Direção do PSOL dá mais um passo no sentido do ingresso na chapa Lula-Alckmin e da liquidação política do PSOL como partido independente dos patrões e da burocracia

ANTONIO SOLER

Ontem foi anunciado formalmente pela executiva estadual do PSOL e pelas redes de Guilherme Boulos, que o mesmo não seria mais pré-candidato ao governo do Estado de São Paulo. Essa informação não foi exatamente uma novidade, pois as negociações para que Boulos abrisse caminho para a pré-candidatura do PT, com Fernando Haddad, e para as negociações para o ingresso do PSOL na frente Lula-Alckmin já eram bastante especuladas. 

Informações dos bastidores dão conta de que, além da suspensão da pré-candidatura ao governo do estado, o anúncio da pré-candidatura para deputado federal, Boulos também teria participação em um futuro possível ministério de Lula e teria apoio do PT e de Lula para disputar a prefeitura de São Paulo em  2024. Mas, para além do factoide que constitui o anúncio da desistência – escrita nas estrelas (sic) – de Boulos de se candidatar a governador, o que é importante discutir é o que esse gesto significa para a política eleitoral do PSOL, para a constituição da frente ampla com Lula-Alckmin e para a luta de classes.

Em nota, a executiva estadual do PSOL afirma que Boulos irá assumir o desafio de ser pré-candidato a deputado federal porque essa “(…) decisão coloca o partido em outra condição para ultrapassar a cláusula de barreira e projetar lideranças de esquerda e movimentos sociais no Congresso Nacional, uma tarefa importante dos nossos tempos.”, que “(…) nos guiamos pela luta para derrotar Bolsonaro, o bolsonarismo e o tucanato que domina São Paulo há décadas. A partir disso, nos propomos a colaborar com uma alternativa de esquerda para São Paulo” e que o “(…) Diretório Estadual irá conduzir o diálogo com os partidos de esquerda antes de decidir nossa tática sobre a disputa em SP, levando em conta que a unidade da Esquerda só pode se viabilizar se vier acompanhada de uma base programática sólida, que permita projetar um governo de esquerda sem alianças com partidos de direita e do centrão para reconstruir SP pelas mãos dos movimentos sociais e para cumprir com as necessidades mais emergentes do povo trabalhador.”

Os argumentos da executiva estadual para suspender a pré-candidatura de Boulos são totalmente falaciosos. Em primeiro lugar porque, ao contrário do argumento de que ir como candidato a deputado é melhor para superar a cláusula de barreira, uma chapa com Boulos – que obteve 40% dos votos para a prefeitura de São Paulo, o maior colégio eleitoral do país – ao governo do estado de São Paulo teria muito mais impacto na realidade política, o que permitiria, inclisive, eleger deputados estaduais e nacionais. Na continuidade do texto citado, o argumento da executiva se torna ainda mais manipulatório, pois o partido estaria disposto a construir a “unidade da esquerda” com “base programática sólida” para construir a luta para derrubar Bolsonaro, o bolsonarismo e o tucanato em São Paulo. 

As tentativas vindas da direção do partido – tanto estadual quanto nacional – de manipulação de consciência parecem não ter fim. Todo mundo sabe que a chapa que está sendo constituída nacionalmente pelo PT e por Lula está a anos luz de ser uma aliança de esquerda. Além do PT, que tem origem operária mas que já se tornou um partido da ordem há muito tempo – um partido burguês-operário que faz em todos os níveis governos burgueses – essa aliança irá contar muito provavelmente com Alckmin, que dispensa apresentações, e outros partidos diretamente burgueses. Ou seja, teremos uma aliança eleitoral que abarcará PT e representantes de várias frações da classe dominante para a qual a direção do PSOL está levando o partido com a falácia de que é necessário a “unidade da esquerda para derrotar Bolsonaro”.   

Denunciar a manobra de consciência e lutar contra a liquidação 

Essa decisão da direção e de Boulos de retirar a sua pré-candidatura ao governo do estado é um passo decisivo para uma capitulação ao lulismo que se não for revertida irá custar muito caro. O mantra da “unidade da esquerda para derrotar Bolsonaro” usado pela direção majoritária (grupo que se denomina como PSOL de todas as lutas e é formado pela Primavera Socialista, Revolução Solidária, Resistência e Insurgência),  esconde, na verdade, a política de levar o partido para uma frente eleitoral burguesa que terá participação até de representantes do capital financeiro – totalmente ao contrário do que diz a direção. Trata-se não de uma política de luta contra Bolsonaro, mas significa justamente a anulação política desse combate (de uma política concreta para enfrentar a extrema direita).

A luta pela independência de classes, que a direção majoritária está jogando na lata do lixo com o ingresso na chapa Lula-Alckmin, não é um exercício de purismo político ou coisa que valha. O ingresso em frentes políticas burguesas na história – inclusive recente – levam invariavelmente à perda da capacidade das organizações socialistas de cumprirem o seu papel fundamental que é manter a sua independência política para de impulsionar a luta direta dos trabalhadores e oprimidos e se constituir como uma alternativa de direção à esquerda. No caso específico do Brasil, entrar na chapa Lula-Alckmin significa um crime político de criar ilusões de que se pode derrotar Bolsonaro e o bolsonarismo sem duras mobilizações de rua e deixar de organizar e fazer exigências sistemáticas para que Lula, PT e CUT organizem mobilizações de rua durante o processo eleitoral. 

Evidentemente que diante de um perigo de vitória de Bolsonaro no primeiro turno, devemos chamar o voto crítico em Lula para que o neofascista não se reeleja. Mas isso é algo totalmente diferente de entrar em uma chapa burguesa como quer a direção do PSOL. Por isso, além da democracia interna que está sendo aviltada pela direção, pois o Congresso do partido autorizou a construção de uma frente de esquerda e não uma frente com a burguesia, precisamos falar com todas as letras que a política levada pela direção de ingressar em uma frente burocrático-burguesa é uma traição de dimensões históricas, pois é uma ruptura total com a independência de classe e com as estratégias de mobilização direta da classe trabalhadora e dos oprimidos – características insubstituíveis de qualquer esquerda que se pretenda socialista e queira cumprir um papel significativo na luta de classes. 

A linha que está sendo levada, ao contrário do que fala a direção, não tem nada de “unidade de esquerda para derrotar Bolsonaro”. A ausência de uma forte pré-candidatura a presidente e de fortes pré-candidaturas a governos estaduais, bem como para cargos proporcionais, têm como consequência prática o desarme político do PSOL para organizar a principal tarefa hoje: a mobilização direta contra Bolsonaro – que está longe de ser um cachorro morto, perigo eleitoral e para os direitos democráticos – nas ruas pelo movimento de massas.   

É preciso que essa manobra liquidacionista da independência de classes e da luta direta para derrotar Bolsonaro nas ruas levada pela direção do PSOL ao ingressar na chapa Lula-Alckmin – agora facilitada pela suspensão da  pré-candidatura de Boulos para o governo do Estado de São Paulo com o argumento da “unidade da esquerda” – seja amplamente denunciada pela esquerda do PSOL. Nós, do Socialismo ou Barbárie, colocamo-nos na linha de frente dessa luta e chamamos todos os militantes, filiados e simpatizantes que se somem a ela, pois o que está em perigo de ser liquidado é um instrumento histórico da luta imediata e histórica dos trabalhadores. Como parte desse combate, chamamos todos e todas para lerem e assinarem o manifesto PSOL na encruzilhada – através do link https://bit.ly/psolnaencruzilhadae a se somarem à luta contra a liquidação do caráter anticapitalista, de luta e democrático do partido.