, aprovada no Congresso com programas até o final deste ano, de acordo com a legislação eleitoral, não poderia ser votada sem que fosse aprovado no bojo da emenda constitucional um artigo que decreta uma perigosa emergência econômica. A PEC prevê a ampliação temporária do Auxílio Brasil de R$400 para R$600, zerar a fila desse benefício, repassar um valor de R$1000 para caminhoneiros autônomos, dobrar o valor do Auxílio Gás, um benefício para taxistas que custaria R$2 bilhões e ampliar recursos em R$ 500 milhões para o programa Alimenta Brasil. É uma armadilha do ponto de vista econômico e político para a nossa classe, pois se trata de uma “medida emergencial” – até dezembro deste ano – e não significa uma ruptura com o teto de gastos, não prevê outra fonte de financiamento dos auxílios, como o fim da isenção fiscal das grandes empresas, taxação do capital financeiro (lucros e dividendos) e das grandes fortunas. Um projeto que retira dos mais pobres para dar aos miseráveis.
Com a redução da alíquota do ICMS do PLP 15, os secretários estaduais de fazenda calculam que o total de perdas dos estados pode chegar a R$115 bilhões, somado aos R$41,25 bilhões que custarão as despesas extras da PEC 15, temos mais de R$ 150 bilhões que serão retirados dos cofres públicos para as políticas populistas de extrema direita visando recuperar a popularidade de Bolsonaro. Portanto, quem irá pagar a conta – além de R$17 bilhões em cortes orçamentários, com a retirada de verbas das áreas sociais do governo durante a vigência da PEC e redução de investimentos nas mesmas áreas com o seu término – será a enorme massa de explorados e oprimidos sem que a classe dominante seja taxa em R$0,1 sequer. Estas duas mudanças legais, uma infra e a outra constitucional, são parte da estratégia do bolsonarismo para criar condições institucionais (melhoria dos índices de intenção de voto) que permitam cobrir com alguma legitimidade às medidas extra institucionais (questionamento nas ruas do resultado eleitoral de outubro, por exemplo) que vem preparando à luz do dia.
Está nítido que o objetivo do governo é tentar recuperar popularidade, ainda que momentânea, na faixa da população mais pobre (que ganha até dois salários-mínimos), pois essa é responsável por 44% dos eleitores, sendo fundamental para o resultado eleitoral em outubro. Assim, do ponto de vista político, diante da possibilidade de Lula ganhar no primeiro turno, considerando que as pesquisas lhe dão 48% das intenções de voto contra 28% de Bolsonaro, essas mudanças legais constituem parte da linha golpista. Querem chegar ao segundo turno sob melhores condições para questionar os resultados eleitorais através da agitação golpista que está sendo desenvolvida sistematicamente desde 2018 e que tem se intensificado com a proximidade das eleições de outubro.
O governo também atua no arrepio da legalidade para criar as condições para se perpetuar no poder, esse tem sido o caso da política de armamento da base social predominante bolsonarista que praticamente coloca abaixo o estatuto do desarmamento, o indulto ao deputado Daniel Silveira que foi condenado em última instância por por ameaças e incitação à violência contra ministros do STF, o decreto assinado pela Advocacia Geral da União para livrar Bolsonaro de qualquer ilegalidade no ano eleitoral, a interferência nas operações da Polícia Federal, a utilização das forças armadas para desacreditar a confiabilidade das urnas eletrônicas, bem como as ameaças crescentes de não respeitar decisões do STF e outras os de forma leviana ou displicente.
Combinação de meios institucionais e não institucionais
Como força extraparlamentar, o bolsonarismo não se utiliza apenas de expedientes legais ou semilegais por dentro do regime para criar condições para impor a sua estratégia política para se perpetuar no poder, combina a isso ameaças com o uso cada vez mais explícito da força para se impor pelo medo.
Estamos em uma conjuntura pré-eleitoral marcada pelo desastre social – um regresso substancial na condição de vida das massas – mas também pela escalada da violência política neofascista. Nesse cenário, como vimos acima, além da iniciativa política estar quase que totalmente nas mãos do governo e de sua base de sustentação no Congresso voltadas para Bolsonaro se realinhar com os mais pobres, o método do fascismo – ameaça, agressão física e eliminação – estão sendo utilizado e podem ser ampliados nos próximos meses.
Não estamos apenas falando de hipóteses longínquas, já temos registro do crescimento atípico da violência política no Brasil, em relação ao ano eleitoral de 2020 – eleições municipais que tem um número muito maior de candidatos – tivemos nos primeiros seis meses de 2022 um crescimento de 23% da violência política, pois passamos de 174 para 224 casos, respectivamente. Os casos mais recentes de violência política desde a extrema direita ou ligada aos interesses e práticas bolsonaristas, estão relacionados a sua necropolítica que combina pregação violenta de eliminação dos adversários, facilitação de atividades criminosas, desrespeito aos direitos democráticos e incentivo ao armamento de sua base. Assim, o assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phlips, do militante petista em Foz do Iguaçu, Marcelo Arruda por um bolsonarista e de uma série de lideranças indígenas, podem ser atribuídos ao bolsonarismo. Mas não para por aí, em meados de junho, uma manifestação de apoio a Lula foi atacada em Uberlândia (MG), no começo deste mês um ato pró-Lula no Rio de Janeiro foi atacado com uma bomba e a campanha de Marcelo Freixo foi dispersada pela ação violenta por um deputado estadual bolsonarista e sua gangue. Além disso, o crescimento da violência policial nas periferias das grandes cidades e a violência no interior do país, podem ser tributadas ao bolsonarismo que no poder tem facilitado, incentivado e organizado a violência estatal e paraestatal.
