Eugênia Andrade e Timeni Andrade – Vermelhas
O cenário que enfrentamos hoje de violência contra a população negra, racismo, de negacionismo, e principalmente de deslegitimação da ciência ajudou a resultar em uma pandemia fora de controle. Isso combinado com a ausência de uma liderança governamental confiável, capaz de priorizar sua atenção a saúde pública e a vida de milhões de pessoas, faz com que a realidade faça a sociedade a se mover. Enfrentamos hoje, além dos efeitos dramáticos da pandemia, os mesmos problemas sociais do período anterior, só que ainda mais agravados.
E mesmo no momento de isolamento social, é visível a violência estatal contra a população pobre mais vulnerável e principalmente à população negra, que além do descaso institucional sofre com a brutalidade policial incentivada pelo discurso do ódio e do armamentismo, além disso temos a “invisível” violência de gênero, a qual nos preocupa enormemente a segurança e a vida das mulheres, que estão nesse momento obrigadas a conviver confinadas com homens machistas e agressores, se tínhamos que resistir antes, agora muito mais.
Frente a isso, e diante da constatação cada vez maior de que Bolsonaro e todo o seu governo, não só foram incapazes de anemizar diversas questões sociais, mas como deseducar a população e discursivamente legitima, esse e outros atrasos, que, sem dúvidas, aprofundam as desigualdades sociais em nosso país.
Não foi por falta de aviso, mas Bolsonaro e seu projeto político são os responsáveis por ações que resultaram atualmente em milhares de vítimas, não por inexperiência e irresponsabilidade apenas, como afirma a impressa hegemônica, mas de maneira deliberada e consciente. A prova disso é a resistência em permitir a transparência dos dados sobre os impactos do coronavírus, dos gastos do governo e a interferência no funcionamento democrático das instituições.
As inúmeras declarações descabidas do presidente deixaram de parecer jocosas e passaram a ser uma contundente ameaça à democracia, com a democracia não se paga para ver, ela é a única garantia de que pelo menos a sociedade civil, tenha a possibilidade de se organizar.
Por isso, nas duas últimas semanas o coletivo esteve presente nas manifestações pela democracia, contra o racismo e a constante tentativa de reabertura da economia sem controle da curva do vírus, estaremos das ruas tomando todos os cuidados sanitários possíveis, contra essa estrutura capitalista racista e patriarcal que mata e que não respeita sequer o sofrimento da mães negras, vamos contra a retirada de direitos trabalhistas das mulheres e em defesa das suas vidas. Vamos às ruas contra o racismo e para exigir o lugar democrático do povo.
O governo Bolsonaro e o negacionismo
Como dissemos o presidente Bolsonaro não promoveu e nem vai promover medidas governamentais eficientes para evitar que a doença se espalhe pelo país, que agora ocupa o terceiro lugar mundial no número de mortes, com mais de uma morte por minuto. Com 1.300 mortes registradas nas últimas 24 horas, o país se aproxima de 40 mil mortes. Ainda nesse cenário negacionista de descredito da medicina, várias manifestações da base bolsonarista vinham acontecendo sem a devida preocupação sanitária, que inclusive, contavam com a presença do Presidente sem máscara ou qualquer medida de distanciamento social, com nenhum alinhamento com as orientações de agências especializadas em saúde, como a Organização Mundial da Saúde (OMS). E agora o plano nacional é de reabertura da economia, sem qualquer controle da curva de infecção.
Autoritarismo
Antes mesmo da pandemia, as bases de um regime autoritário já estavam sendo estabelecidas como projeto desse (des)governo. Os atos do Presidente da República se somam à mobilização permanente de uma base social reacionária em manifestações antidemocráticas que pedem por um novo AI-5, pelo fechamento do congresso e provocando questionamentos sobre a confiabilidade e pertinência do Supremo Tribunal Federal (STF).
Após o ato convocado pelas torcidas organizadas, no dia 31/05, na Paulista, entrou em debate o artigo 142 da Carta Magna, que atribui poderes ao presidente de chamar o exército às ruas para garantir a ordem. Em um ponto alarmante da reunião ministerial do dia 22 de abril, Bolsonaro profere comentário, que posteriormente também é feito pelo atual Procurador Geral da República (PGR), Augusto Aras, em relação à possibilidade de intervenção militar e/ou convocação das forças armadas para interferir na mediação ou solução de conflitos entre os poderes.
