Enfrentar os desafios de 2018*

Enfrentar os desafios de 2018*

SARA VIEIRA, pré-candidata a Deputada Estadual pelo PSOL

Bom, companheiros (as), quero aproveitar essa fala para declarar minha pré-candidatura a Deputada Estadual pelo PSOL. Tarefa que assumo para contribuir com a construção do partido na cidade e na região, de um movimento amplo de mulheres e de um programa anticapitalista que atenda às necessidades dos trabalhadores, da juventude, das mulheres e dos oprimidos de forma geral. Feito esse primeiro anúncio, vou dividir minha fala em três pontos: avaliação da situação política pós-impeachment; nova conjuntura aberta com a execução de Marielle Franco e propostas de intervenção e organização da militância em São Bernardo.

Desde o impeachment de Dilma Rousseff, quando o pacto social lulista se quebra definitivamente, vivemos a intensificação dos ataques neoliberais e do avanço da pauta regressiva no campo da economia, da política e dos direitos sociais. Mas para fazer essa análise de forma minimamente concreta não podemos nos furtar em dizer que essa ofensiva reacionária não começou no dia seguinte ao impeachment, pois Dilma e a burocracia lulista também tem responsabilidade sobre o processo no qual vivemos desde então.

Não podemos deixar de considerar que o governo Dilma tomou várias medidas contra os trabalhadores, cortou verbas para os serviços públicos, restringiu o direito a benefícios, como auxílio desemprego e auxílio doença e aprovou a “lei antiterrorismo”. Além disso, começou no gabinete do então ministro do planejamento de Dilma a elaboração da PEC do teto dos gastos, chamada depois de “PEC do fim do mundo”. Porém, não podemos desconsiderar, como fazem alguns partidos/correntes, que houve um corte político, uma ruptura importante entre o governo Dilma e o governo Michel Temer, pois o pós-impeachment encetou uma situação política caracterizada por uma correlação de forças abertamente desfavorável para os trabalhadores.

Nesse processo, a classe dominante substituiu um governo burguês de colaboração de classes (Dilma) que traiu suas promessas eleitorais e perdeu o apoio das massas, por um governo ilegítimo e burguês “sangue puro” (Temer), abertamente neoliberal e entreguista ao imperialismo, e isso não foi à toa. Mas porque tinha o objetivo de estabelecer um padrão de exploração da classe trabalhadora muito mais intenso, de retroceder em relação às garantias da Constituinte de 1888 e de impor um ambiente de “pacificação” política de forma que os de baixo não pudessem resistir ou reverter as “reformas” regressivas que queria impor.

O governo Temer transformou o legislativo federal em um sórdido balcão de negócios para atacar direitos históricos dos trabalhadores. Para tal vendeu direitos aprovando a PEC do “fim do mundo” e a reforma trabalhista, duas contrarreformas que significam duríssimos golpes contra a nossa classe. No entanto, os ataques não foram apenas econômicos. Estão ocorrendo em todos os campos. Exemplo do que estou dizendo foi a política de criar condições para que os parlamentares mais conservadores aprovassem em uma tal “Comissão Especial” a PEC 181 que tem por objetivo criminalizar o aborto.

A força desse governo não vem apenas do apoio unânime da classe dominante às medidas regressivas, também se apoia nas traições e manobras da burocracia sindical e política. Sem esse apoio, certamente, Temer já teria caído. O vergonhoso boicote às lutas no ano passado, quando as grandes centrais sindicais (principalmente a CUT) e o PT desmobilizaram a greve geral como moeda de troca para a manutenção do imposto sindical obrigatório, deram a este governo ilegítimo fôlego para continuar atacando.

Processo que permitiu a aprovação da “reforma trabalhista” e da “reforma política”, essa última impôs a cláusula de barreira com a qual teremos que nos enfrentar nas próximas eleições de outubro. Então, essa combinação de fatores, somado à fragilidade organizativa do campo independente dos patrões e dos governos, foi o que possibilitou o avanço desses terríveis ataques contra os trabalhadores.

Temer aposta no autoritarismo

Companheiros, não nos enganemos com o governo Temer… Apesar de ter uma baixíssima popularidade – gira em torno a 7%, a menor da história – conta com o total apoio da classe dominante para impor as suas contrarreformas. No entanto, apesar de ter avançado em suas contrarreformas, o governo foi obrigado a gastar seu capital político evitando que no Congresso as denúncias de corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha fossem avante.

