80 anos da fundação da Quarta Internacional

Prefácio

ROBERTO SÁENZ 

Ontem, 3 de setembro, se cumpriram 80 anos da Conferência fundadora da Quarta Internacional. Um grupo de revolucionários se reuniu na periferia de Paris para sancionar a formação de uma nova Internacional revolucionária. Perseguidos por todos os lados do globo, desde os grupos fascistas até a polícia secreta stalinista, passando pelas democracias capitalistas, deram-se a tarefa de dar continuidade ao marxismo revolucionário no meio da “noite negra” do século XX. Trotsky, exilado no México, não pôde participar do trabalho da conferência. Ele morreu apenas dois anos depois, mas seu trabalho fundamental já estava feito: a continuidade do marxismo revolucionário contra o pisoteamento da bota burocrática stalinista estava garantida. Apresentamos abaixo um texto de 2014. “Visão geral do movimento trotskista na segunda década do século XXI”.

 

Visão geral do movimento trotskista na segunda década do século XXI

Junho de 2014

A propósito de uma recente viajem a Europa

Estamos vivendo o início do século 21 com o capitalismo reinando como nunca sobre todo o globo. Por sua vez, uma séria crise nos afeta: ao movimento operário e revolucionário parece haver-se fechada toda a perspectiva (…) Acima de tudo, é um facto que desde os anos 30, as correntes socialistas revolucionárias e o trotskismo como parte delas, foram confinadas a uma marginalidade da qual não puderam superar de maneira duradoura. E, no entanto, o colapso do stalinismo na Europa do Leste – cataclisma histórico que levou à desordem de todos os tipos de relações sociais e políticas à escala mundial – significou o fim do seu jugo histórico sobre a classe trabalhadora e, que, finalmente, tem a possibilidade de reconstruir ou re-fundar-se sobre novas bases, socialistas e revolucionários (Aportar el relanzamiento de la batalla por el socialismo” , Roberto Sáenz. Documento votado na Conferência Nacional fundadora do Nuevo MAS, Dezembro de 1999).

A propósito de uma recente viagem à Europa, refletimos sobre o momento particular pelo qual o movimento trotskista internacional está passando. De fato, uma reflexão desse tipo me havia sido encarregada pelo recente encontro internacional de nossa corrente reealizada em fevereiro deste ano, no qual foi proposta a inserção da experiência construtiva concreta de Socialismo ou Barbárie. Esta é uma versão editada de um texto maior que é apenas para a nossa militância.

Os grandes “divisores de água” históricos

Comecemos por ressaltar que, a partir da experiência histórica acumulada, algumas das leis de construção de correntes internacionais revolucionárias podem ser identificadas. Todos conhecem a história das internacionais e como o trotskismo emergiu de sua heróica luta contra o stalinismo. Após a morte de Trotsky, seu movimento se dividiu em várias tendências internacionais, tendências que foram se renovando no calor dos processos da luta de classes internacional.

Em todo caso, a continuidade do socialismo revolucionário – como uma corrente política do movimento operário – estava assegurada. Como se sabe, a esta tarefa Trotsky a considerou a mais importante de sua vida. Uma tarefa que, sem ele, ninguém poderia ter assumido naquele momento histórico, no meio da “noite negra do século XX”, com o surgimento simultâneo do nazismo e do stalinismo.

Em todo caso, não estamos interessados em delinear uma análise “histórica” da Quarta Internacional e suas vicissitudes, mas estabelecer alguns parâmetros gerais sobre o que poderíamos identificar como a lógica do surgimento de diferentes correntes internacionais.

A primeira “lei” tem a ver com o fato de que a generalidade das tendências internacionais da classe trabalhadora sempre tendeu a emergir das grandes “divisores de água” da luta de classes mundial; divisores de águas que podem unir como dividir. É uma lei que esses “divisores de  águas históricos e universais” tem dado origem a divisões, uniões, reagrupamentos, fundações, etcétera.

