Após um ano assassinos de Marielle Franco são presos

Investigação independente da possível relação de Bolsonaro com assassinos é decisiva

POR ANTONIO SOLER

Ontem completou um ano do assassinato de Marielle Franco (Vereadora no município do Rio de Janeiro) e Anderson Gomes (motorista que conduzia Marielle e uma assessora que sobreviveu ao atentado). Esse crime político, apesar da prisão e provas da execução por dois milicianos, não foi solucionado porque todas as evidências indicam uma execução política feita sob encomenda que tinha o objetivo de aterrorizar a esquerda e criar um clima favorável para a onda reacionária que acabou elegendo Bolsonaro para presidência.

Milícia foi responsável pela execução política

A Delegacia de Homicídios (DH) do Rio de Janeiro e o Grupo Especial de Combate ao Crime Organizado da Promotoria Pública, nessa terça-feira (12/03), depois de um ano de idas e vindas nas investigações em conjunto, participaram da operação que resultou na prisão dos executores do assassinato de Marielle e Anderson. Trata-se de dois conhecidos assassinos e milicianos, o sargento reformado da PM Ronnie Lessa, acusado de efetuar os disparos, e do ex-PM expulso da corporação Elcio Vieira de Queiroz, motorista do veículo utilizado na ação.

A prisão de Lessa e seu comparsa trouxe elementos intrigantes para o cenário nacional. Em primeiro lugar, o assassino já preparava uma fuga quando foi preso em sua casa que fica no mesmo condomínio residencial, na Barra da Tijuca, e na mesma rua em que Jair Bolsonaro tem residência. É interessante notar que Lessa tendo uma renda mensal de R$ 8 mil, tem um patrimônio milionário que conta com uma série de propriedades.

É lógico que a condição material privilegiada de Lessa advém de suas atividades criminosas e de um lugar de destaque no crime organizado. No mesmo dia da prisão, foi descoberto um arsenal de nada mais nada menos do que 117 fuzis M16 em um apartamento de um amigo.

Fato que revela que o assassino e o seu comparsa participam de um esquema criminoso de larga escala, que para funcionar tem que contar com a colaboração de agentes públicos em vários postos do executivo, legislativo e judiciário.

Hoje mais um fato chama a atenção e pode ser fundamental, se for investigado a fundo, para determinar quais foram os mandantes do crime. O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) informou uma movimentação financeira atípica de Lessa ao receber um deposito em espécie de R$100 mil reais em outubro passado. Ou seja, no mesmo mês que transcorreu o processo eleitoral.

Os fatos que surgiram com a investigação da execução política de Marielle e que vieram a público nos últimos dias mostram apenas a ponta do iceberg do crime organizado no Rio de Janeiro e o envolvimento da polícia e da política do Estado com a milícia.

As informações que circulam pela mídia dão conta que Lessa é um assassino profissional largamente conhecido no Rio de Janeiro. Dizem que para contratar os seus “serviços” bastava ir até Quebra Mar, na Barra da Tijuca, lugar frequentado diariamente por Lessa.

Além disso, no dia 27 de abril do ano passado, Lessa foi atingido no pescoço por um disparo de arma de fogo, mas mesmo sendo um notório miliciano que nunca foi alvo de inquérito policial porque existem claros indícios de que o comando da Polícia Civil é praticamente todo comprado pela milícia não foi preso ou submetido a interrogatório.

Obstáculos políticos e influência da milícia nas investigações

Para essa linha de investigação que levou a prisão dos executores do crime só ocorreu a partir da intervenção tardia, que seja dito, da Polícia Federal (PF) no sentido de estabelecer uma linha investigativa plausível. A demora em achar os culpados pelo crime, conhecidos milicianos, e todo o segredo investigativo em um ano eleitoral polarizado como foi 2018, certamente junto com a prisão de Lula e outras manobras reacionárias foram importantes para a vitória de Bolsonaro.

Como parte das manobras diversionistas para tentar deslocar as motivações claramente políticas, assim que foram efetivadas as prisões, integrantes do Ministério Público (MP) do Rio de Janeiro que acompanharam a investigação e o Delegado da Delegacia de Homicídios (DH) responsável pela investigação, Giniton Lages, deram entrevistas coletivas em que diziam que o crime teria sido motivado por “crime de ódio”, “obsessão por personalidades que militam na esquerda política”, “por repulsa às causas que Marielle defendia”, tais como a “defesa minorias, mulheres negras, LGBTs, entre outras”.

Mas, o perfil dos acusados pelo duplo assassinato vai em direção oposta da linha um tanto pueril (sic) proposta pelo MP e pela DH. Ou seja, que se trataria de um crime motivado por ódio ou alguma patologia psicológica dos envolvidos. Os fatos que vieram à tona nos últimos dias e a capivara dos acusados indicam uma linha de investigação totalmente oposta, ou seja, de que são assassinos profissionais, membros de empresas criminosas estruturadas que só podem funcionar a partir da participação de policiais e demais agentes públicos.

