Balanço da assembleia geral dos estudantes da USP do Butantã do dia 17/10

Neste texto fazemos um balanço da assembleia geral ocorrida no dia 17 de outubro, na qual discutimos o papel da juventude nas mobilizações sociais e a urgência da ação coletiva frente à crescente ameaça da extrema direita no Brasil. A assembleia representa um espaço fundamental de reflexão e organização do movimento estudantil, especialmente no contexto eleitoral atual. Esse contexto nos chama a agir e reafirmar nosso compromisso com a luta unitária contra a extrema direita e por medidas anticapitalistas que disputem o projeto de universidade e de sociedade que queremos  contra a opressão e a exploração. Enfatiza-se a necessidade de tomarmos as ruas contra Nunes e a extrema-direita, inspirando-nos em exemplos históricos de resistência com a recente ocupação de universidades na Argentina. 

Maria Cordeiro

A juventude ocupa, sem dúvida, a posição de vanguarda nos mais diversos processos de insurreição ao redor do mundo e ao longo dos séculos. Historicamente, esse setor sempre se destacou em momentos de transformação social. Exemplos não faltam, desde os movimentos estudantis de maio de 1968 até as recentes manifestações em resposta a crises políticas e econômicas como o movimento Black Lives Matter nos EUA, acampamentos de universidades em defesa da Palestina, o levante da juventude chilena desencadeando uma poderosa rebelião popular, entre outros exemplos.

Recentemente, esse papel da juventude, principalmente do movimento estudantil, se manifestou de forma contundente nas ocupações universitárias, que começaram no começo deste mês na Argentina, nas quais a Juventude Ya Basta! (juventude do Nuevo MAS, partido irmão de nossa organização) tem participado, construído e dirigido. O governo Milei, ao conseguir aprovar seu veto à legislação universitária, intensificou as tensões nas instituições de ensino, que agora se transformam em cenários de resistência. Essa tática de luta emergiu prontamente nas universidades, escolas superiores e secundárias de todo o país e, apesar das tentativas de desmobilização da burocracia, o movimento tende a se expandir e pode inverter a situação política por lá.

Se a juventude é o setor de vanguarda do movimento de contestação da barbárie capitalista, é na rua em que reside a beleza e o poder de nossas batalhas. É apenas nas ruas com ampla mobilização social que o movimento pode se dinamizar em uma situação explosiva e partir para a conquista de suas reivindicações e necessidades. Foi assim na revolução francesa, Comuna de Paris, Revolução Russa e nos mais diversos processos de luta ao redor do mundo até hoje. Nesse sentido, o espaço parlamentar é um jogo de cartas marcadas e serve para os revolucionários apenas como ferramenta auxiliar de denúncia da burguesia, para fomentar a luta direta pelas ruas.

Atualmente, vivemos a emergência de novos atores políticos, em uma fase de ebulição de um panorama de policrise capitalista, ou seja, há catástrofe ambiental produzida pelo modelo de produção capitalista, crescimento da extrema direita a nível mundial, superexploração do trabalho combinado com tecnologias como as plataformas tais quais Uber, iFood, genocidio em curso na Palestina e guerras interimperialistas por procuração como no caso do conflito entre Rússia e Ucrânia. Em meio a essa desestruturação da “normalidade burguesa” há uma reserva de luta protagonizada pela juventude trabalhadora, feminina e negra, cada vez mais precarizada. Essa pluralidade, somada à polarização da luta de classes, cria um campo fértil para a reativação das rebeliões populares e a possibilidade de processos revolucionários.

Nesse sentido, o movimento estudantil universitário tem papel central na organização da luta anticapitalista, tanto no escopo do estudos e formação teórica da vanguarda do socialismo revolucionário quanto no campo da prática, de ser ponta de lança na luta contra a opressão e exploração capitalista. 