Os casos dessa circunstância foram variados. Sua “mecânica” é que eles sempre ocorrem em torno de grandes feitos da luta de classes internacional. Marx concluiu que a tarefa histórica da Primeira Internacional tinha chegado ao fim e havia que dissolvê-la – para que não caisse nas mãos dos anarquistas – depois da derrota da Comuna de Paris em 1871. Lenin compreendeu a necessidade de fundar uma nova internacional depois que em 4 de agosto de 1914, a social-democracia alemã capitulou ao votar a favor dos créditos de guerra no Reichstag. A Terceira Internacional foi fundada em janeiro de 1919 no calor da Revolução Russa. Outro evento similar de magnitude histórica convenceu Trotsky que a Terceira Internacional estava morta e que havia que fundar a Quarta: a capitulação do stalinismo ao nazismo no início de 1933. Já na segunda pós guerra, o jovem  movimento trotskista se dividirá e/ou se unificará em torno de grandes eventos: a expropriação do capitalismo na Europa do Leste, o levante anti-stalinista em Berlim (1953), a revolução chinesa, a cubana, e assim por diante.

Parte do que temos apontado é o imenso divisor de águas que significou a queda do Muro de Berlim e seu impacto em todas as diversas correntes em que o movimento trotskista da época estava dividido (1). Em suma, produziu uma crise geral do mesmo como um subproduto de um processo que resultaria em grande parte imprevisto (pelo modo como aconteceu) e forçado a repensar as lições da luta de classes do século XX: “Sendo este imenso processo em muitos aspectos, diferente do que havíamos previsto e revelador de uma bancarrota catastrófica desses estados que consideramos operários, se colocou ante a Internacional [por referência, naquele momento, à antiga LIT] a obrigação de questionar-se sobre o curso histórico seguido pelos mesmos, e o porquê da chegada à sua situação atual“( Problemas del Estado soviético según la visión de Lenin , Roberto Sáenz, maio de 1993).

Assim, é evidente que um dos elementos de delimitação nas diferentes correntes do trotskismo e/ou tendências emergentes deste evento epocal foram as conclusões que se foram tirando – ou não – em torno da experiência de burocratização das revoluções do século XX, a atualização da teoria da revolução permanente em torno dos ensinamentos das revoluções do segundo pós-guerra e o aprendizado que essas experiências deixaram em matéria de enriquecimento do patrimônio do socialismo revolucionário, do trotskismo. Também a análise dos processos de rebelião popular iniciada com o novo século e a reafirmação no terreno do caráter insubstituível do partido revolucionário do tipo leninista à hora das tarefas propostas de refundação e recomposição da classe trabalhadora.

Retomando nosso argumento, notemos que esses acontecimentos ou eventos de época são os “pontos de Arquimedes” em torno do qual se define sempre o “redesenho” do panorama das correntes revolucionárias. E mais ainda quando o último grande evento universal foi um evento tão histórico como a queda do Muro de Berlim, que fechou uma experiência histórica como a substanciada por revoluções socialistas e/ou anti-capitalistas do século XX e colocou, estrategicamente, a abertura de outra nova: a refundação revolucionária do movimento operário e o renascimento da revolução socialista no novo século: “a hipótese sobre a qual repousa este teste é o pressuposto de que está em curso um processo de surgimento de uma nova classe trabalhadora em todo o mundo , mais amplo e complexo que o anterior, que se configura numa dialética de fragmentação, “exclusão”, mas também de crescente assalarização. O antigo movimento operário está em crise e agonia. Mas sobre o campo do surgimento de uma nova classe trabalhadora estão se desenvolvendo, embrionários, desiguais, mas valiosíssimos fenômenos de resistência e reorganização que pode começar a prenunciar uma recomposição global do movimento operário numa nova base” (Roberto Saenz e Hernán Camarero“La refundación del movimiento obrero. Apuntes desde una perspectiva socialista revolucionaria”, Agosto de 1998).