O cenário de baixa popularidade do governo e de crescimento do descontentamento popular fez Temer e seus aliados no Congresso chegarem à conclusão de que não se poderia votar a “reforma da previdência” sem que um mortal desgaste fosse comprado pelos deputados em um ano eleitoral… Conjuntura essa que fez o governo recuar momentaneamente na “reforma da previdência” e substituir essa pauta reacionária por outra medida não menos reacionária: a intervenção militar federal no Rio de Janeiro.

Esse recuo tático do governo demonstra que, apesar dos terríveis ataques que sofremos e de estarmos em uma situação política conservadora, não sofremos nenhuma derrota histórica e a polarização social aberta em 2013 de alguma forma se mantem presente. Assim, apesar dos ataques reacionários impetrados pelo governo e das traições da burocracia, os trabalhadores têm resistido e demonstrado nas ruas que é possível reverter essa correlação de forças desfavorável que vivemos.

Para esse governo a única forma de se sustentar a partir da derrota da proposta de “reforma da previdência” seria mudar o foco político para uma medida não menos regressiva. Isso porque Temer como governo ilegítimo só tem o apoio da classe dominante se capaz for de seguir fazendo o serviço sujo, atacando as conquistas históricas dos trabalhadores, impondo condições de vida e de trabalho cada vez piores…Assim, no lugar dessa contrarreforma, Temer apresentou a intervenção militar federal no Rio de Janeiro como “tábua de salvação” do seu mandato.

Todos aqui sabem que essa é uma medida muito perigosa para a frágil democracia burguesa do Brasil. Democracia com “d” minúsculo que tem dívidas históricas – reforma agrária, urbana, educacional, tributária, direitos contraceptivos, fim da polícia militar e etc. – com os trabalhadores e que só serão sanadas a partir de um intenso processo de mobilização realizado pelos de baixo.

Desta forma, Temer continua apostando na estratégia reacionária, no autoritarismo e na repressão. Mas como todo governo burguês, assume medidas que apenas tocam a superfície dos problemas. Nós apostamos em uma saída antagônica a de Temer, ou seja: queremos solucionar os profundos problemas da segurança a partir do combate à desigualdade social, da realização das reformas democratizantes e do fim do proibicionismo em relação às drogas.  

Execução de Marielle abre nova conjuntura de polarização política

Essa conjuntura de recuo da “reforma da previdência”, intervenção militar no Rio e forte repressão à população pobre culminou com a execução política da nossa companheira Marielle.

Para abrir um parêntese. Como militantes do partido, mesmo sem conhecer pessoalmente Marielle e Anderson sentimos suas mortes de forma muito pessoal…A execução dessa jovem mulher, talentosa, corajosa, radical e com toda a vida pela frente nos causou uma imensa dor. Mas por outro lado, a história de Marielle nos enche de orgulho e só serve para fortalecer ainda mais nossa convicção de que temos que lutar à morte contra esse sistema de exploração e opressão. E para isso o PSOL lentamente está se transformando em uma ferramenta fundamental.

Voltando a conjuntura política, Marielle sempre foi uma crítica ferrenha do governo ilegítimo de Temer, de suas medidas reacionárias e se colocou contra a intervenção militar no Rio desde o início. Além disso, há apenas alguns dias antes de sua execução, denunciou o abuso policial e o assassinato de jovens em Acari por policiais do 41º batalhão de polícia do Rio de Janeiro.

O assassinato de uma parlamentar eleita por mais de 45 mil votos, defensora dos direitos das mulheres, dos negros, dos favelados e dos homossexuais simboliza o conjunto dos ataques contra o povo trabalhador, contra os oprimidos e contra a esquerda independente. Daí a comoção internacional que a sua morte gerou. E, por outro lado, demonstra que a resistência que tem sido feita de maneira fragmentada, desarticulada e molecular em todo o país pode transbordar e fugir ao controle exercido pela burocracia política e sindical e ganhar massivamente as ruas.

Por isso, nos dias que se seguiram à execução foram marcados por manifestações que reuniram milhares de pessoas no Rio e em outras cidades do Brasil e do mundo. Em nossa opinião a partir daí foi aberta uma nova conjuntura política que não muda totalmente a correlação de forças, mas as ruas voltaram a ser ocupadas pelas massas e a política intervenção militar como solução para os problemas de segurança passa as ser questionada.

