JOSÉ LUIS ROJO
A propósito do clima de estabilidade geral que foi experimentado ao longo do ano (e às pressões de todos os tipos de período pós-moderno que ainda é vivido internacionalmente), nos ocorreu escrever essa nota geral sobre o compromisso revolucionário na atualidade.
Um objetivo coletivo
A primeira coisa a destacar tem a ver com as motivações que estão por trás da militância, especialmente quando essa militância é assumida originalmente no meio estudantil.
O simples fato de ser um estudante, de estar, de alguma forma, conectado com os debates mais gerais que são colocados à sociedade, desperta uma reflexão ou preocupação sobre as questões mais globais.
É assim, acima de tudo, entre os companheiros e companheiras que se unem à militância, ou que, de alguma forma, se sentem impelidos a participar das causas coletivas da sociedade.
Atenção: isso não é o que acontece com a media da população. Em geral, por razões materiais ou ideológicas, vivem sua vida “privada” sem sensibilidade a problemas coletivos gerais.
É comum, exceto por grandes comoções que não podem deixar ninguém de fora (grandes crises, guerras ou revoluções), que a maioria não participe de ações coletivas por interesses que não são delas imediatamente. Quer dizer: é próprio da militância que se solidarize com o interesse geral, que deixe de servir apenas ao indivídual, particular.
Preocupação que é comum entre a militância, independentemente da procedência social de cada companheiro ou companheira. Mas, em todo caso, essa condição faz especificamente parte da condição estudantil, precisamente porque tal condição facilita de alguma forma elevar o olhar para as questões do todo (daí que a esquerda revolucionária sempre tenha se alimentado da mídia estudantil).
A isto se soma outra determinação: o fato de que a preocupação do militante tenha um aspecto “transcendente” em relação à sua própria área de interesses pessoais. Ou seja: o militante que se une a uma organização revolucionária, de alguma forma, com suas vantagens e desvantagens, é mais ou menos consciente (ou deveria ser!) que isso o vincula ao “desenvolvimento da história”; que “liga” seu próprio destino – até certo ponto, evidentemente – ao da própria história.
O pós-modernismo tem tentado muito ridicularizar essa dimensão “transcendente” da militância (o pós-modernismo aboliu a dimensão da história, as grandes perspectivas), com a ideia de que este ou aquele militante ou a organização como um todo, são animados. pelo “messianismo” de acreditar que unir-se à luta por causas coletivas é uma “fantasia”, uma “irrealidade” ou, pior ainda, é encorajar idéias “totalitárias”. Ser “realista” seria reduzir-se à mediocridade, à rotina, à alienação, a render-se à suposta evidência do “eterno presente”.
Mas esta é uma enorme estupidez típica dos tempos que correm, representações que não podem anular, no entanto, a materialidade das coisas: a retomada da luta de classes que está sendo vivida e que começa a replantar, novamente, a luta emancipatória.
É que, de fato, unir-se à militância revolucionária conecta o miltante à obra coletiva da transformação social.
E isso não é algo que possa ser negado pela história, pelo contrário, as grandes realizações humanas, as grandes aspirações e ideais, as grandes realizações revolucionárias da classe trabalhadora, sempre foram um subproduto da ação coletiva; trabalho coletivo que, além disso, quando é verdadeiramente revolucionário, significa concomitantemente e como condição de existência, a modificação, a revolução da própria personalidade do militante como tal.
Ou seja: a militância, quaisquer que sejam os problemas ou “sacrifícios” de algum conforto que possa conter, é um “gatilho da personalidade”, uma empresa que a revoluciona como nenhuma outra: a coisa mais excitante que possa haver como dedicação da própria existência!
Insistimos O mais transformador da própria personalidade, que dá mais possibilidades de desenvolver “o ser genérico do homem”, do qual Marx falou nos Manuscritos Econômicos Filosóficos de 1844: “O homem é um ser genérico não apenas porque na teoria e na prática toma como objeto seu o gênero, tanto o seu próprio como o das demais coisas, mas também, e esta é apenas mais uma expressão para o mesmo, porque se relaciona com o gênero atual, vivo, porque se relaciona consigo mesmo como um ser universal e, portanto, livre“.