O acúmulo de experiências que a classe operária está vivendo globalmente está indo nessa perspectiva geral que traçavamos há quinze anos, e é o que assenta os fundamentos do novo período histórico no qual poderíamos estar entrando as correntes do socialismo revolucionário no que traz as nossas possibilidades de construção e projeção para setores mais amplos, a partir, em primeiro lugar, de fincar pé no processo global de surgimento de uma nova geração de trabalhadores.

Uma comunidade de perspectivas, projetos, militância y experiências construtivas

Nenhuma corrente internacional nasce “pronta”; Para além de estabelecer seus alicerces estratégicos, você precisa construí-la efetivamente. A menos que esteja se reagrupando com alguma corrente internacional preexistente, ou que por certas razões seja uma tendência dentro de uma organização maior, em geral o surgimento de novas correntes internacionais que geralmente assumem, primeiramente, formas nacionais, se caracterizam por uma infinita estreiteza organizativa. Pode-se dizer que eles são uma “comunidade” de perspectivas, projetos, militância e experiências construtivas, além de ser um âmbito de elaboração teórica e política coletiva.

Por isso, também, é preferível falar de “correntes internacionais” e não de “Internacionais” feitas e desfeitas quando nos referimos aos agrupamentos nos quais o trotskismo está dividido a nível internacional. E por um problema de proporções óbvias.

É que para ser uma “internacional” requer-se certas proporções em termos de número de militantes, relações com as classes trabalhadoras dos vários países em que está estabelecida, etc., que estão completamente fora do alcance das correntes revolucionárias atuais.

A realidade é que a generalidade das tendências do trotskismo desde o período do pós-guerra até os dias de hoje são, mlhor dito, correntes e nenhuma uma Internacional como tal; tendências onde o que deve comandar é o entendimento comum do programa e das tarefas que seus membros devem ter, os grupos que o constituem, e que produzem certas nuances de opinião e concepções em relação às outras tendências do movimento trotskista.

Será necessário o surgimento de um processo objetivo de radicalização de porções da vanguarda operária no terreno internacional (com base nos grandes feitos da luta de classes mundial), para que se possam dar passos no sentido de um salto da qualidade constituir-se em Internacional.

Nesse sentido, a IV Internacional sempre foi uma internacional mais no sentido de ser um polo político-programático e uma área de unidade na experiência de certos quadros e militantes globalmente falando, do que uma verdadeira Internacional do ponto de vista organizativo. Isso foi assim até mesmo em vida do próprio Trotsky, para além de que o grande revolucionário russo era uma figura de tal projeção internacional que dava outra dimensão às coisas.

É um desafio que, no entanto, está colocado no horizonte histórico (sob o caminho de uma refundação da IV com base nas lições do século passado), à medida que novas experiências da revolução socialista vão desencadeando-se neste novo século.

Se revisarmos – de maneira aleatória – a história das correntes do trotskismo no último meio século, veremos uma série de “regularidades”. Se tomarmos o SWP inglês (hoje afetado por uma série de crises), sabe-se que o “cliffismo” se separou da IV em 1949 a respeito da caracterização dos estados fundados pelo estalismo no Leste europeu. Sua definição de “capitalismo de estado” também não atingia o alvo: teve a séria consequência de ser “anti-defensista” (2). Em qualquer caso, esta corrente a partir desse momento começou a configurar-se sob o nome de International Socialist agrupando apenas um punhado de militantes na Inglaterra até a entrada da década de 1960. Com o Maio francês, e o ascenço que sobreveio a ele na própria Inglaterra, deram um salto alcançando um piso construtivo mais alto.

No caso do “Mandelismo”, esta foi uma tendência comum com o chamado “pablismo” ao longo dos anos 50 (3), e depois se separou deste no início dos anos 60. Na França, depois de uma longa experiência de entrismo nos PC´s e na juventude do PC surgiram (por ocasião do Maio francês) a Juventude Comunista Revolucionária e depois a Liga Comunista Revolucionária, uma organização que nos anos 70 passou a ter um importante dinamismo naquele país. O mandelismo “herdou” um conjunto de relações internacionais que vieram do tronco histórico da IV, tornando-se o centro do trotskismo internacional desde o final da Segunda Guerra Mundial, o que lhe outorgou bases muito distintas a seu desenvolvimento (daí, que até hoje eles são considerados na Europa como a “Quarta Internacional”).