Uma conjuntura de melhoria das condições políticas para Bolsonaro, pode ser extremamente perigosa. Em condições políticas mais favoráveis com aumento da popularidade uma movimentação golpista pode ser orquestrada pelo bolsonarismo utilizando sua capacidade de mobilização violenta, extraparlamentar, para impor o terror nas ruas, neutralizar a oposição e garantir cenários golpistas. Não parece ter cenário possível que não passe pela disputa nas ruas e pelo recrudescimento da violência política, é nessa estratégia que aposta o bolsonarismo. Em outras palavras, o que ainda não é efetivo hoje, pois todas as condições para um golpe não estão dadas, carrega elementos e contradições internas que em dinâmica podem mudar a conjuntura. O bolsonarismo não é cachorro morto, tem poder parlamentar e extraparlamentar, trabalha diuturnamente para criar as condições para mais uma manobra golpista enquanto a esquerda da ordem se conforma em atuar no campo meramente parlamentar.
Os partidos que compõem a frente de conciliação de classes Lula-Alckmin depositam confiança nas mesmas instituições que estão dominadas quase que em sua totalidade pelo bolsonarismo, como é o caso do Congresso, da PGR e da PF. Já conhecemos essa história, a confiança no aparato estatal dominado pelo bonapartismo de direita contribuiu para a derrota da classe trabalhadora alemã e para a ascensão do nazismo na década de 30, bem como em outras experiências históricas. Certamente que é necessário fazer exigências, porém cabe também denunciar esses órgãos e afirmar categoricamente que a defesa dos direitos democráticos, da vida das nossas lideranças e outro futuro melhor estão exclusivamente em nossas mãos. Será através da mobilização de massas nas ruas e da organização da autodefesa – não na confiança nas forças repressivas como sempre pretendem os conciliadores de plantão – desde os organismos de base com um programa anticapitalista à frente que poderemos fazer o neofascismo recuar e derrotá-lo categoricamente.
O fascismo se esmaga nas ruas
Apesar de hoje por hoje não existir condições para aventuras golpistas bem-sucedidas pelas razões que já expusemos acima, não podemos, contudo, desconsiderar a compacta base de apoio social, a sua sustentação no Congresso, o apoio de setores das forças armadas, a própria crise de hegemonia do imperialismo estadunidense e as iniciativas que têm o bolsonarismo para se realinhar eleitoralmente com os setores sociais mais empobrecidos. Se houver uma aproximação entre a intenção de voto de Lula e Bolsonaro empalmada com a violência política nas ruas pode-se criar um caldo de cultura favorável à reeleição ou alguma forma de manobra golpista para não se entregar o poder, como a recontagem de votos, por exemplo. Trata-se de uma evolução perigosa porque estamos assistindo a violência política passar da disputa local para uma motivação nacional voltada para assegurar a manutenção do bolsonarismo no poder. Por isso, nessa conjuntura confiar nas instituições do Estado dominadas pelo bonapartismo bolsonarista para fazer a defesa da democracia, como fez Freixo diante do ataque a sua campanha, bem como a direção do PT, do PSOL (inclusive muitas que se colocam à esquerda) e cia, é um crime político gravíssimo.
Nos diferenciamos tanto das correntes facilistas quanto das derrotistas. O impressionismo facilista diz que não há condições para um golpe porque Bolsonaro está isolado, não tem apoio do imperialismo, da classe dominante local e das forças armadas. Já as correntes impressionistas derrotistas querem justificar a sua adesão à frente eleitoral Lula-Alckmin dizendo que a luta pelo Fora Bolsonaro foi derrotada em 2021 e o único caminho que nos resta é a capitulação à colaboração de classes participando de uma frente eleitoral burguesa. Ambas orientações nos desarmam à luta política, pois, além de desarmar totalmente para as duas tarefas que temos hoje: derrotar o Bolsonarismo e lutar contra o retrocesso global das condições de vida em que vivemos, o quietismo (PSOL) que tomou conta da esquerda da ordem e o sectarismo que tomou parte da esquerda socialista (que povoa a esquerda dentro e fora do PSOL), incapaz de fazer qualquer frente política e unidade de ação para chegar às massas e enfrentar a estratégia golpista, desarma também para a luta contra os ataques da burguesia e de governos que possivelmente irão os representar pós-outubro. Com Bolsonaro ou Lula depois das eleições, a nossa classe deve apenas confiar em sua própria força para não sofrer novos ataques ou arrancada de qualquer conquista. Precisará se mobilizar permanentemente.
