A venda da Embraer e a aprovação do Decreto Legislativo que permitirá o uso comercial do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA) aos Estados Unidos ( EUA), dentre outras medidas, é um salto importante na política entreguista do governo Bolsonaro
ROSI SANTOS
O Centro de Alcântara é a segunda e mais importante base de lançamento de foguetes e satélites da Força Aérea Brasileira. Devido à proximidade com a linha do equador, a base sempre foi assediada por vários países, principalmente pelos EUA. Sua localização privilegiada permite um consumo 30% menor de combustível em lançamentos, comparado a bases localizadas em latitudes maiores do hemisfério norte.
Sua posição estratégica, clima estável e uma área de baixa densidade demográfica torna a base, de acordo com especialistas, uma das melhores janelas para o espaço do planeta. No âmbito do mercado de missões espaciais, Alcântara pretendia se tornar a única desse nível a concorrer com o Centro Espacial de Kourou, da Guiana Francesa.
Entre as diversas imposições dos EUA para efetivar o acordo, está a exigência que o dinheiro vindo da transação não seja usado para o desenvolvimento do nosso programa espacial, no que pese a compra ou fabricação de mísseis. Além disso, não teremos acesso ou conhecimento do tipo de tecnologia que será usado pelo programa norte-americano, sendo, inclusive, o nosso acesso negado a vários setores da base.
É bem verdade que o Programa Espacial Brasileiro (PEB) vem acumulando em seguidos governos anos de atraso em seu desenvolvimento. Porém, ao alugar a base para utilização estrangeira, principalmente nesses termos negociados, tão desfavoráveis, retarda ainda mais o objetivo de fortalecer esse tipo de tecnologia no país, e ao abrir sem reservas o território nacional debilita militarmente o Brasil frente aos Estados Unidos.[1]
O acordo beneficia imensamente aos EUA, pois a Alcântara, no Nordeste brasileiro, “está” em frente à África Ocidental e dá acesso direto ao Atlântico. Além da economia de custos, a base permite lançamentos em linha reta, ou seja, com maior velocidade e potência para foguetes e mísseis na região. Uma atividade que representará uma séria ameaça política e militar para a América do Sul e para a África.
Esse é um sério problema de segurança e de estratégia política em um contexto de acirramento da competição geopolítica internacional entre EUA, China e Rússia. Essa perda de autonomia do Brasil no desenvolvimento de tecnologias do seu espaço aéreo que seriam de interesse nacional, agrava-se ainda mais com a venda da Embraer para Boeing – efetivada também no governo Bolsonaro -, uma vez que a multinacional é fortemente integrada ao programa espacial estadunidense.
No caso da Embraer – estatal extremamente competitiva no mercado de jatos aéreos -, nem mesmo a produção no Brasil de tecnologias acessórias, de apoio e suporte de baixa complexidade produtiva para jatos, foi garantida. Devido ao contrato ultra desfavorável para o Brasil, há alguns dias, a nova composição da Embraer anunciou férias coletivas para todos os trabalhadores que atuam nas unidades instaladas no Brasil e que pretende iniciar a transição do comando da empresa e produção exclusivamente nos EUA.
A venda pode significar não apenas falência desse mercado no país, como também o desemprego de centenas de trabalhadores. Dessa maneira, nos dois casos, o Brasil esvazia um mercado de tecnologia e ocupa uma posição submissa, tal qual a ocupada por Bolsonaro diante de Trump. Por isso, a esquerda deve incluir mais fortemente a exigência da manutenção da autodeterminação do Brasil e do seu desenvolvimento tecnológico e produtivo de maneira soberana.
A política de entrega de empresas, tecnologias, mercado e circulação, em razão de uma colaboração com uma potência imperialista como os EUA é inaceitável, pois rifa todas as possibilidades de retomada do crescimento a longo prazo.
Basta de entreguismo!
Fora Bolsonaro e sua política neoliberal!
[1] Os Estados Unidos, de potencia em aeronaves, navios de superfície e submarinos nucleares possuem, atualmente, mais de 800 bases militares presentes em todos os continentes, a maioria construída após a Segunda Guerra Mundial.