No caso do “morenismo” é sabido que começa a atuar como uma corrente nacional desde 1943-6 na Argentina; que participa do II Congresso Mundial da IV em 1948, começando a partir daí a ter alguma atividade internacional independente, que por uma década mais começa a dar frutos a iniciativas regionais construtivas, e a partir dos anos 60 e da Revolução Cubana, se integra ao reagrupamento do chamado “Secretariado Unificado” em comum com o mandelismo. Nos anos 80 adquire sua própria fisionomia internacional com a velha LIT. Na década de 1980, tornou-se a corrente mais dinâmica do trotskismo internacional, apenas para entrar em seguida em uma espiral acelerada de crise e dissolução que a destruiu como tal em alguns anos (4).

Se tomarmos o caso do PO Argentino, este se funda como Política Operária desde 1964, tem uma confluência internacional com o POR boliviano e o “lambertismo” nos anos 1970, depois definha sua atividade internacional até o início dos anos 2000, onde participa da fundação de um reagrupamento com alguns grupos trotskistas europeus separados do mandelismo, colocando em prática uma entidade de frente muito fraca e de frente unica, e não uma verdadeira corrente internacional como tal. O PO nunca se destacou por um trabalho internacional consistente; no velho morenismo, caracterizava-se-o, corretamente, como um grupo “nacional trotskista”.

E os exemplos poderiam seguir até o “infinito” podendo estudar-se as diferentes experiências construtivas internacionais do movimento trotskista, seu escopo, limites e leis de regularidade. Leis que se têm uma “lei política” ligada aos grandes divisores de águas internacionais, também têm uma construtiva, relacionada com os longos períodos de acumulação – períodos “heróicos” na maior parte do tempo – até que se adquira sua fisionomia construtiva própria; até que seus grupos amadureçam como tais e permanecendo em um conjunto de países; até conseguirem acumular uma “massa crítica” que lhes permita ir para um escalão superior: estabelecer-se como verdadeiras correntes internacionais.

Trotsky resumia – em termos muito gerais – essa dinâmica: “Nenhuma ideia progressiva emergiu de uma 'base de massas', senão não seria progressiva. Só a longo prazo a ideia é ir ao encontro das massas, desde que, claro, corresponda às exigências do desenvolvimento social. Todos os grandes movimentos começaram como 'entulho' de movimentos anteriores (…) O grupo de Marx-Engels emergiu como um entulho da esquerda hegeliana (…) Se esses iniciadores foram capazes de criar-se numa base de massas, foi apenas porque eles não temeram ao isolamento Eles sabiam de antemão que a qualidade de suas idéias se transformaria em quantidade” (“Ensayo de interpretación del modernismo“, Luís Paredes, Socialismo ou Revista Barbarie nº 28).

Trotsky resume, assim, a mecânica do surgimento de qualquer nova corrente que conquiste o direito à sua existência histórica, e que deve ser sempre revolucionária à sua maneira, no sentido de percorrer um caminho de superação crítica de identidades e experiências estabelecidas que falharam em passar na prova dos acontecimentos

Isto tem, todavia, outra derivação, de muitíssima importância: sem um “centro político” da corrente, não há realmente corrente internacional. E a “reversa dialética” também é válida: não há corrente internacional sem que seus diferentes grupos nacionais adquiram um piso orgânico mínimo em seus respectivos países.

O trotskismo europeu e latinoamericano em perspectivas comparadas

Dito isto, naquilo que tem a ver com esses grandes momentos de crise e/ou reagrupamento, já assinalamos que o movimento trotskista viveu um grande divisor de águas em torno da queda do Muro de Berlim e da restauração do capitalismo na totalidade. dos países que não o eram. Esta é uma história conhecida.