Mesmo que “tudo dê certo”, que Bolsonaro perca as eleições e passe a faixa presidencial para Lula, esse simples fato não irá mudar a correlação de forças entre as classes, não vai fazer retroceder as contrarreformas, a miséria que assola o país, a precarização do trabalho, a catástrofe climática e o retrocesso social que estamos vivendo. A vitória de uma chapa burguesa de conciliação de classes como a de Lula-Alckmin não irá mudar a situação da vida das pessoas, não vai combater a exploração, não vai reduzir a jornada de trabalho, não vai revogar as contrarreformas trabalhista e da Previdência, não vai reestatizar as empresas públicas privatizadas nos últimos anos, não vai garantir os direitos reprodutivos das mulheres, não vai combater o proibicionismo legalizando a produção, circulação e venda de entorpecentes, não irá acabar com a polícia militar para combater a violência e o encarceramento que está submetida a juventude negra e periférica no Brasil, não vai fazer a reforma agrária e urbana para garantir alimento e moradia para a massa dos povo trabalhador e não vai taxar as grandes fortunas e muito menos o capital financeiro para financiar a educação e saúde pública.
Ao contrário, em um momento de crise financeira como a que estamos, um governo como esse tende a fazer novas contrarreformas, como a que foi a reforma da Previdência feita por Lula em 2003. Por essa razão, só há uma forma de lutar para derrotar Bolsonaro, impor a soberania popular e medidas políticas, sociais e econômicas que interessem os explorados e oprimidos, ou seja, através da mobilização direta e auto-organizada das massas nas ruas. Tudo por fora dessa estratégia decisiva não passa de mera ilusão – caminho para a desmoralização de nossa classe. Trataremos um pouco mais desse tema na próxima parte.
PSOL: uma traição histórica com repercussões imediatas
Como já declaramos publicamente em outros documentos, rompemos com o PSOL por questões de princípio, estratégia e táticas. O PSOL carrega contradições profundas desde sua fundação, mas a sua liquidação política apenas acabou de se cristalizar com a decisão cupulista de construir a federação partidária com a REDE e ingressar na chapa burguesa de conciliação Lula-Alckmin. Sempre foi um partido amplo composto por correntes com estratégias opostas, mas não tinha atravessado a linha da independência de classe até então, pelo menos a nível federal. No entanto, a capitulação à conciliação de classes com o apoio de parte de sua ala esquerda, MES, Resistência e Insurgência, fez renunciar a sua independência política de classe com o seu programa fundacional e nos obrigou a romper com esse partido e nos lançar a um novo projeto construtivo.
A luta nas ruas, o enfrentamento à burocracia e a democracia de base estão muito longe de serem característica do PSOL. E esse fato, essa característica aparelhista, cupulista e eleitoreira que foi crescendo nos últimos anos somada a tremenda polarização político-social que vivemos não deixa de ter enorme impacto e explicar o porquê a direção do PSOL pôde romper com a independência de classe sem que uma rebelião ocorresse dentro do partido. No entanto, no decorrer do mandato burguês Lula-Alckmin, se eleito for e puder tomar posse, a tendência é que muito mais setores, militantes e figuras venham à esquerda.
O processo de liquidação do PSOL enquanto partido independente não foi um raio em céu aberto, mesmo tendo candidatura própria nas eleições de 2018, a diferenciação com o lulismo foi ausente. Com a soltura de Lula em maio de 2021 depois de condenações sem prova para tirá-lo do processo eleitoral, a pressão para que o PSOL não tivesse candidatura própria – bem como política e táticas independentes – tomou conta da maioria da direção do partido e acabou se impondo definitivamente na Conferência Eleitoral de abril deste ano. Passando por cima do Congresso partidário realizado no ano passado, além de ingressar em uma chapa burguesa, o PSOL aprovou uma Federação Partidária com um partido burguês, que é financiado por um dos maiores bancos devedores à Previdência Social e responsável pelo endividamento abusivo de trabalhadores – federação essa que tem um programa liberal desenvolvimentista.
A justificativa geral da direção do PSOL para ingressar na chapa de conciliação de classes foi o da ameaça golpista de Bolsonaro, a de que era necessário derrotá-lo no primeiro turno para desmobilizar o seu movimento, nada mais falso do que isso, pois seria taticamente cabível chamar o voto em Lula no primeiro turno para derrotar Bolsonaro sem renunciar à independência de classe. Na verdade, o ingresso na chapa Lula-Alckmin tem mais motivações eleitoreiras do que qualquer outra coisa, fazendo do sério e necessário debate sobre enfrentamento ao neofascismo um trampolim para interesses de aparato.
