Nota oficial da Executiva Nacional do PSOL
Fora Bolsonaro e Mourão e eleições gerais democráticas já!
1. Iniciamos o ano com a economia patinando e ataques do governo à democracia. Apesar disso, Jair Bolsonaro, segundo pesquisas recentes, contava com o apoio ou aprovação de um terço dos brasileiros e brasileiras ao seu governo. Além disso, ele mantinha no Congresso Nacional uma agenda, liderada por seu ministro da economia, Paulo Guedes, que encontrava uma base de apoio parlamentar pronta para aprovar as contrarreformas ultraliberais.
2. A pandemia do coronavírus e suas consequências abriram uma nova fase da vida do país e do planeta. Milhares de pessoas já morreram e centenas de milhares estão infectadas em quase todos os países do mundo. Ainda não é possível mensurar todas as consequências humanitárias, econômicas, sociais, políticas, ambientais e mesmo culturais que a pandemia provocará após ser controlada. Enquanto laboratórios e institutos de pesquisa correm contra o tempo, buscando fabricar uma vacina, a medida considerada mais eficaz até aqui é o isolamento social. E tal medida, necessariamente, produz efeitos devastadores na economia, por que o pressupõe que milhões de trabalhadores e trabalhadoras fiquem em suas casas, parando toda produção e circulação de mercadorias em vastas partes do mundo.
3. Há grandes evidências de uma relação direta entre o surgimento da Pandemia do coronavírus e a destruição da natureza imposto pela nova etapa do neoliberalismo pós-crise de 2008. Assim como outras doenças endêmicas, as pesquisas sobre a origem do coronavírus demonstram forte relação com a indústria de consumo de carne de animais silvestres. Na medida em que o vírus se alastrou, é correto afirmar que as políticas de austeridade que foram impostas pelo neoliberalismo, desmontando os sistemas de saúde públicos e sistemas de proteção social, têm sido o principal fator de facilitação do alastramento do vírus e de um enorme impacto social sobre os mais pobres. Essa é mais uma evidência que o desenvolvimento capitalista, com sua austeridade e a crise ecológica, são desencadeadores de desastres sociais de proporções globais e são incompatíveis com a vida. É necessário a construção de uma saída ecológica e popular ao desastre que a pandemia e a austeridade têm causado a vida das pessoas no mundo inteiro.
4. A possibilidade de vivenciarmos uma recessão mundial é evidente e os mais penalizados serão os que vivem do trabalho e os excluídos, vítimas da falta de retaguarda social e médica disponível e afetados pela dispensa ou diminuição de renda. O Brasil entrou nesse circuito no final de fevereiro e as respostas do governo Bolsonaro têm sido erráticas. Enquanto o Ministério da Saúde orienta estados e municípios numa política de mitigação do problema (com paralisação parcial do funcionamento das cidades, começando pelas escolas e universidades e já paralisando o comércio), o presidente menospreza a gravidade da crise, descumpre recomendação de isolamento dele próprio, comparece a manifestação golpista e chama a pandemia de “histeria”, “fantasia” e “alarde da imprensa”.
5. Sem uma condução firme e centralizada, o país se encontra despreparado para o crescimento vertiginoso dos casos, havendo falta de testes, fragilidade no monitoramento e provável colapso do sistema de saúde cada vez que chegamos perto do pico da pandemia, previsto para o próximo mês. As medidas anunciadas pelo governo para minorar os efeitos da crise na vida das pessoas também são frágeis e pontuais, mais preocupadas em proteger as empresas do que os trabalhadores. Em um país com 12 milhões de desempregados e 40 milhões vivendo na informalidade, a crise será devastadora. As medidas traçadas até aqui pelo governo são completamente incapazes de diminuir o impacto na vida das pessoas mais pobres, sobretudo trabalhadores informais, trabalhadoras domésticas, trabalhadores por ganho, em sua maioria negras e negros, muitas vezes mães de família, que terão a carga dobrada de cuidar de seus familiares. É preciso, além disso, de atenção e proteção à população de rua. O racismo é estrutural e em momentos de pandemia ele é potencializado pelos mecanismos de exclusão do Estado. É necessário priorizar o cuidado com as famílias mais pobres.
