Em defesa da segurança alimentar, das condições de trabalho, da vida e do meio
LUCIANO MATHIAS
Em período de Copa do Mundo, quando todos os olhares estavam voltados para a seleção brasileira, Governo, Congresso e STF usam do momento para passar medidas das mais polêmicas/regressivas possíveis.
Tais medidas fazem parte da ofensiva reacionária vigente. Com o recuo parlamentar na votação da Reforma da Previdência, o governo na tentativa de compensar e favorecer a grande burguesia anuncia diversos projetos neoliberais que atacam toda a população.
A própria intervenção militar no Rio de Janeiro, que impede que reformas constitucionais sejam feitas, coloca uma situação de maior bonapatismo político-jurídico, favorecendo o ambiente para que contrarreformas infraconstitucionais sejam aprovadas, tais como a privatização da Eletrobrás e da Embraer, e o pacote neoliberal de 15 itens anunciado pelo governo em fevereiro.
Aliado a essas medidas, na Câmara dos Deputados uma Comissão aproveitou a tramitação por 18 votos a 9 no, dia 26/06, o projeto de lei 6299/02, batizada como “PL do Veneno”, que tem como proposta a atualização da lei de 1989 sobre a utilização de agrotóxicos.
Se não bastasse o Brasil já ser o maior consumidor de agrotóxicos do mundo, querem permitir o uso de 14 substâncias que são proibidas no mundo inteiro. Para o governo, a saúde definitivamente não é uma preocupação, a prioridade clara é atender aos interesses do agronegócio que visa o lucro, o mercado, as commodities e o latifúndio.
Vale lembrar que a bancada ruralista representa uma das maiores e mais poderosas bancadas da Câmera dos Deputados, são 200 deputados federais de um total de 513 que fazem parte dela. Aliás, a vitória de Michel Temer na Câmara dos Deputados em meados do ano passado, na qual barrou sua denúncia de corrupção passiva, não seria possível sem essa bancada.
A grande maioria do Congresso está a serviço de menos de 1% da população, aprovando medidas que incide sobre os outros 99%. Por isso, é necessário que, mesmo com alguns representantes parlamentares denunciando veemente a atrocidade que está ocorrendo no interior do congresso, que a luta seja feita na rua, que a população se faça presente e atuante, pressionando e barrando os ataques reacionários.
A PL foi elaborada pelo atual ministro da agricultura Blairo Maggi (PP). Dentre as propostas presentes no projeto estão: a mudança do termo “agrotóxico” para o termo “fitossanitário”, que seja proibido unicamente substâncias que possuam “risco inaceitável” e a liberação do registro temporário de substâncias que não conseguem ser analisadas a tempo. Ou seja, mesmo substâncias que de risco inaceitável poderão ser utilizadas até que seja provado o risco para a saúde humana, animal e ambiental.
Outra medida, não menos absurda, prevê a centralização para o Ministério da Agricultura do poder de decidir a utilização de novos agrotóxicos, anteriormente essa era uma decisão que cabia também ao Ministério da Saúde e do Meio Ambiente. Se estivermos falando de alimento, é impensável que órgãos de saúde e os próprios consumidores não estejam presentes para avaliar os riscos nocivos de novas substâncias que vão para a comida do prato.
A população quer e deve estar presente nas votações que interferem em suas vidas!
Projetos como esses que afetam a vida da população, devem necessariamente passar por uma consulta popular, plebiscitos e outras formas democráticas diretas, como apresentado pelo programa do PSOL. Um Congresso que não está a serviço da população e que, definitivamente, não representa a classe trabalhadora e os oprimidos não pode ser responsável por aprovar medidas que definem o rumo da vida desses.
Mesmo o discurso capitalista de lucro, que a bancada ruralista apresenta como argumento, ao afirmar que a não utilização de novos agrotóxicos acarretam em prejuízos bilionários, não faz sentido. A maior produtividade agrícola pode ser obtida por melhorias técnicas, por processos inovadores e a partir de uma produção voltada para os interesses internos e não de uma medida que visa o lucro imediato dos latifundiários que está acabando com os elementos fundamentais da produção, ou seja, o homem e meio.
Um projeto que, como outras práticas agrícolas, tende a destruir/esgotar esses elementos, não possui nenhuma preocupação com a vida e as condições básicas dessa e das próximas gerações. Além disso, o prejuízo na saúde pública será muito maior, é inegável que tal medida esteja ligada diretamente com a saúde, e que isso significa o aumento de pacientes com doenças crônicas. Isso foi confirmado por diversos especialistas da área. Mesmo atualmente, sem a liberação desses novos agrotóxicos, diversos casos de câncer e até puberdade precoce foi constatado em populações que vivem próximos aos locais onde se usam agrotóxicos.
A própria ONU enviou uma carta no mesmo mês da aprovação do projeto alertando contra o pacote do veneno e defendendo que o pacote fere o direito do povo brasileiro a um ambiente seguro, limpo, saudável e sustentável. “Nós manifestamos a preocupação de que as múltiplas alterações propostos ao marco legal e institucional existente referente aos agrotóxicos possam enfraquecer significativamente os mecanismos de proteção que são vitais para garantir os direitos humanos de agricultores, comunidades que vivem em torno de locais de aplicação de agrotóxicos, e da população que consumo os alimentos produzidos com base nestes produtos químicos”, afirma o documento.
Também são oficialmente contrários ao projeto órgãos como Ministério da Saúde, Conselho Nacional dos Direitos Humanos, MPF, Ibama, Fiocruz, INCA, Ministério Público do Trabalho, Defensoria Pública da União, até a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) que não é nenhum exemplo da defesa de alimentos saudáveis, mostrou-se contra.
Ataque direto do Governo aos trabalhadores, pequenos produtores e consumidores
Procurando atender ainda mais e unicamente as grandes empresas, a Câmara dos Deputados também aprovou na última segunda-feira (02/07), a PL que restringe a venda de orgânicos. Luiz Nishimori (PR-PP), o mesmo relator da PL do Veneno, foi também o relator desse projeto.
Basicamente, o projeto proíbe que grandes corporações como Pão de Açúcar, Extra, Carrefour e Walmart vendam produtos orgânicos que são negociados diretamente com o produtor. A venda de produtos orgânicos ficará restrita a feiras abertas ou propriedades particulares.
Esse pacote de projetos aprovados em uma semana representa um ataque direto à segurança alimentar da população, à integridade do meio, aos trabalhadores rurais – que já são duramente castigados pelos pesticidas – e aos pequenos agricultores.
É necessário realizar imediatamente uma mobilização de rua. Uma frente única entre consumidores, pequenos produtores, ambientalistas, ribeirinhos, originários, pois esse projeto coloca em risco não apenas a segurança alimentar, mas contamina todo o meio e afeta a população como um todo.