Com questionamentos da direita e manifestações da esquerda, a nova primeira-ministra sofre uma rápida queda de popularidade.
Por Renzo Fabb
Reprodução/Twitter Greenpeace UK – 5.out.2022 Manifestantes do Greenpeace seguram cartaz com a frase “Quem votou nisso?”; elas interromperam discurso da premiê do Reino Unido, Liz Truss, na conferência do Partido Conservador…
O sentimento de unidade nacional da Grã-Bretanha após a morte da rainha Isabel II parece ter sido de curta duração. Decorrido apenas um mês após tomar posse como primeira-ministra, a crise política marca o recente governo de Liz Truss.
Com questionamentos pela esquerda e pela direita, a nova primeira-ministra conservadora está sofrendo um rápido declínio em popularidade.
No sábado passado, milhares de britânicos saíram às ruas em dezenas de cidades para protestar contra o aumento do custo de vida e a queda dos salários. O capital financeiro, por sua vez, mergulhou o valor da libra para os níveis de 2009 depois que Truss anunciou um megapacote de endividamento. Que segundo estimam os especialistas, irá superaquecer a inflação. O Banco da Inglaterra teve que fazer uma intervenção de urgência para estabilizar a situação financeira.
Embora Truss tenha anunciado o congelamento das tarifas de energia, a crescente inflação (10% ao ano) e a queda real dos salários, enquanto o governo pretendia reduzir os impostos para os mais ricos, desencadeou o descontentamento.
No sábado, diferentes organizações civis, sindicais e políticas se mobilizaram em todo o Reino Unido para protestar contra o aumento do custo de vida. Uma dessas organizações é chamada Don’t Pay UK. Ela surgiu através das mídias sociais há algumas semanas e já conta com 200.000 seguidores. Seu objetivo é conseguir que um milhão de pessoas se comprometam a não pagar suas contas de gás e eletricidade a partir de outubro. “Se alcançarmos essa massa crítica, as empresas serão forçadas a recuar e não nos repassar a fatura enquanto estão obtendo bilhões de lucros com o consentimento deste governo“, disse um membro da organização à AFP.
Os protestos se espalharam por mais de 50 cidades no sábado, incluindo Londres, Liverpool, Manchester, Glasgow, Brighton e Nottingham, entre outras. No total, estima-se que 100.000 pessoas se mobilizaram em todo o país.
“Enough is Enough” («Já basta») é o nome de uma outra campanha que chamou a mobilização no sábado passado, impulsionada por um grupo de sindicatos. “Apoiem as greves”, “Congelem os preços, não as pessoas” ou “Impostos para os ricos” era o que se via nos cartazes dos manifestantes durante o último fim de semana.
Entre os sindicatos, destacam-se o RTM, os maquinistas e os trabalhadores ferroviários, que há vários meses vêm protagonizando uma série de greves maciças contra a perda do poder de compra de seus salários devido à inflação. Nesta quarta-feira, os trabalhadores ferroviários estão de volta à greve.
Questionamento pela esquerda e pela direita
Embora a agitação social pela situação econômica tenha irrompido durante o “verão do descontentamento”, ainda sob a administração de Boris Johnson, as primeiras medidas anunciadas pelo governo Truss só pioraram a situação. Ao anunciar um congelamento tarifário, a flamante premiê anunciou um ultrajante rebaixamento tributário para os mais ricos e uma série de desregulamentações financeiras que beneficiarão amplamente os bancos e reduzirão os impostos sobre as empresas.
Enquanto isso, o governo também anunciou um pacote de endividamento de 65 bilhões de libras esterlinas com o objetivo de “acabar com a instabilidade financeira“. O resultado foi o oposto: os mercados financeiros fizeram afundar o valor da libra, com receio de um aumento do déficit fiscal devido à combinação de congelamento de tarifas e cortes de impostos, juntamente com um superaquecimento da inflação devido à injeção dessa massa de dinheiro da dívida em um cenário de aumento de preços.
A crise foi tal que o Banco da Inglaterra teve que intervir no mercado financeiro, e Truss finalmente anunciou um recuo em seu plano de reduzir os impostos para os mais ricos. Os questionamentos vieram não apenas da classe trabalhadora, mas também do Partido Conservador, que celebra a sua Conferência Nacional desde domingo até esta quarta-feira, dia 5.
Dita conferência, se supunha, deveria ter um ambiente festivo por causa do novo governo, mas se transformou em uma espécie de comitê de crise dos conservadores. Poucas cenas seriam mais ilustrativas da situação política atual no Reino Unido do que aquela que poderá se desenrolar hoje, quando a greve dos trabalhadores ferroviários coincidir com o discurso programado da Primeiro Ministra Truss na conferência conservadora.
Um preocupado deputado conservador de Lichfied disse no Twitter: “Todos os que conheço de fora das West Midlands vão sair da conferência amanhã [terça-feira] à noite por causa da greve dos trens na quarta-feira. Portanto, se o discurso da primeira-ministra não estiver cheio na quarta-feira de manhã, já sabes por quê“. A flamante primeira-ministra pode marcar um mês no governo fazendo um discurso em frente a um salão vazio na conferência do seu próprio partido, com um país paralisado pela greve ferroviária do lado de fora. (NT.: o salão estava bastante povoado)
Tradução de José Roberto Silva do original em https://izquierdaweb.com/reino-unido-movilizaciones-y-crisis-politica-a-solo-un-mes-de-la-asuncion-de-liz-truss/