Liminar que determinava a soltura de Lula é cassada

ANTONIO SOLER*

Na última quarta-feira, dia 19/12, o Ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Marco Aurélio concedeu liminar favorável suspendendo a prisão de condenados em segunda instância antes do trânsito em julgado, ou seja, antes que o réu recorra a todas instâncias do judiciário.

O ato jurídico logo ganhou repercussão política nacional e internacional, pois a liminar poderia, além de colocar em liberdade 169,5 mil presos, proporcionar a soltura de Luiz Inacio da Lula Silva. No entanto, poucas horas depois, o presidente do STF, Dias Toffoli, em resposta ao pedido da Procuradoria Geral da República (PGR), suspendeu a liminar.

Judiciário como instrumento da ofensiva reacionária

Essa polarização de posições na Corte Suprema do país só pode ser compreendida no marco da onda reacionária que vivemos há anos, que levou ao impeachment de Dilma, as contrarreformas de Temer, a prisão de Lula e a eleição de Bolsonaro.

Do ponto de vista constitucional, a prisão em segunda instância se choca diretamente com o princípio constitucional de presunção de inocência e de que prevê a prisão só depois do trânsito em julgado.

No entanto, recentemente, em 2016, sob a pressão reacionária do impeachment, o STF no julgamento de um habeas corpus definiu que tribunais de segunda instância podem executar a pena mesmo os réus podendo recorrer a instâncias superiores. Essa foi uma decisão de 6 a 5 votos apenas, além disso um dos juízes que votaram pela prisão em segunda instância, Gilmar Mendes, declarou ter mudado de opinião. Ou seja, hoje a decisão de 2016 é minoritária entre os ministros do STF.

Para agravar a polarização no STF, a anterior presidente do Tribunal, Carmen Lucia, negou-se em colocar em votação a ação de constitucionalidade de relatoria de Marco Aurélio, o que foi uma clara manobra para que o placar de 2016 em relação ao tema não fosse revertido. Com essa manobra, foi possível que, após a condenação relâmpago em segunda instância de Lula, o levasse para a cadeia.

Como o Supremo diante da forte polarização política perdeu qualquer aparência de autonomia diante dos interesses da classe dominante, para levar a cabo a estratégia de afastar Lula das eleições de outubro, o Supremo negou por 6 a 5 votos, no dia 4 de abril, habeas corpus preventivo e Lula foi preso no dia 7 de abril.

Essa votação foi precedida por chantagem do chefe das forças armadas, General Villas Boas, via twitter de que “assegurava à Nação que o Exército Brasileiro julga compartilhar os anseios de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à constituição, à paz social e à Democracia, bem como se mantem atento às missões institucionais”.

Da mesma forma que a influência dos militares aumenta cada vez mais no executivo, no próximo governo serão 5 ministros militares, a influência desse setor nas decisões do Supremo vem sendo recorrentes. Dias Toffoli, ministro do STF que derrubou a liminar do ministro Marco Aurélio, é assessorado por um militar que recentemente foi nomeado ministro por Bolsonaro, essa nomeação foi fruto de uma negociação entre judiciário e a cúpula militar que passou a “tutelar” as decisões do Supremo.

Luta em defesa dos direitos democráticos

No que pese a polarização no Supremo em torno do tema da prisão em segunda instância, refletindo a polarização social e política em que vivemos, o que predomina na conjuntura é a ofensiva reacionária que acaba de ter como resultado a eleição de Bolsonaro.

Da mesma forma que a prisão de Lula sem provas e em segunda instância foi fundamental para impor a eleição de uma candidatura ultra-neoliberal, desrespeitando a soberania popular, a classe dominante sabe que a situação no país não está totalmente pacificada, por isso está unificada em torno de garantir uma posse a Bolsonaro em 1º de janeiro sem as movimentações políticas que a soltura de Lula nesse final de ano poderia gerar.

A próxima votação no STF sobre o tema da prisão em segunda instancia foi marcado para abril do próximo ano, mesmo do ponto de vista jurídico parecer que a posição favorável a prisão após julgamento em segunda instância se reverter em relação ao julgamento de 2016, a julgar pelo fato de que o judiciário tem sido reduzido a instrumento da ofensiva reacionária, não se pode ter de antemão qual será o resultado.

O que está claro sim é que toda a estratégia política do lulismo, além de fazer o movimento dos trabalhadores recuar e permitir o avanço reacionário da classe dominante chegando a eleição de Bolsonaro, do ponto de vista da defesa de Lula foi um fracasso. Nesse sentido, ter desmobilizado a luta após a greve geral de 2017, ter se entregue Lula à prisão “confiando na justiça”, não ter enfrentado politicamente Bolsonaro desde o primeiro turno e agora não construir uma ampla unidade de ação desde a base para enfrentar esse governo desde o início é o que explica politicamente a prisão de Lula.

Certamente, como parte da luta em defesa dos direitos democráticos, lutar pela liberdade de Lula é uma pauta importante, pois sua prisão e impossibilidade de concorrer as eleições simbolizam um ataque direto à soberania popular. Por isso, pensamos que nosso partido, o PSOL, tem que exigir da burocracia lulista que a luta em defesa da liberdade de Lula seja parte de uma série de reivindicações que respondam aos ataques políticos e econômicos que nossa classe, as mulheres e a juventude irão sofrer na próxima etapa.

*Com a colaboração de Gabriel Barreto