Mas, talvez não tem sido uma questão de reflexão suficiente – ao contrário, é uma questão de controvérsia com tendências como o mandelismo que tendem a ver todo o panorama mundial com o sinal de “pessimismo histórico” (5) – o fato de que a partir da “Batalha de Seattle “em 1999 e o surgimento do” movimento anticapitalista” internacional, e ainda mais com o atual ciclo mundial de rebeliões populares, o que começou a acontecer – ainda que desigualmente – é um processo lento mas progressivo de recomposição das forças do trotskismo visto internacionalmente, de acumulação de experiências, é verdade que marcada, todavia, por contradições agudas.

É possível observar uma série de trajetórias diferentes ou mesmo opostas em certos casos. Enquanto na Argentina as correntes do trotskismo foram beneficiadas pelo surgimento da Argentinazo, na Europa elas se beneficiaram do surgimento do movimento anticapitalista e da renovação das experiências eleitorais da esquerda, que na primeira metade da década passada deram lugar para certo dinamismo e acumulação nas correntes trotskistas daquele continente, mas que hoje estão majoritariamente em crise.

Assim, uma crise simultânea é observada tanto no SU quanto no SWP inglês, embora não sem desigualdades dentro de seus vários grupos nacionais; assim, o SU permanece, em todo caso, a corrente internacional mais importante, agrupando o maior número de grupos nacionais, sendo até hoje caracterizada por uma certa delimitação política interna entre correntes diversas.

Na América Latina essa crise não ocorreu com grande vulto, ou melhor, aconteceu com certas correntes entre as mais oportunistas, como o MST argentino, que chegou a um ponto de virtual esvaziamento militante. Apesar da diversa acumulação relativa e do dinamismo diverso de cada uma das correntes latino-americanas, observa-se uma maior continuidade: aparecem em relativa ascensão, com otimismo e não marcadas pelo ceticismo dos europeus; embora também haja muitas diferenças de traços e características (6).

Isso pode ter a ver com várias coisas. Mas uma característica que temos vindo marcando é como o trotskismo “regional” tem uma orientação mais direta para a luta de classes. É, em termos gerais, um trotskismo “da luta de classes” (7).

Enquanto que o “caso europeu” é caracterizado por uma vida mais “vegetativa”, com menos dinamismo, com uma vida política mais mediada e internista. Apesar de que para ser justos, o SWP inglês mostrou algum dinamismo “campanhista” (não em inserção operária) na primeira metade da primeira década do século, está agora atolado em uma grave crise a partir de uma série de desvios movimentistas que lhe tem custado caríssimo.

São traços diferenciais muito marcantes entre um “trotskismo de luta de classes” e outro que parece “abulico” (o mandelismo, acima de tudo) diante dela, retirado em si mesmo, sem reflexos construtivos como organização revolucionária no seio da luta de classes

Dados esses altos e baixos das várias correntes do socialismo revolucionário, uma questão é se podemos avaliar que, a partir dos acontecimentos mundiais dos últimos anos, está colocado que o trotskismo, ou um setor dele, vá em direção a um salto de conjunto. É uma questão muito difícil de responder acerca da qual, no entanto, parece haver indicações no sentido positivo do termo.

Tudo parece indicar que na última década, na medida em que o trotskismo latino-americano tem sido mais “estável” do que o europeu, há uma progressão ou acumulação que até agora não teve grandes interrupções, ou grandes crises e retrocessos profundos. Como já assinalamos, o NPA e o SWP tiveram o seu momento de “estrelato” na primeira metade da década passada, que desperdiçaram e caindo depois em crise. O mandelismo continua a se beneficiar de ser “a quarta”, a “maior corrente” até certo ponto. E como não exige muito (seu regime é frouxo e federativo, e seus grupos não são muito militantes), seus encontros internacionais são “grandes fóruns” onde se acercam grupos e correntes das mais diversas.

