A Covid-19 no Brasil: particularidades de uma pandemia e necessidade de romper com a inércia política

Por Martin Camacho

Já estamos há um ano da detecção dos primeiros casos de Covid-19 no país e muita coisa aconteceu desde os primeiros infetados vindos da China ou Itália. O vírus acabou disseminando em todos os rincões, desde as grandes cidades até povoados indígenas. Hoje já somam mais de 2,4 milhões de mortes no mundo e umas 245 mil no Brasil, sem contar os infectados que chegam a mais de 100 milhões.

O século XXI pode ser marcado por uma nova ordem de vida mundial. A corrida por vacinar a mais de 7 bilhões de pessoas coloca ainda mais como o capitalismo pode ser despiedado com os trabalhadores – as farmacêuticas do mundo estão fazendo a festa no meio da uma crise econômica e sanitária.

O que se sabe que começou no sudeste asiático. Mas, ainda não se sabe exatamente de onde que saiu o vírus, as denúncias conspiratórias que o vírus foi fabricado em um laborativo da China é puramente negacionismo de que relações de exploração do capitalismo e suas relações destrutivas com a natureza cria desequilíbrios dos quais hoje estamos padecendo.

O desequilíbrio da natureza se vê mais acentuado nas últimas décadas. Sabe-se que um vírus demora algumas décadas para passar de um hospedeiro para outro até se encontrar um vector que permita distribuí-lo pelo mundo todo.

Em uma corrida por vacinar suas populações, os países que ditam a ordem mundial correm com mais vantagens que outros países. O Brasil é um caso especial porque o negacionismo colocou o gigante da Sud américa em um patamar ainda mais desigual.

A política genocida de Bolsonaro sistematicamente rechaça a utilização de vacinas. Alinhado com a política do Trump, utilizou o aparato do estado para incentivar a compra de cloroquina e sua utilização reiteradas vezes em contraposição de incentivar a pesquisa e a industrialização de insumos, tanto para a vacina, como de material hospitalar.

Primero foi a importação máscaras e equipamento de proteção, depois foi seringas e hoje são os componentes das vacinas. O país destruiu toda a indústria farmacêutica que tinha, ficando refém dos interesses estrangeiros sem incentivar o trabalho nacional e empobrecendo cada vez mais a população.

Com isto chegamos a um ponto de difícil de retorno que é o desmantelamento do sistema único de saúde, o SUS. Um macabro programa para liquidar a saúde da população mais pobre em detrimento dos lucros dos empresários da morte.

Vacinas em conta gotas

Depois de tomar pé da pandemia, os diferentes laboratórios do mundo se colocaram em uma guerra para ver quem chega mais rapidamente a uma vacina que de algum nível de satisfação que imunize a população. Quem chegar primeiro e com bons resultados o lucro pode não ter limites. Como aconteceu com os respiradores, os estados entraram em uma guerra diplomática para ver quem conseguirá as primeiras levas e assinar acordos de exclusividade.

Obviamente isto está restrito a um certo número de laboratórios, por questões tecnológicas não é qualquer um que pode produzir estas vacinas. É por isso que as escassezes ou a dificuldade de as produzir a nível planetário se faz conscientemente.

Não é rentável que todos possam fazer vacinas, hoje o preço oscila entre 5 e 15 dólares cada vacina. Assim, o desenvolvimento científico, que foi um esforço enorme, choca-se com a maquinaria capitalista ao colocar barreiras na produção de vacinas. A indústria farmacêutica move bilhões e os lucros especulativos com a saúde da população intensificam mais ainda os lucros.

Como não poderia ser de outra forma, o governo Bolsonaro fez tudo errado. Como resultado é preciso entrar na fila da importação das vacinas. Mas, mesmo com a pequena quantidade, os erros se intensificam também. Em primeira instância, o bolsonarismo troca a direção do Programa Nacional de Imunizações (PNI) que tinha experiencia comprovada no trabalho de vacinar 18 milhões de crianças contra a poliomielite em um só dia, 100 milhões de pessoas contra a H1N1 em três meses em 2010, e 80 milhões contra a influenza em 2020. Números muito distantes aos que vemos hoje dia após dia nos jornais.