A traição da direção do PSOL às necessidades imediatas e históricas da classe trabalhadora ao ingressar na chapa Lula-Alckmin é concreta, pois significa na prática não apresentar nenhuma crítica à composição e nenhuma tática de exigência/denúncia voltada para impulsionar a luta direta nas ruas – cada vez mais necessária – e nem apostar em uma direção classista para o movimento de massas. Isso apenas comprova o quão renegador da independência, desviante da estratégia de mobilização da classe e traidor da necessidade de lutar desde a base contra a direção do aparato lulista para destravar a luta para derrotar Bolsonaro e alçar a nossa classe a luta em outro patamar, essas são as consequências da decisão da direção do PSOL.
A motivação da nossa ruptura não foi de tática eleitoral, a ausência de uma candidatura própria ou coisa que o valha. O problema incontornável de princípio foi que ao entrar na chapa burguesa, na prática se autoimpõe uma campanha acrítica, eleitoreira e que dilui o programa necessário para a conjuntura que pode se ver fartamente nos materiais de campanha do PSOL.
A vitória de Lula no primeiro ou segundo turno sem mobilização direta das massas não redundará automaticamente em mudança de correlação de forças, como defende a direção do PSOL. Apostar nisso é criar uma perigosíssima ilusão, pois além de Bolsonaro poder atentar contra o resultado das eleições, mesmo derrotado continuará representando uma poderosa força política que atuará sobre a realidade pressionando à direita permanentemente. Lula será um governo burguês, portanto, nosso inimigo -, mas, a questão é que sem mobilização os ataques que fará sobre a classe trabalhadora serão muito mais efetivos.
Rifam a independência de classe, as estratégias, programas e táticas em nome de um “realismo e inteligência tática”. Nada mais longe do realismo revolucionário, de sua ciência, esse é um pragmatismo estreito que sempre tira as massas da equação e o papel nefasto que cumpre o lulismo, estancando o seu avanço político. Na verdade, isso não passa do (bi) campismo eleitoralista que não aposta que as massas possam construir uma alternativa independente diante do neofascismo e de um setor da burguesia de um lado e da burocracia lulista de outro. É certo que o centro do processo eleitoral deste ano é derrotar Bolsonaro e isso tem um peso decisivo para a mudança da correlação de forças, porém derrotar o neofascismo nas urnas é condição necessária, mas não suficiente, falta a mobilização direta.
Polo Socialista Revolucionário: aposta como alternativa de reorganização
Em que pese os militantes honestos que continuam dentro do PSOL, já não há condições de reverter a capitulação, o oportunismo e o eleitoralismo sem que haja mudanças profundas na correlação de forças internas. Foi exatamente o que demonstrou o Congresso do PSOL, no qual o aparato eleitoreiro e de movimentos sociais que dirigem certas correntes acabou pesando de forma significativa para a vitória da maioria que impôs essa traição histórica que é ingressar na chapa Lula-Alckmin e compor uma federação partidária com a Rede.
Não se pode cinicamente desconsiderar – como fazem muitas correntes, grupos e figuras – que, ao entrar na chapa Lula-Alckmin, o PSOL comete uma profunda traição à necessidade de fazer a luta direta diante da escalada golpista e de construir uma alternativa de esquerda socialista de direção para o movimento de massas. A realidade atual exige táticas de exigência permanente à burocracia nas bases do movimento para se construir imediatamente a unidade de ação nas ruas. Enquanto isso, o PSOL, ao participar dessa frente eleitoral burguesa de conciliação de classes, além de dar sustentação política à burocracia traidora, não contribui para impulsionar a mobilização direta e nem para construir uma alternativa ao lulismo, tudo isso em nome de uma política eleitoreira. Infelizmente, aquele PSOL, que foi fundado para ser um instrumento democrático, pela base e de luta para ser uma alternativa à esquerda do lulismo, acabou e não sabemos se poderá se recuperar no futuro
Diante dessa ruptura do PSOL com a independência de classe, da necessidade de superar o lulismo pela esquerda e da mobilização autônoma da classe e dos oprimidos, a Bancada Anticapitalista no processo eleitoral se manterá no campo intransponível à independência de classe, com todas as estratégias e táticas que derivam dela e assim se apresentará. Também tem como tarefa impulsionar a reorganização política dos setores que romperam com o PSOL sem perder a bússola da independência de classe, do internacionalismo e da autodeterminação dos trabalhadores. Essas são coordenadas fundamentais para, a partir de uma reflexão crítica da teoria da revolução, retomar os balizamentos para o levantamento de uma nova organização em âmbito nacional que coloque no centro da sua atuação e construção a perspectiva estratégica emancipação dos trabalhadores e dos oprimidos – obra exclusivamente deles mesmos.
Além disso, como forma de organizar a independência de classe, nos somamos ao Polo Socialista Revolucionário com a perspectiva de articular o conjunto da esquerda socialista em uma grande frente política. O Polo Socialista Revolucionário, por iniciativa de partidos, organizações, correntes, figuras públicas e militantes surge nesse cenário como um espaço de reorganização política diante da falência do PSOL. Surge como uma frente que, a partir da desmoralização pela conciliação de classes, poderá ser construída como um espaço para a inflexão da esquerda independente. Poderá ser uma referência para o conjunto dos lutadores se conseguir levar uma política mais ampla de frente de esquerda para que se possa impulsionar a unidade na ação contra o golpismo nas ruas e influenciar os rumos políticos do país.