Bolsonaro está moralmente impedido de governar

A prisão de Lessa e Queiroz pode abrir uma conjuntura política distinta da vivida com a eleição de Bolsonaro em outubro de 2018. Desde lá, apesar das denúncias de envolvimento da família Bolsonaro com milicianos, não se tinha indicadores de envolvimento desses com a execução política em questão e o governo estava em franca ofensiva.

Apesar das idas e vindas do seu governo, do desligamento do Ministro da Secretaria da presidência, de todas as sandices de Bolsonaro e de parte do seu ministério, da irritação popular demonstrada no Carnaval e das importantes marchas do movimento de mulheres no último 8 de Março, o governo vinha abertamente na ofensiva com sua pauta extremamente reacionária em marcha e setores amplos da classe trabalhadora, da juventude e das mulheres não tinham se colocado ainda em movimento para enfrentar o governo e seu próximo brutal ataque que é a reforma da previdência. Mas a exposição dos criminosos e seu envolvimento com grupos milicianos já é por si um poderoso golpe em um presidente que tem vínculos estreitos com chefes foragidos da milícia e pode colocar a resistência dos trabalhadores e oprimidos em outro patamar.

Quando perguntado em entrevista coletiva se havia alguma ligação entre os acusados e Bolsonaro, a resposta do Delegado da DH que comandou as investigações foi a de que o filho caçula do ex-presidente teria namorado com a filha de Lessa, mas que além disso não havia outros fatores que ligavam os dois. Por sua vez, Bolsonaro, apesar de aparecer em fotos com o acusado do crime diz não se lembrar do vizinho, fato que está evidentemente por se esclarecer devido a ligação umbilical de Bolsonaro e sua família com integrantes de milícias.

Após as prisões de Lessa e Queiroz a ligação de Flavio Bolsonaro quando Deputado Estadual da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (ALERJ) com o Capitão da PM Adriano Nogueira ganha outro relevo. Nogueira, hoje foragido, é um dos membros do chamado “Escritório do Crime”, grupo de milicianos extremamente violento, teve mulher e mãe empregadas no gabinete de Flavio na ALERJ até o segundo semestre de 2018.

Além de vizinho de Bolsonaro, de ter a filha namorada pelo seu filho caçula, Lessa chegou a ter uma academia de ginastica em Rio das Pedras, bairro carioca dominado pela facção de Nogueira. Ainda não podemos bater o martelo na ligação direta entre Nogueira e Lessa, mas não está descartado que informações sobre surjam nas próximas semanas. Fato que se comprovado abriria uma crise política capaz findar com o atual governo.

De qualquer forma, temos diante dos nossos olhos o processo de desvelamento do envolvimento do governante e sua família de extrema direita com setores mafiosos que podem estar envolvidos na execução política de Marielle, fato que por si só coloca esse governo sob uma grave suspeita e sem condições políticas e éticas de seguir governando até que a verdade venha toda a tona.

Esse governo burguês anormal que parecia um monstro que devoraria os direitos dos trabalhadores e suas organizações sem que uma resistência a altura pudesse ser realizada, diante da prisão dos assassinos de Marielle pode entrar em uma crise profunda nas próximas semanas a depender da revelação de novos fatos combinada com a mobilização contra a “reforma” da Previdência, Ou seja, temos que aproveitar a fragilização do governo e seu envolvimento com setores milicianos para exigir que as investigações sejam feitas de forma independente e que as suas contrarreformas sejam interrompidas.

Marcelo Freixo e a direção do PSOL estão propondo uma CPI na Câmara dos Deputados para investigar as milícias e sua relação com a morte de Marielle. Pensamos que essa é uma medida que pode contribuir para chegarmos aos mandantes diretos do crime. Diga-se que além dos Bolsonaro, a cúpula do MDB no Rio de Janeiro, inimigos declarados do PSOL, os Deputados Estaduais Edson Albertassi, Paulo Melo e Jorge Picciani, presos por esquemas milionários de corrupção, é outro grupo político que deve ser investigado.

Pensamos que a exemplo das manifestações que ocorreram hoje por Justiça para Marielle e Anderson, vivemos uma circunstância política mais favorável à luta para derrotar Bolsonaro e suas contrarreformas. A nossa luta pela derrota das contrarreformas passa pela derrota desse governo e as recentes prisões dos milicianos pode colocar outro patamar político no qual a exigência da investigação a fundo da possível relação de Bolsonaro com os assassinos ganhar centralidade.

O principal símbolo da defesa dos direitos democráticos hoje no Brasil é Marielle. Nesse sentido, o combate a esse governo e seus ataques passa por combinar a luta contra a “reforma” da Previdência com a luta por uma apuração independente. Para isso, pensamos que junto com a denúncia da “reforma” da Previdência e da mobilização para derrotá-la, temos que realizar uma ampla campanha desde a rua por uma investigação independente.

Nesse sentido, a proposta de criação da CPI das Milícias feita pelo PSOL é correta, mas não pode esta descolada da necessidade de criarmos desde a base um movimento de rua que exija uma investigação independente da relação de Bolsonaro com os assassinos.

Bolsonaro é um governo sob suspeita!

Investigação independente desse crime político!

Não a “reforma” da Previdência que só ataca dos direitos dos trabalhadores!

Chega de Bolsonaro, inimigo dos trabalhadores, das mulheres e da juventude!