No dia 21 deste mês, em um evento em Brasília, foi lançado oficialmente o “Aliança pelo Brasil”. Essa não é apenas mais uma legenda de aluguel, como tantas outras no cenário nacional, mas sim uma novidade política real.
ANTONIO SOLER
Trata-se da construção de um partido neofascista idealizado e plasmado por Bolsonaro, sua família e assessores mais próximos que terá importante repercussão no cenário político. A nova legenda recebe o nome de Aliança pelo Brasil e contará em sua comissão provisória, além de Jair Bolsonaro na Presidência, os seus dois filhos na estrutura da legenda: o mais velho, senador Flávio Bolsonaro (RJ) será o primeiro vice-presidente e o caçula, Jair Renan, será o vogal do partido.
Para que a Aliança seja legalizada precisará contar com cerca de 500 mil assinaturas distribuída por 9 Estados. Se o TSE aprovar a possibilidade de contabilizar assinaturas digitais – o que está por se decidido na corte – como parte do processo de legalização é provável que dispute as eleições municipais de 2020, do contrário, terá apenas condição de disputar as eleições de 2022.
Bolsonaro foi eleito presidente em 2018 pelo PSL, o partido aproveitou a onda reacionária e teve um crescimento meteórico, passando de 1 deputado eleito em 2014 para 51 deputados em 2018, tornando-se assim segunda força política na Câmara dos Deputados.
Mas logo no começo do governo, com as denúncias de fraudes eleitorais feitas pelo PSL que desviou verbas do fundo partidário que deveriam ser destinadas para candidatas mulheres, Bolsonaro também está envolvido em uma série de fraudes, passou a atacar diretamente o partido, o que abriu uma crise de disputa da legenda que só se resolveu com a saída de Bolsonaro do PSL e o projeto de construir outro partido.
Esse é um partido a serviço dos ataques aos direitos democráticos que está sendo formado sob medida para apoiar um presidente e um movimento neofascista. Destruir garantias democráticas não é tarefa tão simples, é preciso estabelecer um ambiente político reacionário propício que contenha uma combinação de elementos.
Além do apoio de setores da classe dominante, do consentimento da burocracia e das alavancas do estado, é necessário um partido político à “altura” de tal projeto para organizar um movimento de rua violento que contribua para criar condições extraparlamentares necessárias para tal projeto.
Como toda ideologia neofascista, a Aliança aferra-se ao mito de identidade nacional. Para esse tipo de ideologia direitista extremada estaríamos todos irmanados em uma só tradição cultural, linguística e étnica. Ideologia que para se estabelecer precisa apagar as profundas desigualdades étnico-sociais brasileiras, assim qualquer expressão de diversidade política e de crítica a seus pressupostos é uma séria ameaça a ser combatida.
A construção do Aliança se faz em uma continuidade necessária, por assim dizer, à linha desenvolvida na campanha presidencial de Bolsonaro, e que tem como bandeiras principais a defesa do ultraliberalismo, do fundamentalismo religioso, do armamento de setores da classe média e do combate mortal ao feminismo, movimentos sociais e socialismo.
Os fundadores do Aliança colocam também como inimigo a ser enfrentado pelo “povo” o “estamento burocrático” e os “burocratas anônimos e não-eleitos”. Obviamente que isso não é para tornar o Estado mais capilar às necessidades técnicas, às inovações democráticas e à participação popular, mas sim uma clara alusão ao poder judiciário, às universidades, ao funcionalismo público em geral e a todos os setores que não são diretamente controlados pelo poder presidencial que possam se colocar de forma crítica a esse projeto de impor um regime assemelhado a uma autocracia.
Não é por acaso que o número da legenda do partido será 38 – o calibre de revolver mais conhecido no brasil. Essa escolha, além de atender à ideologia do extermínio de um setor da classe média imbecilizada como método de combate à criminalidade, tem por objetivo deixar claro que a solução das contradições sociais e políticas passa pela dura repressão dos movimentos, pelo bloqueio das liberdade de organização e luta e pela suspensão, ao menos parcial, da luta política de classes. Para isso, um partido neofascista é uma das condições necessárias, a Aliança tem essa missão.
Bolsonaro quer impor um semi estado de exceção preventivo. Como parte desse processo que iremos apontar mais detalhadamente em outra nota, ameaça enquadrar políticos que o atacam na Lei de Segurança Nacional – um fragmento deixado pela ditadura militar brasileira já em seu final – e do fechamento direto do regime diante da possibilidade de intensos protestos sociais, como os que estão ocorrendo no Chile.
No entanto, não são apenas de ameaças, Bolsonaro no mesmo dia em que lançou oficialmente o partido enviou ao congresso um projeto de lei para a Câmara dos Deputados que institui nas operações de Garantia de Lei e da Ordem (GLO) – quando as forças armadas são convocadas para ocupar a função de política – o excludente de ilicitude.
Este mecanismo tem o objeto de responsabilizar agentes de segurança (soldados e policiais) apenas quando o excesso for cometido de forma dolosa (intencional). Quando houver a repressão fizer vítimas fatais ou não e for alegado “forte pressão” ou “emoção” não haveria punição. Ou seja, esse é um projeto que se assemelha a uma licença para reprimir, lesionar e matar visto recentemente na Bolívia e em outros países em processo de rebelião popular.
Como se pode ver, a criação do neofascista Aliança não é um fato isolado, mas sim parte na ofensiva ultrarreacionária global em curso que tem por objetivo impor um endurecimento no regime que visa eliminar direitos democráticos fundamentais – principalmente a liberdade de organização e luta – e equipar o Estado com mecanismos de repressão e coerção ainda mais duros contra as lutas das massas por seus direitos, para isso, construir um partido de extrema direita com capacidade de ações “contundentes” de rua é fundamental.
A construção desse partido, então, estaria a serviço do objetivo de impor um semi estado de exceção preventivo à processos de rebelião popular em território brasileiro que estão sendo antevistos pelas forças da reação. Por essa razão, é necessária a mais ampla denúncia do papel que irá cumprir essa agremiação, bem como, a mais ampla unidade de ação entre todos os setores que defendem os diretos democráticos para organizar uma campanha contra o avanço de medidas antidemocráticas, tais com o projeto de lei do excludente de ilicitude da GLO.
Não podemos ficar inertes diante desse descalabro, é preciso que todas as iniciativas políticas, atos, manifestações, encontros, congressos etc. tomem a luta contra o ataque aos direitos democráticos que estão sendo seriamente ameaçados. É necessário unificar os atos em dias distintos que estão sendo convocados para a primeira semana de dezembro, pela CSP-Conlutas e pela Frente Povo Sem Medo, respectivamente.
Assim, além da necessidade de dar respostas comuns ao conjunto dos ataques econômicos, é preciso que a esquerda socialista incorpore na pauta de todas manifestações a luta contra o avanço dos ataques aos direitos democráticos, e também a exigência que todo o movimento social e os defensores dos direitos democráticos atuem de forma unificada nesse momento para repelir os ataques em curso feitos por esse presidente neofascista.