Em uma conjuntura indefinida, com uma escalada golpista em curso e sem que as forças da classe trabalhadora estejam postas para enfrentá-la, todos os esforços da esquerda socialista hoje devem estar voltados para a necessidade de recuperar as ruas como condição decisiva para impedir a sanha autoritária, garantir a soberania popular e mudar a correlação de forças para fazer retroagir os ataques sofridos nos últimos anos pela classe trabalhadora – mudança de correlação de forças que depende, evidentemente, da mobilização direta da nossa classe. Por essa razão, o Polo tem que atuar no sentido de unificar a esquerda que não se rendeu à conciliação de classes. Em que pesem as diferenças políticas, Vera Lúcia (Polo), Sofia Manzano (PCB) e Leonardo Péricles (UP), precisam imediatamente se sentar à mesa em uma frente política e a partir daí organizarem ações comuns que levem às massas a exigência de que Lula, PT, CUT e a direção de todos os aparatos de massas encarem a necessidade de enfrentar o bolsonarismo através do movimento de massas nas ruas.
Nesse cenário, a Bancada Anticapitalista apostará todas as suas forças na mobilização, no protagonismo e na auto-organização dos explorados e oprimidos para derrotar Bolsonaro. Somente a mobilização permanente das massas podem, em seu movimento, construir a força material capaz de colocar o bolsonarismo e a classe dominante na defensiva para que se possa combater a fome, o desemprego, a violência, a precarização e todas as mazelas impostas pela classe dominante e pelos seus governos. A derrota de Bolsonaro é decisiva, mas nenhum problema que vivemos hoje será resolvido por um governo burguês de conciliação de classes, como o possível governo Lula-Alckmin, por essa razão, a luta contra Bolsonaro só é completa se for feita a partir da luta direta das massas a partir de um programa anticapitalista que parta das necessidades mais imediatas dos trabalhadores e dos oprimidos. Assim, se faz central a construção de um calendário nacional de mobilização em unidade de ação com todos para acumular força política e social para no dia 7 de setembro colocarmos o bolsonarismo e todo o reacionarismo contra a parede e fincar, assim, a garantia dos direitos democráticos, econômicos e sociais pela pressão popular. Será a serviço de impulsionar a luta direta para derrotar o golpismo e por uma saída independente dos explorados oprimidos para a crise estrutural que lançamos a pré-candidatura da Bancada Anticapitalista. Com fascismo não se discute, esmaga-se com a força do movimento de massas!
Eixos programáticos para derrotar o golpismo
Abaixo apresentamos eixos programáticos anticapitalistas voltados para derrotar o golpismo e lutar pelos direitos da classe trabalhadora, dos negros, das mulheres, da comunidade LGBTQI+ e da juventude com os quais queremos debater com o conjunto dos companheiros visando a construção mais ampla possível de um sistema de consignas para a lutas atuais e para as eleições de outubro.
Unidade nas ruas
É necessário e emergencial a unidade da esquerda socialista diante das ameaças golpistas de Bolsonaro. Diante da transição das ameaças verbais de Bolsonaro ao terreno concreto da realidade, temos que articular três táticas decisivas para sairmos do atoleiro da falta de iniciativa política. Nós da Bancada Anticapitalista, fazemos um chamado público às organizações, figuras e lideranças, movimentos sociais e todas as pré-candidaturas majoritárias da esquerda socialista. Essa unidade é fundamental, pois sem ela torna-se inviável lutar pela unidade de ação para derrotar Bolsonaro nas ruas, bem como por exigências desde a base para que os dirigentes das organizações do movimento de massas e Lula chamem a mobilização.
É preciso lutar também para que se construa um calendário de lutas em meio da campanha eleitoral e, assim, não deixar que a ultradireita seja a única força política que ocupe as ruas. Essa é a tarefa principal na atual conjuntura, pois independentemente do resultado das eleições de outubro, o bolsonarismo não vai desaparecer e o próximo governo não será nosso, dos trabalhadores e dos oprimidos. Ante isso, é preciso acumular condições nas ruas, uma frente de esquerda socialista para mobilizar e exigir que a burocracia lulista convoque as bases, em unidade de unidade de ação, para enterrarmos o neofascismo no Brasil.
Medidas emergenciais
Um dos maiores problemas, se não o maior, é a fome no Brasil, são 33 milhões de miseráveis e por essa razão é preciso uma renda mínima permanente para toda a população desempregada de ao menos duas vezes o atual salário-mínimo e corrigida anualmente segundo os dados do DIEESE.
Para combater a pobreza, a fome e a miséria, precisamos que o salário-mínimo atinja o valor necessário para dar conta da subsistência de uma família. Assim, temos que lutar pelo salário-mínimo de 5.657,00.
O desemprego, a subutilização, o desalento e a precarização atingem ao menos metade da população economicamente ativa. Para resolver essa situação precisamos revogar as contrarreformas trabalhista e previdenciária.