Construir uma alternativa de massas ao lulismo

Marielle e sua luta personifica a luta das mulheres hoje – tanto no Brasil como em todo o mundo – é um catalisador de todas as outras lutas sociais: por moradia, trabalho, direitos e etc. Mas é importante que fique evidente que Marielle tinha em seu argumento político um recorte de classe, na qual gênero, raça e sexualidade compunham uma totalidade indissolúvel.

A luta das mulheres tem sido uma poderosa força política não apenas no Brasil. Em todo o mundo tem se levantado e colocado à frente de várias lutas imprescindíveis para a resistência da classe trabalhadora, dos jovens e dos oprimidos. Assim, o movimento de mulheres tem sido o ponto de intersecção das lutas sociais e da organização de diversos setores da população. 

Pelo papel decisivo que continua cumprindo a classe operária para as lutas imediatas e históricas, temos que construir um partido e organizações sindicais que disputem a sua direção com a CUT e o PT. Mas não podemos desconsiderar que hoje é o movimento de mulheres e os movimentos populares que estão na vanguarda da luta política.

Nesse sentido, é acertada a escolha do PSOL pela candidatura de Boulos/Guajajara, pois é uma chapa que desempenha um importante papel tático – com grande força estratégica – dentro da construção de uma alternativa ao lulismo.

São eles representantes de lutas que combinam demandas de todos os setores da classe trabalhadora. Além disso, é uma chapa que coloca como condição política não realizar nenhuma aliança com os nossos inimigos de classe, um programa que parte da suspensão de todas as contrarreformas do governo Temer e se encaminha para a democratização radical do país como única saída possível para a solução dos nossos problemas.

Embora tenhamos algumas críticas em relação ao método da definição do nome Boulos como candidato, a consideramos extremamente acertada porque pensamos que ela materializa uma frente de esquerda independente e que será capaz de fazer o enfrentamento com a direita reacionária no plano eleitoral. Para tanto, é necessário que a falta de discussão com a base na escolha dessa candidatura seja corrigida mobilizando para o debate programático o conjunto da militância.

Evidentemente não podemos resolver nenhum problema sem medidas anticapitalistas, tema esse que precisa ser discutido com todos companheiros do partido, tanto em âmbito local como nacional. Nesse sentido, um plano de governo de esquerda no campo da segurança deve ter parâmetros políticos contrários à intervenção militar, ao genocídio da juventude negra, à polícia militar e às políticas proibicionistas em relação as drogas.

Esse plano tem que defender abertamente o arquivamento da PEC 181, o direito ao aborto legal, seguro e gratuito e realizado nos hospitais públicos, o fim do feminicídio, a igualdade salarial e o direito a educação universal e gratuita em todos os níveis. Um plano em que a sustentabilidade não se reduza à questão do manejo dos resíduos, mas questione a apropriação capitalista da natureza e desastres provocados pelos patrões e sua ganância, como o de Mariana, não podem ficar impunes. Além disso, coloca-se do ponto de vista programático a necessidade de lutar por reformas fundamentais e sob controle do povo trabalhador. Reformas que têm sido vetadas pelos distintos governos, mesmos os petistas, tais como: reforma agrária, urbana e tributária.

Tarefas políticas para essa conjuntura

Do ponto de vista das tarefas mais imediatas é necessário mover todas as nossas forças e uma forte campanha em âmbito regional para que a execução de Marielle e Anderson não seja esquecida e que os assassinos não fiquem impunes.  Por isso temos que exigir que a CUT e o PT construam em unidade de ação com todos os setores, atos e atividades para exigir que os mandantes e executores sejam punidos e a suspensão da intervenção militar federal no Rio de Janeiro.

O processo pré-eleitoral coloca de forma imperativa a necessidade de construção programática local e nacional na qual a base de nossa militância tenha espaço de fala e contribua de fato para a construção do programa dos nossos candidatos. O tema da segurança está em voga e nos atinge cotidianamente. Precisamos abrir um debate programático sobre o tema em São Bernardo do Campo e na região com a perspectiva do fim do proibicionismo, do genocídio da juventude negra e da polícia militar.

Em memória de Marielle e de outros (as) que tombaram na luta, acredito que esse encontro irá servir para que o PSOL siga em frente e se fortaleça como partido anticapitalista e de combate nas lutas e nas eleições. E que nossa organização de base, nossas lutas, nossos atuais e futuros mandatos estejam a serviço dos interesses dos trabalhadores e do fortalecimento da luta rumo à sociedade socialista!

 

*Fala no Encontro Municipal de São Bernardo, atividade que realizou-se no dia 24/03/18.