A isso se soma a falta de planejamento dos estados e municípios, o que leva a uma total desorganização, uma verdadeira bagunça, como fala Drauzio Varella. Uma verdadeira bagunça em que se confunde prioridades, perdem-se doses de vacinas e cresce a incerteza de quando serão dadas as segundas doses. Por exemplo, existem pessoas da saúde que não têm contato com doentes e já foram vacinados. Com esta desculpa, muitos políticos pilantras que são médicos estão se aproveitando da situação.

A distribuição aleatória, sem levar em conta os fatores do sistema da saúde da localidade é uma demonstração da política de caos do governo. O exemplo clássico, nos perguntamos, é porque não se vacinou primeiro o estado de amazonas, onde tínhamos visto um sistema totalmente deficitário com a falta de oxigênio e origem de uma nova cepa mais virulenta? Agora já é demasiado tarde, a nova cepa foi distribuída pelo país todo ao trasladar pacientes para outros estados.

Agora temos outros agravantes. Quando se começa uma vacinação prepara-se para ter vacinas suficientes, mas hoje esse não é o caso. O que pode ficar ainda mais bagunçado quando se tem que dar duas aplicações do mesmo laboratório. Ou seja, se eu recebi Fiocruz/AstraZeneca, logo não posso aplicar Butanta/Sinovac ou Sputnik V, Pfizer, Moderna, CureVac, Sanofi ou Sinopharm. Vai saber quantas variantes podem acontecer no desespero das pessoas…

Se em um estado chegou um tipo de vacina, nada garante que na próxima leva cheguem do mesmo laboratório, ou seja, a pessoa vai ter que esperar outro carregamento de vacinas? São mais de 38 mil salas de vacinação em todo o país por um prazo mínimo de dois anos. E ainda ninguém garante quanto tempo imuniza as vacinas.

Por isso que faz falta uma campanha internacional que coloque a demanda de vacinas para todos e de forma gratuita. Esses imunizantes têm que ser declarados de patrimônio da humanidade e ser fabricados em todos os países. Tecnologia e pessoal para isso têm, só falta pressão internacional para liberar as patentes. Sim isso vai ser difícil imunizar rapidamente o mundo todo sem que se forme novas cepas que inviabilizem as próprias vacinas hoje existentes.

Segurança alimentar e saúde mental

Dois temas colaterais à pandemia que o governo não se preocupa minimamente. Em primeiro lugar, o estado cortou o auxílio emergencial que começou em R$600 com muita briga e pressão, depois foi para R$300 e faz dois meses que milhares de pessoas não tem fontes de renda.

A fome começa a aparecer com mais força entre as classes D e E. A Unicef fala em cerca de 30% das famílias que deixaram de comer por falta de renda. A fome está pegando na base da pirâmide populacional. Isso acrescentado paulatinamente à inflação sofrida pelos preços dos alimentos deixa ainda mais achatados os míseros salários.

Outro problema é a saúde mental. O Brasil já era campeão em consumir drogas lícitas ou ilícitas para reduzir a pressão que faz nas pessoas o mundo capitalista. Os famosos medicamentos de tarja preta foram contabilizados em 1,4 bilhões de comprimidos no 2015.

Hoje, sem dúvidas, esses números se multiplicam. Uma pesquisa da USP relata que brasil se encontra no topo dos países com pessoas com mais depressão e ansiedade do mundo. E, sem dúvidas, as políticas destrutivas do governo fazem com que as pessoas tenham a vida ainda mais perturbada em época de pandemia.

O problema da saúde mental se dissemina entre a juventude, pois se a falta de perspectiva em um mundo capitalista já era preocupante, hoje é muito mais. Uma sociedade doente não consegue enfrentar os seus problemas, coisa que os políticos de turno, inclusive da esquerda, não conseguem nem chegar perto das soluções.

É por isto que é primordial se organizar e não se isolar, chega de espaço para os neofascistas e ultraliberais. É preciso enfrentar este governo e sua política negacionista e genocida não apenas nos espaços institucionais, temos que ir às ruas (com cuidados sanitários) em defesa do auxílio emergencial de um salário-mínimo taxando os grandes empresários e parando de pagar a dívida pública; da vacinação em massa de toda a população quebrando as patentes e por postos de trabalho através de projetos de infraestrutura que incorporem milhões de trabalhadores que perderam o emprego. É fundamental lutar também pelo fora Bolsonaro/Mourão e toda sua milícia, acompanhado de eleições gerais.