A precarização do trabalho a serviço da lucratividade do grande capital virou uma imensa praga que assola a vida da sociedade. É preciso garantir carteira assinada, estabilidade no emprego, direito a férias, décimo terceiro e aposentadoria para todos os trabalhadores, inclusive os que trabalham para as plataformas eletrônicas transnacionais de exploração do trabalho como os entregadores.
A inflação, principalmente a alimentar, que chegou a cerca de 30% no último ano, assola a vida das famílias da classe trabalhadora, para combater essa catástrofe no poder de compra dos salários, precisamos ter medidas voltadas para congelar os preços da cesta básica e a reposição automática do salário a partir da inflação mensal.
Trabalho para todos e todas!
Em torno do trabalho se organiza toda a vida das massas, por essa razão é necessário lutar para reduzir a jornada de trabalho sistematicamente para que novos postos sejam criados, todos possam trabalhar, estudar e desenvolver outras atividades. Assim, defendemos a redução para 30h de trabalho semanais como máximo, plano de obras públicas de infraestrutura, casas populares e equipamentos públicos, bem com a expropriação das empresas que demitirem para que sejam colocadas sob o controle democrático dos trabalhadores.
Serviços públicos gratuitos
Os serviços públicos são fundamentais para a classe trabalhadora e não podem estar a serviço dos interesses econômicos e políticos da classe dominante. É necessário lutar em defesa dos serviços públicos que passam pela precarização visando a sua privatização para que se tornem fontes de lucro para os grandes capitalistas. Defendemos a total estatização, gratuidade, universalidade e qualidade de todos os serviços públicos, de saúde básica até a mais complexa, da educação básica até a universidade e do transporte urbano; gestão dos serviços pelos funcionários e pela população; fim das OSS nos serviços públicos; fim das terceirizações e precarização do trabalho em todos os serviços; efetivação imediata de todos os trabalhadores terceirizados; concursos públicos em todos os níveis; valorização salarial dos servidores públicos; financiamento dos serviços a partir da taxação do grande capital; não à reforma administrativa que tem como fim privatizar os serviços e colocá-los na mão das oligarquias políticas.
Habitação
O tema da habitação deve estar no centro das nossas preocupações, pois o déficit habitacional no Brasil atinge seis milhões de famílias. Além disso, a ausência de infraestrutura sanitária nas residências é escabrosa: 31% não tem acesso a água e 37% não tem acesso a esgotos. Esse quadro dramático que só vem se agravando com o desemprego, precarização do trabalho e inflação pode ser resolvido em parte esse problema com a ocupação para fins sociais das 7 milhões de moradias que existem no Brasil abandonadas ou para fins de especulação imobiliária e com o investimento imediato em obras públicas.
Juventude
A juventude que em diversos contextos históricos tende a cumprir um papel revolucionário, é chamada novamente à baila. Nunca foram tão dramáticos os desafios sociais para a juventude e a falta de perspectivas atingem todas as esferas da vida. Nessa etapa da luta de classes que vivemos pode haver, de alguma forma já está, cumprir um papel ainda mais importante na luta de classes do que em processos anteriores. Isso ocorre porque, como nunca visto antes, a falta de qualquer perspectiva de futuro com o crescente regres sismo capitalista e a crise ambiental coloca a própria existência das novas gerações em risco.
A violência policial, ou seja, é o órgão de repressão do estado que oprime e mata a juventude negra, trabalhadora e periférica de forma seletiva, a educação escolar é cada vez menos formativa; faltam empregos, o trabalho é totalmente precarizado. Para resolver a questão da violência policial, que atinge predominantemente a juventude negra, é preciso acabar com a política militar; fim da precarização do trabalho; educação pública e gratuita de qualidade em todos os níveis com o fim do vestibular; transporte público, gratuito e de qualidade; internet gratuita, equipamentos e projetos culturais gestados de maneira autônoma em todos os bairros; descriminalização e legalização imediata da produção, controle e do consumo da maconha e derivados, e demais drogas, acompanhada de políticas que assegurem a saúde e o suporte gratuito aos usuários e dependentes químicos, para pôr fim ao encarceramento da juventude negra, periférica e operária.
Opressões
O patriarcado, o racismo e a homofobia estão a serviço do capitalismo, mas devem ser tomados de forma específica e combinada com a luta dos demais explorados e oprimidos e com a luta anticapitalista. Em várias partes do mundo e no Brasil de Bolsonaro o ataque contra os oprimidos ganhou novas proporções e com a crise do modo de produção capitalista e o processo de barbarização da sociedade tendem a se agravar ainda mais, tornando assim as lutas dos oprimidos cada vez mais centrais para a classe trabalhadora.
Luta antirracista
O que o filósofo e historiador camaronês Achille Mbembe chama de necropolítica, quando o Estado escolhe quem deve viver ou morrer, já há muito tempo vem sendo colocado em prática contra o povo negro no Brasil, Silvio Almeida também deixa claro que a raça é um elemento de naturalização da morte. Como disse de forma brilhante e simplificada Malcom X, “não existe capitalismo sem racismo”, assim como Angela Davis que aponta como na sociedade capitalista as opressões e a exploração sobre o negro e a negra são consequências da relação entre as classes sociais e não relações individuais, e temos a luta antirracista, necessariamente, como uma luta pela destruição da sociedade capitalista através de medidas transitórias que, desde já, coloquem um basta na violência aos corpos negros.