No Brasil, este momento de crise estrutural se manifesta na cor do céu, um cinza alaranjado que se alastrou por 80% do país após as queimadas provocadas nos biomas nacionais no mês de setembro. O governo de conciliação de classes Lula-Alckmin aposta numa frente ampla com a burguesia, na normalização de um regime em decomposição e, além de conter a luta pelas ruas dos trabalhadores e oprimidos, mantém as contrarreformas de Temer e Bolsonaro e as complementa com novos ataques como o “Arcabouço Fiscal” e o maior Plano Safra da história com R$ 400 bilhões para a burguesia bolsonarista do agronegócio. 

Paralelamente a isso, observa-se o crescimento e fortalecimento da direita e extrema direita, que, por vias eleitorais deste último período, levou mais de 70% das prefeituras no país. 

Na prefeitura da cidade de São Paulo, a conjuntura também é grave, pois nos encontramos numa disputa no segundo turno entre Ricardo Nunes (MDB) e Guilherme Boulos (PSOL), em que o candidato bolsonarista inimigo das mulheres, juventude, negros e trabalhadores se encontra a largos passos a frente nas pesquisas de intenção de votos em relação a Boulos, que por sua vez, leva uma campanha de tática frenteamplista, débil, desestruturada e cada vez mais à direita para tentar angariar votos dos conservadores e a confiança da burguesia paulistana.

Dentro da dita maior universidade da américa latina, USP,  impõe-se uma lógica de corte de gastos com permanência, reformas estruturais, professores e bolsas de pesquisa. Este ano houve tentativa da direção de mudança de horário dos alunos do noturno, fato revertido pela pressão estudantil, ataque que negaria aos discentes o direito à janta, principalmente aos que trabalham. Outra questão latente é a violência sexual e de gênero dentro do campus após alguns casos de estupro dentro do campus houve mobilização por uma infraestrutura mínima na cidade universitária para a segurança. Por fim, na universidade que se nega a pautar a necessidade da implementação de cotas trans, dentro da FFLCH há uma onda de transfobia, principalmente nas paredes dos banheiros.

É neste cenário que se insere o movimento estudantil da USP, que, apesar do contexto de anormalidade vivido, é dirigido por um DCE ordinário – gestão de Juntos/MES-PSOL, Correnteza/UP e outros setores do PSOL como Resistência –  muito aquém da mobilização que o cenário exige. Um exemplo disso é a falta de construção de espaços de organização estudantil, principalmente assembleias gerais, espaços centrais de deliberação do corpo estudantil para a organização dos próximos passos da luta do Movimento Estudantil. Lamentavelmente, assembleias são fenômenos raros promovidos pela atual gestão, principalmente desde a greve do ano passado. 

Eis que em uma confusa divulgação no instagram, que depois foi apagada e repostada com alteração na data, o DCE Livre da USP chamou uma assembleia geral dos estudantes do Butantã nesta quinta feira dia 17/10, com as pautas: “derrotar a extrema direita no segundo turno e conquistar as cotas trans.” 

Esta atividade, apesar de central devido ao grave cenário eleitoral e político da cidade de São Paulo, lamentavelmente estava esvaziada, sendo composta  principalmente pelas organizações estudantis. A assembleia foi aberta com a leitura de uma moção em apoio às ocupações dos estudantes argentinos, que foi colocada pela direção do DCE como um exemplo a se seguir na luta contra a extrema direita, mas que na prática faz justamente o contrário: a luta boa é aquela longe das nossas das nossas responsabilidades… 

Assim, entrou-se no debate eleitoral a respeito do papel da juventude uspiana na luta contra Nunes e a extrema direita. Na visão da juventude Já Basta, para derrotar a extrema direita em São Paulo, é preciso tomar as ruas já! Não podemos depositar nenhum voto em Nunes, mas também, nenhuma confiança na conciliação de classes! Como já foi dito acima, as ruas são o campo mais progressivo de mobilização social, e as pressões nas ruas são um fator decisivo para contrabalancear a atual correlação de forças e virar a opinião dos indecisos e colocar a extrema direita contra as cordas.