Tal suposição foi afastada e criticada, tanto pela Câmara dos Deputados, quanto pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que se posicionaram, defendendo que o exército, a marinha e a aeronáutica não são incumbidos como “poder moderador” entre o executivo, legislativo e judiciário, dado que não pertencem ao poder. As forças armadas estão designadas na Constituição Cidadã para “defesa da pátria, para garantia dos poderes constitucionais, da lei, e da ordem”, o que de maneira alguma pode ser confundido sob o alicerce do Estado Democrático de Direito com intromissão nas esferas de poder. Para interpretação e função de guardião da Lei Suprema, tem-se o STF, que possui essa tarefa como função típica e na ocorrência de qualquer dissenso ou conflito, deve-se buscar os mecanismos de freios e contrapesos dispostos no ordenamento jurídico.
Racismo estrutural, necropolítica e o caso do menino Miguel
A classe trabalhadora tem exposto a si e a sua família dia a dia, o risco de contaminar para não morrer de fome. O auxilio recurso e direito dos mais vulneráveis Bolsonaro trata como se fosse dinheiro seu e usa de diversos artifícios para retardar o pagamento, não bastando jogar com as reais necessidades do trabalhador, tem que humilha-lo.
Um exemplo muito triste disso ocorreu nessa terça-feira (02), com a família do menino Miguel de cinco apenas anos, na capital pernambucana. A criança que estava no trabalho da mãe acabou falecendo depois de uma queda de 9 andares, graças a negligência da patroa da mãe da criança, e em decorrência de uma estrutura que descuida, invisibiliza e desumaniza uma pessoa negra, e mesmo se ela for uma criança não precisa de cuidado e proteção. A Mirtes Renata Souza é uma mulher negra que foi obrigada a ir trabalhar em meio à pandemia e levar o filho consigo, pois o estado de maneira indireta lhe obriga, através de suas necessidades de subsistência que não lhe garantiu o mínimo de estrutura necessária para que ela vá ao trabalho e deixe seus filhos em segurança.
A necropolítica é a tônica do Bolsonarismo. Esse gerenciamento de estado de modo genocida, que coloca o lucro acima da vida, atinge primeiro a mulher negra, que é o indivíduo mais explorado na nossa sociedade.
A importância da organização popular
Com o exemplo do levante popular, temos os Estados Unidos que está convulsionado por um movimento massasivo pela morte brutal de Georg Floyd. Mesmo passados 17 dias após o ocorrido, vem ganhando apoio de cada vez mais setores da sociedade. Durante o levante, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, foi levado pelo serviço secreto ao bunker da Casa Branca, após intensa manifestação nos arredores da casa presidencial. E vitórias importantes foram conquistadas como a completa reestruturação da polícia da cidade de Minneapolis e a queda da popularidade de Trump. O poder do povo é muito maior do que aqueles que estão no poder. O mundo hoje assiste a nação capitalista reconhecer sua fraqueza diante da força dos seus trabalhadores. Reconhecemos que falta organização e politização dessas massas, porém, é um começo, uma faísca de revolução.
A luta no Brasil
O coletivo esteve presente nos atos dos dias, 31/05 e 07/06, em São Paulo, e é notável a disposição de luta de um setor convencido de que a população periférica não pode mais esperar, que as mulheres em situação de violência não podem esperar, que a resistência contra o genocídio e a retirada completa de direitos não pode esperar, que a posição contra o Estado e polícia racista não pode esperar, e que, principalmente, a defesa da democracia não pode esperar.
Todas nós entendemos a importância do isolamento social para controle da pandemia. E sair para se manifestar deve ser uma decisão daquelas e daqueles que podem, e tomando sempre as medidas de saúde necessárias. Por isso, esse não é ultimato, mas um chamado para as mulheres, para as centenas de companheiras trabalhadoras que não tiveram a oportunidade de ter uma quarentena, para todas que se encontram desempregadas e que amargam as incertezas sobre o futuro e inclusive da democracia do país, para aquelas que se sensibilizam com a dor de uma mãe negra e se indignam com a brutalidade policial contra a população periférica e negra. Vamos às ruas, companheiras!
[…] dessa realidade cada vez mais dinâmica, mas não menos problemática, movimentos e coletivos de mulheres e LGBTQI+ também devem ir as ruas enfrentar esse desgoverno. Somente uma grande reação popular, daqueles que tem condições de ir às ruas nesse momento, […]
[…] do encarceramento feminino – das mulheres em meio a pandemia. No início da pandemia fomos as primeiras, cumprindo as normas de segurança sanitárias, a irmos às ruas contra o crescimento da violência, experiência que nos demonstrou que é possível colocar nas […]