6. No contexto de um governo ultraliberal e autoritário, devem ser adotadas medidas que garantam as liberdades democráticas e os direitos humanos. As inevitáveis restrições de mobilidade diante da crise sanitária não podem ser traduzidas em medidas que aprofundem a militarização antidemocrática da sociedade. O poder legislativo de maneira nenhuma pode deixar de funcionar, ainda que de maneira não presencial. É fundamental que as medidas tomadas pelas autoridades sejam totalmente transparentes e não justifiquem a violação de direitos. Para as pessoas privadas de liberdade, por exemplo, deve ser estabelecido plano específico de prevenção e contingenciamento, devendo ser disponibilizado relatório que garanta o monitoramento e as providências tomadas.
7. O consenso dos liberais em torno de Paulo Guedes, que segue bradando por mais “reformas”, dá sinais claros de desgaste e mesmo as respostas dos líderes da centro-direita, representados pelos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, faz supor um aumento do isolamento político de Bolsonaro e sua agenda ultraliberal de desmonte do Estado. Surpreendentemente, vários líderes do golpismo passaram a defender maior investimento do Estado e fortalecimento do SUS, contrariando o discurso do ministro da economia. É um recuo importante que demonstra que as “verdades” do neoliberalismo estão ruindo. No debate público abre-se, portanto, um enorme espaço para a defesa de medidas como aquelas apresentadas pela bancada do PSOL essa semana e para uma luta de longo curso em favor dos serviços e ativos públicos, que prevê proteção aos mais vulneráveis, garantia de uma renda mínima emergencial de um salário-mínimo, revogação da Emenda Constitucional 95, liberação dos 3 milhões de benefícios sociais represados (Bolsa-Família e INSS), controle dos planos de saúde privados, dentre outras. É hora de varrer a agenda neoliberal em primeiro lugar, para salvar vidas. Quarenta anos de pregação pró-mercado se desmancham no ar. Neste momento, o centro de nossa batalha é a defesa dos instrumentos de proteção social.
8. Esse conjunto de fatores novos na conjuntura está acelerando o desgaste do governo Bolsonaro. Os “panelaços” ocorridos nos últimos dias, muitos deles em bairros de classe média que votaram contra a centro-esquerda em 2018 e participaram de manifestações para destituir Dilma Rousseff, mostram um gradual descolamento de parte de sua base social. A recente pesquisa da Atlas publicada essa semana já mostra um clima de pessimismo com a economia e a vida nos próximos meses, críticas contundentes à condução da crise por parte do governo e desgaste da imagem pessoal do presidente. Mas ainda mostra 26% de apoio ao governo. Aparentemente a crise radicalizou os contrários e sensibilizou os que avaliam como “regular” a gestão de Bolsonaro, tornando mais evidente que o presidente não está a altura da crise que precisa administrar e age de forma irresponsável. Esse deslocamento de setores sociais é fundamental para fazer avançar uma superação da crise.
9. Diante desse quadro torna-se necessário galvanizar esse crescente sentimento de insatisfação em demandas por mais SUS, mais recursos para os serviços públicos e mais medidas antirecessivas por parte do Estado. No plano da política, devemos completar essas exigências com a palavra de ordem “Fora Bolsonaro e Mourão” ao mesmo tempo em que acumulamos nas instâncias partidárias e junto aos demais setores da oposição uma saída política mais geral. A unidade de tais setores é essencial para a continuidade e ampliação de nossa luta. Por ora, podemos afirmar com convicção que Bolsonaro cometeu reiterados crimes de responsabilidade (base jurídica para o impeachment) e também crimes eleitorais, como argumenta ação apoiada pelo PSOL que tramita no TSE (o que poderia ensejar a cassação da chapa Bolsonaro/Mourão e a convocação de novas eleições).
10. É necessário tirar as lições dos impactos dessa pandemia na vida e na sociedade. Mais do que nunca, a emergência de um novo modelo de desenvolvimento baseado numa transição ecológica, numa convivência e defesa da natureza, uma superação da austeridade econômica, priorizando a vida e não o lucro, se impõe. A prioridade do PSOL, portanto, é dupla: defender medidas que impeçam que mais pessoas morram e sofram com a pandemia de coronavírus e com a crise econômica e, ao mesmo tempo, aumentar o isolamento do governo, demonstrando sua completa incapacidade de gerir uma crise sem precedentes. Enquanto desenvolvemos essas grandiosas tarefas devemos monitorar e construir junto com os movimentos sociais e partidos de esquerda as condições para soluções que encurtem a permanência de Bolsonaro no poder. Ao invés da inócua disputa de protagonismo, é hora de construir as condições de unidade para incidir numa solução democrática e que seja de interesse das maiorias sociais.
Executiva Nacional do PSOL
20 de março de 2020