No caso da América Latina, as coisas parecem mais estáveis. De qualquer forma, houve inflexões, mudanças nas “posições”, altos e baixos. Vemos agora na Argentina o resultado da experiência da FIT e do Nuevo MAS para observar se caminha-se para um nível superior na experiência, como parece cada vez mais colocado devido ao peso político-eleitoral tanto da FIT (como também do Nuevo MAS, 1 milhão e 100 mil votos, respectivamente). E, acima de tudo, do progresso no acúmulo das organizações dentro da nova geração operária, cuja experiência mais importante deste ano foi a da Gestamp.

Como um todo, parece haver uma maior “audiência” para o trotskismo; sua identificação e/ou monopólio do “espaço” da “esquerda conseqüente”. Uma identificação e legitimidade algo maior, inclusive, da figura do próprio Trotsky, isto como parte de um fenômeno mais geral de um certo renascimento do marxismo: “o retorno de Marx”.

Em todo caso, para dar uma definição geral, teremos que esperar que esse fenômeno se consolide. Mas a dinâmica parece ser ascendente, pelo menos na América Latina. E na Europa, fenómenos como o Syriza na Grécia ou o Podemos na Espanha, também marcam uma certa “ascensão da esquerda radical”, ainda que mais em geral, porque não se pode dizer que sejam expressões socialistas revolucionárias; ao contrário, são variantes reformistas da esquerda.

 

1 Tanto as análises quanto as políticas variaram muito. Para o morenismo significou uma crise da qual não pode se recuperar como tal, resultando no surgimento de várias correntes; no caso do mandelismo, embora não tenha explodido, mergulhou-o num profundo “pessimismo histórico” que continua até hoje , assim como, lhe imprimiu fortes tendências à dissolução como uma corrente revolucionária.

2 A posição “anti-defesista” era aquela que equivocadamente igualava esses estados não capitalistas com os do imperialismo mundial; sei estabelecia uma equalização incorreta que, na maioria das vezes, terminava em um maquiamento da democracia imperialista. Nós criticamos essa posição em nossa revista Sob 17 e 18.

3 O pablismo (do líder dessa tendência, Michel Pablo) foi uma das correntes mais oportunistas do trotskismo no segundo período do pós-guerra, uma tendência que chegou até a exasperação em sua capitulação ao stalinismo. Caracterizada por uma extrema falta de perspectivas históricas, via a esse chamado a perdurar por dois ou três séculos … Veja também a respeito a revista Sob 17 e 18.

4 Veja também a este respeito a análise detalhada que realizamos em nossa revista Sob 17 e 18.

5 Com definições – ditas de maneira informal – do tipo que atualmente se vivem “derrotas mais sérias do que sob o tatcherismo”, ou que, de fato, “há rebeliões, mas nada resta”.  São definições sensíveis ao grau de retrocesso ocorrido no final do século XX, mas que perdem de vista, ao mesmo tempo, o acúmulo de experiências que estão começando a acontecer.  Mesmo a definição de que “há rebeliões, mas nada resta” não é muito materialista, porque sempre que há ações, elas se acumulam, de uma forma ou de outra, como experiência, mesmo que isso aconteça, como atualmente, partindo, de fato, de um muito baixo grau de subjetividade dos trabalhadores.

6 Em nossa avaliação genérica nos referimos às correntes que “pesam” no panorama latino-americano, de maior projeção internacional, para além de suas agudas desigualdades: a atual LIT, o PO, o PTS e nossa corrente, Socialismo ou Barbárie.

7 Isso pode ter diferentes nuances no caso do PSTU do Brasil, o que reflete, em todo caso, a inércia que vinha se acumulando no país, mas que, devido à sua inserção sindical e outros motivos, incluímos em qualquer caso nessa “tipologia” do “trotskismo da luta de classes”, uma tipologia que não nega todas as outras inércias e problemas entre as correntes da região e que são motivo de polêmica e luta de tendências cotidianas nos diferentes países.