Ou seja: é essa “aspiração universal” que, de fato, libera todas as potencialidades da personalidade, as potencialidades do militante.
Como ser revolucionário em condiciones não revolucionárias?
Mas como nenhuma experiência humana é desenvolvida em abstrato, fora das determinações do tempo e da militância, o acima mencionado não pode deixar de passar pelas condições históricas em que a militância revolucionária se desenvolve hoje, condição, pressões, que de certo modo temos que encarar, não deixar que nos sujeitem.
É evidente que, em condições revolucionárias, a dedicação militante é mais perigosa, porém mais “simples” também; ninguém da população ativa quererá deixar de participar de uma revolução social em andamento, por assim dizer (daí o compromisso militante dos anos 70, por exemplo, foi o de uma geração inteira!).
Acontece, no entanto, que, atualmente, o peso dos fatores que conspiram contra a militância é enorme. Há uma combinação de circunstâncias que apontam contra a condição militante, tanto econômicas como políticas e ideológicas.
Economicamente, entre os setores do corpo estudantil de classe média, e4stão em ação uma série de “seduções”, entre as quais uma não menos importante nestes tempos de globalização, é justamente o “turismo globalizado”: a facilidade para créditos e mecanismos de financiamento desse estilo (mecanismo, o de crédito, universal para “prender” no consumo a todas as classes sociais!).
Mas concomitantemente com tantos fatores econômicos “sedutores”, há também as representações ideológicas dos tempos atuais.
Trata-se, em suma, de uma série de características que se combinam e que trazem para a militância nesses “tempos pós-modernos”, as pressões sociais e ideológicas às que está sujeita e que têm a ver com uma série de características do período: o retorno à vida individual, à exaltação “hedonista”; perdendo de vista que as coisas poderiam ser diferentes do que são; o viver o instente, com a dimensão única do presente; a perda da dimensão de futuro e, também, do passado, da luta das gerações que nos precederam.
Uma espécie de idéia geral de perda de compromisso, da paixão por perspectivas globais, das potencialidades coletivas, emancipatórias e libertadoras que se aninham em cada personalidade.
Isso nos leva ao que queremos assinalar neste ponto: a circunstância de quão é difícil ser revolucionário em condições não-revolucionárias, porque nos força a ir contra a corrente, porque nos obriga a manter amplas visões em meio à mediocridade geral, porque nos obriga a não deixar-se ganhar pelo discurso de que as coisas não poderiam ser transformadas.
São problemas reais aos quais se anexa uma representação ideológica, mas que surge terrenalmente a partir das condições do presente e que se multiplicam sob condições de estabilidade política, de declínio da luta de classes.
Assim, na educação política da jovem militância é necessário colocar esse tipo de problema na mesa. Qual é o antídoto mais clássico para esse tipo de pressão?: a luta de classes; a formação e participação da militância, das novas gerações, nas grandes e pequenas lutas operárias.
É que para qualquer militante com sensibilidade, o fato de que uma luta coletiva se desenvolva (e ainda mais se for radicalizada!), é uma prova da validade da luta pela transformação social. E não apenas uma comprovação, mas uma experiência a ser vivida que a maioria da militância (uma maioria que tenha “sangue nas veias”), não vai querer perder por nada do mundo!
Muito se fala sobre revoluções, sobre seus perigos. Mas menos é dito sobre a emancipação que é para a personalidade de cada um dos participantes, o despertar que isso significa, o aprendizado que ocorre em dias e semanas, e que concentra uma maior aquisição de consciência e experiência do que muitas décadas de estabilidade.
Já dissemos isso muitas vezes: não há nada mais emancipatório, mais “desenvolvedor” da personalidade humana, mais excitante do que a militância revolucionária, seja na época que seja (cada geração deve assumir a parte que lhe toca da tarefa histórica da transformação social), do que a participação na ação coletiva da revolução socialista, do que a construção do partido revolucionário para tais efeitos.
Tradução: José Roberto Silva