Retomar a luta nas ruas contra Temer e suas contrarreformas
ANTONIO SOLER, 13/08/2017
Após a rejeição na Câmara dos Deputados da denúncia de corrupção passiva contra Temer, apresentada pela Procuradoria Geral da República (PGR), o governo se fortalece para avançar com suas medidas regressivas, mas a classe trabalhadora e a juventude combativa não estão derrotadas, o que coloca para o segundo semestre possibilidades de uma nova retomada da polarização política nas ruas.
Governo blindado pelo apodrecido sistema politico
Mesmo pesando sobre Temer fortes evidências de que está no centro de sórdidos esquemas de corrupção, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro durante o exercício da Presidência da República – fora a participação em outros esquemas durante os seus dois mandatos como vice-presidente e durante outros cargos que exerceu -, a denúncia oferecida pela PGR foi rejeitada pela Câmara dos Deputados.[1]
Temer obteve essa vitória tática porque a maior parte desse congresso foi eleita com dinheiro originado nos esquemas de caixa dois, propina e favorecimento das grandes empresas. Ou seja, estão envolvidos nos mesmos sórdidos esquemas de Temer, por isso o seu afastamento alimentaria o processo investigatório que poderia chegar a estes mesmos representantes burgueses corruptos. Então, trata-se de uma decisão que obedece à lógica mafiosa na qual os comparsas procuram proteger-se a qualquer custo de investigações e possíveis penalidades.
No entanto, a questão vai além disso, esses deputados financiados, legal e ilegalmente, pelos grandes empresários, representam de maneira fiel os interesses materiais da classe dominante. E, apesar desta estar dividida em relação a viabilidade de manter Temer à frente do governo federal, a maioria dela prefere a permanência do governo, pois um afastamento poderia colocar uma conjuntura política ainda mais instável, o reaquecimento do movimento por eleições diretas e da luta contra as “reformas”.
Desta forma, os representantes do grande capital, mesmo comprando um tremendo desgaste político com a rejeição do pedido julgamento contra Temer, preferem, por enquanto, dar sustentação ao governo. Porém, novas denúncias estão sendo preparadas pela PGR, novos fatos podem surgir contra Temer e, além do mais, não está descartado que o movimento de massas no segundo semestre jogar novamente um papel importante no desfecho da crise política.
Contrarreformas econômicas e politicas
Como parte da ofensiva total contra a classe trabalhadora, tramita no Congresso Nacional a proposta que institui o voto distrital, a cláusula de barreira e o financiamento público de campanha.
Com o voto distrital simples – chamado “Distritão’ – teria fim o voto proporcional. São estes os votos de legenda que permite aos partidos operários (PSOL e outros), mesmo em condições extremamente desiguais de disputa eleitoral com os partidos burgueses, eleger representantes. Passando essa proposta, estes votos não serão mais computados.
Com a cláusula de barreira, os partidos que não atingirem determinado percentual de votos perdem tempo de TV, financiamento público e legalidade. Com o fundo eleitoral, inicialmente R$ 3,6 bilhões – além do fundo partidário já existente – as candidaturas e os partidos que representam os interesses da ínfima minora da sociedade terão ainda mais acesso às verbas públicas.
Como podemos ver, essa contrarreforma política tem por objetivo impedir a representação no parlamento dos legítimos representantes dos trabalhadores, colocá-los na marginalidade, proteger e reeleger os políticos burgueses envolvidos nos esquemas de corrupção, alijando ainda mais as massas das decisões políticas.
Porém, a continuidade das contrarreformas não fica apenas no âmbito da representação política. Governo, Congresso e classe dominante, após a rejeição da denúncia da PGR contra Temer, assanham-se para retomar a discussão e a tramitação da “reforma da previdência” no Congresso.
Reforma essa que, somada a emenda constitucional que impôs o congelamento por 20 anos nos gastos primários[2] e o projeto de lei que fez retroceder historicamente a legislação trabalhista, acaba de constituir o tripé das contrarreformas econômico-sociais deste governo.
Essas, somadas às “reformas políticas” em curso, significarão de conjunto, se efetivadas forem, um retrocesso nas condições sócio-políticas dos trabalhadores e dos oprimidos.
Pior ainda seria que fossem aprovadas sem que a classe trabalhadora resista à altura a esses ataques, pois derrotas sem luta têm efeitos ainda mais nefasto, pois tendem a ser mais profundas materialmente e mais duradouras na consciência das massas.
Frente de Esquerda Socialista para lutar e combater hegemonia lulista
É importante que se diga que o avanço das contrarreformas não se deve a passividade das massas trabalhadoras, da juventude ou dos oprimidos. Pois vários eventos de resistência à ofensiva reacionária marcaram o primeiro semestre, setores importantes da classe trabalhadora foram às ruas em atos, passeatas, greves, ocupações e outras formas de luta, mas as manobras da burocracia acabaram por arrefecer as lutas.[3]
Os trabalhadores e a juventude não estão derrotados e tendem a retomar a resistência, apesar das manobras da burocracia sindical. No segundo semestre, além de contarmos com a crescente indignação às contrarreformas, categorias nacionais de peso entrarão em campanha salarial, podendo assim ser um ponto de apoio da luta contra o governo.