Nesse sentido, o vira voto, panfletagens individuais a favor de Boulos e contra Nunes são importantes, no entanto, apostar apenas nessa tática ordinária para o segundo turno é extremamente insuficiente diante da diferença percentual de intenção de voto entre os dois candidatos. Um exemplo de mudança de correlação de forças contra o avanço da extrema direita foi o movimento liderado por mulheres, #Elenão, que colocou milhares de pessoas nas ruas contra Bolsonaro em 2018. Assim, quando a batalha é travada nas ruas, a vanguarda se sobrepõem e arrasta os setores mais atrasados, algo que não ocorre quando a disputa está apenas no campo eleitoral, na qual o voto da vanguarda, por mais ultra crítico que possa ser, se dilui nas estatísticas. É preciso construir um tsunami estudantil popular com os mais amplos setores nas ruas, nos inspirar na luta contra Milei e a extrema direita na Argentina.

Durante a assembleia, a posição do PSOL, Correnteza e demais setores juntos à gestão foi de colocar as panfletagens em oposição à mobilização nas ruas, atividades que podem ser complementares. Ficamos com a sensação de que já expressavam um sentimento de derrota que as próprias direções de suas organizações construíram. Essa posição passiva e acrítica, “apostando” no vira-voto individual e descartou por completo a real força da juventude nas ruas. Ao mesmo tempo, setores da esquerda independente como os companheiros do Rebeldia/PSTU e Vamos à Luta/CST não apresentaram uma posição que se destacasse do eleitoralismo acrítico da esquerda da ordem: consideram os limites da candidatura de Boulos e chama ao voto crítico, no entanto não formulam sobre a necessidade de mobilização nas ruas nem em atividades para além do calendário eleitoral. Uma outra espécie de postura apática, tendo como centro de sua diferenciação política com os reformistas apenas o voto crítico, tática limitada ao terreno eleitoral e reproduz a lógica socialdemocrata de se separar a posição eleitoral da luta direta.

De um outro lado há a posição ultra sectária do Faísca/MRT, que ao contrário de uma adaptação eleitoral encarnada nas outras correntes, resolveu ignorar a disputa eleitoral como se o resultado não tivesse implicações categóricas à vida dos trabalhadores e oprimidos. Avaliamos que os companheiros terminaram por conceder a vitória da direção derrotista, de que poderíamos haver unificado na proposta que fizemos para a construção de um ato de rua para colocar o movimento estudantil na ponta de lança contra a extrema direita. Abstiveram-se com o equivocado e mais uma vez sectário argumento que o chamado ao ato não deveria mencionar a disputa eleitoral. 

Por último, não poderíamos deixar de denunciar a manobra antidemocrática do DCE e suas organizações que publicaram na página da entidade apenas os encaminhamentos propostos pela atual gestão. Conscientemente, os companheiros censuraram a publicação dos encaminhamentos feitos por nossa organização, moções votadas por consenso pela plenário: uma pela reestatização do serviço de energia elétrica com a exigência da ruptura imediata da concessão com a Enel por parte do governo federal por caducidade e a incorporação do apoio e construção do calendário de lutas contra as mudanças climáticas, pela reforma agrária radical sob controle dos trabalhadores, contra o agronegócio e o nefasto Marco Temporal que intitucionaliza o genocídio indígena. 

Sendo assim, é preciso reiterar que são as ruas que dão a última palavra na luta contra a extrema direita, e a juventude, hoje vanguarda das mobilizações sociais, é sempre ponta de lança nos diversos processos de contestação da opressão e exploração do capital. 

De pé movimento estudantil

Que façamos como os estudantes da argentina! 

Para derrotar a extrema direita em São Paulo: Tomar as ruas já! Nenhum voto em Nunes e nenhuma confiança na conciliação de classes!