Como pontos de discussão para negros e negras, defendemos: políticas públicas na área da saúde mental para a população negra, a que mais sofreu os impactos durante a pandemia e pós-pandemia; direito acesso ao tratamento da anemia falciforme – doença que contribui para um alto índice de mortalidade da população negra; manutenção da política de cotas raciais que será reavaliada pelo Congresso Nacional em agosto deste ano; fim da violência obstétrica nos corpos das mulheres negras como sinônimo de um política racista na área da saúde; cotas nas universidade – rumo ao fim do vestibular -, escolas e serviços públicos; pela aplicação imediata da lei 10.639/03; programas de emprego para a juventude egressa da escola pública; fim das terceirizações no serviço público e efetivação de todos os terceirizados e contratados temporários; políticas de demarcação e titularização das terras quilombolas com participação direta das comunidades tradicionais e financiamento de recursos públicos para desenvolvimento dos meios necessários para subsistência dos assentados; obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileira e indígena na rede pública e particular de ensino no país – sejam efetivamente aplicadas com estratégia de combate ao racismo; derrubada de todas as estátuas que simbolizam a tradição escravista do país e substituição por figuras e símbolos marginalizados pelo racismo estrutural; criação de políticas públicas de reconhecimento, valorização, promoção e preservação das manifestações culturais e religiosas do povo negro e dos povos originários; liberdade e proteção a todos os cultos religiosos; ampliação das políticas públicas de combate ao racismo institucional e a xenofobia; terminar de forma radical com a política de genocídio da população e da juventude negra nas periferias das cidades.
Mulheres e LGBTQIA+
Bolsonaro, e a sociedade capitalista em sua tendência regressiva no geral, combatam frontalmente as pautas mais centrais da luta feminista e do movimento LGBT, uma vez que elas buscam justamente romper os laços de opressão e exploração estabelecidos para a manutenção da ordem burguesa. O movimento de mulheres e da comunidade LGBT são uma enorme ameaça, pois além de serem setores que mobilizam, colocam em questão direta o patriarcado tão necessário para a reprodução capitalista e opressão sociopolítica. E é nesse sentido que apostamos nas mulheres e LGBT como protagonistas da luta de classes.
Sob o discurso de que a moral e a integridade da família tradicional estão ameaçados pelo avanço de pautas feministas e das diversidades sexuais, Bolsonaro fez de seu governo o mais misógino e reacionário. Declarou guerra ao movimento de mulheres e criou uma atmosfera fértil tanto para o retrocesso nos direitos e políticas de gênero, quanto para o avanço da violência doméstica, sexual e infantil. Para além das declarações cotidianas, citando apenas algumas, o apoio à brecha salarial de gênero, a crítica à conciliação da vida laboral e familiar, a oposição absoluta ao aborto e incentivo a sua criminalização com penalidades às mulheres que o realizarem, entre inúmeros discursos que reproduzem e reverberam a estrutura mais pútrida do patriarcado, da misoginia e do machismo.
Como pontos para discussão para as mulheres, defendemos: ampliação de casas de acolhimento às vítimas de violência e assédio, fiscalização para garantir o atendimento digno nas delegacias das mulheres e funcionamento 24h por dia, 7 dias na semana, além de instituições públicas de apoio psicológico e social; atendimento especializado da defensoria pública, política que pode evitar casos de feminicídio; investigação e responsabilização dos assassinos de mulheres e estupradores; educação para igualdade de gênero nas escolas de todos os níveis e nos locais de trabalho; educação para um livre exercício da sexualidade, prevenção de doenças e gravidez indesejada, disponibilidade na rede pública de diferentes métodos contraceptivos; distribuição obrigatória e gratuita de absorventes como item de higiene básica para todas as mulheres; campanha de conscientização da população em prol do aborto legal e seguro, no hospital, garantindo o direito da mulher de interrupção voluntária da gravidez, como sua escolha exclusiva; direito de todas a partos humanizados, pelo fim da violência obstétrica; medidas de capacitação dos profissionais da saúde (médicas/os e enfermeiras/os) no âmbito; criar condições de capacitação profissional, bolsas auxílio e oferta de emprego para as mulheres exploradas sexualmente; investigação e fechamento imediato de casas de exploração sexual; campanha de conscientização pela necessidade urgente de equiparação salarial entre homens e mulheres que exercem o mesmo trabalho e por políticas de fiscalização e punição de empresas que não cumpram esta regra; acesso à creche pública gratuita como direito à educação de todas as crianças, e direito para igualdade da mulher no trabalho; socialização do trabalho doméstico, restaurantes populares, lavanderias, serviço de limpeza doméstica.