As campanhas das categorias nacionais e dos pesos pesados da classe trabalhadora são parte do calendário sindical nacional e já causaram comoções políticas em outros momentos.
Agora estas campanhas precisam ser encaradas pelos trabalhadores como um ponto de apoio importante contra a ofensiva reacionária, uma ponte para que retomemos a luta geral pelo contra Temer, contra suas “reformas” e pela construção de uma alternativa política de massas ao lulismo. Assim, propor a unificação de assembleias, jornadas de lutas e greves, por exemplo, pode ser uma tática fundamental para retomar massivamente o caminho na mobilização direta contra Temer.
Não podemos fugir ao fato de que as maiores categorias e o movimento de massas ainda são dirigidos majoritariamente pela burocracia. Por isso, não podemos prescindir da mais ampla unidade para combater as políticas do governo.
É necessário exigir de maneira enfática e sistemática que os aparatos convoquem a resistência contra Temer e suas políticas reacionárias, e quando não o fizerem, é necessária a denúncia não menos contumaz. Mas, para que nossa tática de exigências e denúncias seja efetiva e possamos através delas disputar a hegemonia do movimento de massas, é necessário que as organizações sindicais, populares e partidárias independentes construam fóruns que combatam a dispersão em que se encontra a esquerda socialista.
Estamos falando de uma tática de Frente de Esquerda que sirva para intervirmos de forma contundente no movimento de massas, para que as táticas de exigência e denúncia atinjam setores mais amplos e desmascarem a burocracia.
Porém, não podemos nos restringir a luta imediata, precisamos construir uma saída global para a crise estrutural e um programa alternativo ao lulismo que faliu enquanto projeto político alternativo ao da classe dominante.
Também não podemos nos furtar ao debate eleitoral, precisamos construir uma plataforma comum da esquerda socialista e nomes que possam representá-la nas eleições, pois a burocracia já está com Lula presidente para 2018 com tudo na rua e a burguesia trabalha com dois ou três nomes e aguarda uma definição mais clara em relação a quem fica de pé após o fim da Operação Lava Jato.
Exatamente pela condição estrutural da realidade brasileira, ou seja, a de que o movimento de massas é dirigido amplamente por uma burocracia traidora, é que não podemos prescindir da mais ampla unidade entre as organizações sindicais, populares e politicas independentes dos patrões e do governo.
Unidade essa que não pode ocorrer de forma episódica, tem que se dar através de fóruns mais estruturais, frentes políticas e de luta que sirvam para intervirmos de forma eficiente no movimento de massas. Para que possamos, assim, fazer exigências e denúncias contra a burocracia e que, ao mesmo tempo, sirva para que a esquerda surja como alternativa política na luta e nas eleições ao lulismo.
O PSOL, por ser a maior organização política do campo da esquerda socialista, tem uma enorme responsabilidade na atual situação política nacional. Sua direção precisa imediatamente fazer todas as gestões no sentido de convocar as organizações da esquerda socialista para iniciar os debates programáticos da forma mais ampla possível e para construir essa Frente de Esquerda Socialista, apresentar sua plataforma política, seus candidatos e suas armas.
[1] Para que o presidente ilegítimo pudesse ser investigado haveria que ter ao menos 308 votos favoráveis a denúncia, o que representa 2/3 do total de votantes da Câmara dos Deputados.
[2] Com essa emenda constitucional foi estabelecido que por 20 anos as receitas primárias, aquelas receitas destinadas a saúde, educação e infraestrutura, deverão ser reajustadas apenas de acordo como a inflação do ano anterior. Ou seja, fica fora desse congelamento orçamentário pagamento de juros e amortizações da dívida pública, a desoneração fiscal de setores do grande empresariado e outras benesses ao grande capital.
[3] Exemplo cabal disso no primeiro semestre foram as manobras burocráticas em relação a preparação, data e realização da greve geral marcada para 30 de julho. No entanto, a burocracia (sindical e política) não para de ajudar o lado de lá. Na votação da admissibilidade da denúncia da PGR, o PT e demais partidos de oposição burguesa ao governo poderiam não ter garantido o quórum mínimo para a votação da denúncia, no entanto, preferiram dar condição regimental para que prosseguisse a votação, o resultado já sabemos. O que comprova que o posicionamento da burocracia lulista em relação às bandeiras de “Por nenhum direito a menos”, “Fora Temer” e “Eleições Diretas” não passa de marketing político para disputar as eleições de 2018, ou seja, nada tem a ver com disposição real de luta.