Como pontos de discussão para LGBT, defendemos: desburocratização e desjudicialização dos processos de adequação de sexo da população trans; saúde especializada, com acompanhamento humanizado no processo de readequação dos corpos, com qualificação dos profissionais da saúde para atendimento a transexuais; combate à violência, com a garantia de que as mulheres trans possam ter acesso à rede de enfrentamento à violência contra a mulher; campanha de conscientização da população em prol do direito das mães trans; mulheres e homens trans também devem ter direito à licença maternidade de 180 dias, quando tiverem filhos por meio de adoção ou outra forma de concepção; campanha de conscientização da população pela proteção a toda forma de família, com a garantia do casamento civil igualitário para a população LGBTQI+; saúde pública especializada, com estímulo à produção e difusão de campanhas permanentes contra a DST´s e sensibilização dos profissionais da saúde voltadas às mulheres lésbicas, às bissexuais e às transexuais, com ampliação da política de ambulatório trans em toda a rede; ampliação da rede de acolhimento a LGBTQI+ expulsas de seus lares e assistência social e econômica para as famílias vítimas da LGBTfobia; programas de acesso à formação e garantia de vagas no mercado de trabalho; banheiros alternativos em locais públicos; campanha para conscientização da população pela necessidade volta imediata do tema Sexualidade e Gênero, na BNCC (Base Nacional Comum Curricular).
Meio socio natural
O capitalismo estabelece uma relação socio metabólica com a natureza que está a serviço apenas do lucro, ou seja, de uma lucratividade que permita a acumulação do capital independente dos processos naturais. O trabalho no capitalismo ao alienar o homem da sua atividade vital, o aliena dos demais homens e também da natureza, todos os elementos destas são transformados em meios sem que se reconheça a suas dinâmicas necessárias, com isso, a irracionalidade deste sistema causa desequilíbrios que se aproximam de desorganizações estruturais que podem colocar em risco a existência dos seres humanos e de outras várias espécies no planeta, como é o caso do aquecimento global causado pela produção e emissão desenfreada de energia na atmosfera. Processo esse que no Brasil dependente das economias centrais tem se agravado no governo Bolsonaro, negacionista do aquecimento global, que toma medidas para dificultar a fiscalização de derrubadas e queimadas, protege os invasores das terras e assassinos dos povos originários. Por essa razão, é preciso tomar medidas de expropriação da burguesia ecocida, reestatizar as empresas de mineração, de água e saneamento, criar fontes de energia e um processo de reforma urbana em que as cidades estejam a serviço da maioria da população e que não impeçam os processos naturais, como é o caso da absorção das águas das chuvas pelo solo e das recomposições das várzeas dos rios.
Taxar o grande capital
Em nosso país, a taxação é feita basicamente sobre o consumo de bens e serviços, ou seja, é o povo quem paga a conta. A renda, a propriedade e as transações financeiras contribuem apenas com cerca de 29% dos impostos. Além disso, as grandes empresas têm uma isenção fiscal de R$346,6 bilhões. O que caracteriza a regressividade da lógica tributária brasileira é que os mais pobres contribuem com muito mais impostos do que os ricos. É por essa razão que temos que lutar para a suspensão imediata da isenção fiscal, pela taxação dos lucros, da renda do capital e pelo não pagamento da dívida pública aos grandes investidores com auditoria pública.
É preciso lutar pelo poder
Nessas eleições, precisamos, além de lutar para derrotar Bolsonaro nas ruas e por um plano econômico emergencial dos trabalhadores, agitar a necessidade de bandeiras anticapitalistas para refundar o país sobre novas bases sociais anticapitalistas e socialistas. É preciso lutar contra o poder da burguesia e instaurar um verdadeiro governo da classe trabalhadora, com o objetivo de colocar a riqueza e recursos do país em função de melhorar as condições de vida e superar a exploração e opressão.
Essas medidas de enfrentamento aos interesses da classe dominante e com o poder do estado burguês só podem ser colocadas em prática a partir de um profundo processo revolucionário, uma combinação entre a mobilização das massas independente dos patrões e da burocracia com a construção de partidos revolucionários com influência de massas. Esse movimento de autodeterminação da classe trabalhadora e dos oprimidos pode colocar em pé o duplo poder através de organizações políticas das massas que destruam o estado burguês e coloque em seu lugar um estado de novo tipo e um governo dos trabalhadores. Ou seja, precisamos, além de lutar para derrotar Bolsonaro nas ruas e por um plano econômico emergencial dos trabalhadores, também agitar a necessidade de bandeiras anticapitalistas que façam reverter a destruição socioambiental em larga escala que tem provocado o capitalismo para ir além dele.
Por essa razão, a Bancada Anticapitalista se coloca em total oposição à traição histórica em todos os aspectos – da necessidade de levar a luta nas ruas para derrotar Bolsonaro e da luta anticapitalista, passando pela necessidade de superar a burocracia lulista pela esquerda – que significa a entrada do PSOL na chapa Lula-Alckmin. Apontamos para a necessidade de superar a experiência do lulismo pela esquerda e nos colocamos a serviço da construção de outra organização política revolucionária no Brasil, que supere tanto o sectarismo quanto o oportunismo.