Renato Assad
Em 2008 o mundo acompanhou o início de uma crise econômica internacional desencadeada por uma bolha no mercado imobiliário estadunidense com consequências dramáticas nos quatros pontos cardeais do planeta. Esse cenário econômico-social levou à intensificação da luta dos trabalhadores e da juventude, contra as medidas imperialistas e neoliberais, que colocavam a possibilidade de ruptura de soluções apenas pela institucionalidade e programas conciliatórios, porém que não avançaram para esse campo pela criminosa capitulação de direções captadoras do Syriza, na Grécia, e Podemos, na Espanha, por exemplo.
Uma crise tomada por elementos que indicavam o caráter estrutural desta, expondo ao mundo a dificuldade que o capitalismo deste século encontra em manter e ampliar as taxas de lucro em escala internacional.
A perspectiva dos interesses imperialistas impôs sistematicamente uma agenda de duros ataques à classe trabalhadora internacional, colocando uma regressão histórica no nível de vida das massas e que, consequentemente, desencadeou processos radicalizados de luta pelo mundo.
Em alguns lugares estes processos avançaram para processo de rebelião popular – um patamar diferenciado de luta que vai e volta, que atingem objetivos parciais, às vezes derrotadas, mas que não são revoluções – que sacudiram países há anos submetidos a ditaduras, como foi o caso da Primavera Árabe, e que seguem pipocando em várias regiões do mundo como, esse é o caso chileno e, mais recente, o colombiano, que todavia mantém o seu desfecho indefinido.
Longe de haver sido superada, a crise de 2008 ganhou um histórico e inédito capítulo, todavia ainda em desenvolvimento com a explosão da pandemia do novo coronavírus que agrava ainda mais o cenário em uma tendência progressiva de ruptura com a normalidade frente a uma das mais graves crises sócio sanitárias da história.
Aqui não podemos, em hipótese alguma, deixar de insistir que esta pandemia e o surgimento de novos patógenos são consequência direta do modo de produção capitalista, como deixou claro o biólogo evolucionista Rob Wallace. Modo de produção que avança sobre terrenos de maneira irracional e insuportavelmente agressiva, indicando ao mundo o caráter destrutivo das relações de produção capitalistas e suas consequências ambientais, sanitária e sociais, que coloca um cenário de barbárie mundial com mais de 3 milhões de mortos e a incapacidade de imunização em massa.
Dados do Banco Mundial nos ajudam a reafirmar as consequências desta crise histórica do capitalismo sobre os ombros dos explorados e oprimidos. Segundo esta instituição, já são mais de 150 milhões de pessoas que foram lançadas na pobreza extrema neste período pandêmico e que agora se somam às mais de 2,8 bilhões que já estavam nesta condição e que representam quase 40% do total populacional mundial.
Pela perspectiva dos interesses imperialistas frente ao catastrófico cenário de crise humanitária internacional, que enfrentam grandes e históricas dificuldades em estabilizar a situação social, sanitária e econômica, com destaque para os EUA, o ano passado (2020) foi um marco comprometedor nos elos da cadeia produtiva internacional que atingiu uma retração histórica de cerca de 4,3% no PIB mundial, a pior desde a crise de 1929, a Grande Depressão.
A regressão das condições objetivas da classe trabalhadora internacional e a falta de perspectiva das novas gerações para com um futuro humanizado – acesso a saúde, emprego e educação – a mando de uma política imperialista e ultraliberal, tomada pelo desemprego, pela informalidade laboral e pela pobreza generalizada, serviu, e segue servindo, para o desencadeamento de processos políticos encabeçados pela juventude, mulheres e negros internacionalmente – estes que hoje são os setores mais dinâmicos na luta de classes. Aqui queremos ressaltar um fenômeno de profunda riqueza: de que as novas gerações forjam na luta direta pelas ruas uma retomada histórica das lutas dos setores explorados e oprimidos, cujo ponto alto são as Rebeliões Populares que vêm ocorrendo desde o início do século XXI.
Estes setores, que impuseram uma derrota histórica ao trumpismo, que disseram não ao estado patriarcal e machista pela legalização do aborto na Argentina, que derrotaram Piñera e sua agenda ultraliberal e uma constituinte herdade da ditadura Pinochetista e que colocam Ivan Duque contra a parede, fazendo-o recuar com a sua reforma tributária criminosa, de deixam evidente a desconfiança em velhas e reformistas direções conciliatórias que não atendem aos seus interesses.
De uma maneira ou de outra, fica clara a necessidade de superação de uma burocracia reformista que historicamente sempre impôs limites, desvios e traições às lutas e não satisfez as necessidades mais básicas das massas e/ou as reprimiu quando em seus governos, como é o caso do lulismo no Brasil.
O limite político mais imediato das recentes Rebeliões Populares e processos de luta internacionais, o que não significa que não possam avançar – afirmar o contrário seria cair em um esquematismo mecânico, unilateral, impressionista e derrotista da realidade – colocam, todavia, melhores possibilidades para a construção de uma alternativa socialista com influência sobre as massas.
Mesmo que a socialdemocracia e o reformismo não cumpram um papel central nas lutas diretas – na verdade são desarticuladores mais que nada – estes processos não conseguem conformar uma representação político-eleitoral. Assim em períodos eleitorais os votos vão para o reformismo ou até mesmo para Joe Biden como no caso norte americano, construindo uma espécie de ciclo alternativo entre governos reformistas, de direita clássica e até de extrema direita, como no caso da Colômbia, Polônia, Hungria, Brasil, Filipinas, Turquia, Índia etc.
É nesta dinâmica que nós, socialistas revolucionários/as, encontramos um desafio de natureza histórica e que necessariamente deve passar pelo balanço das experiências do século passado para podermos avançar sobre setores da classe trabalhadora na histórica batalha internacional de transformação da nossa classe em classe histórica, classe para si. A ação em relação às novas experiências de luta em escala internacional exige que avancemos de maneira consequente e coerente junto a estes setores.
Por tudo isso, achamos necessário que as forças da esquerda revolucionária e movimentos em luta organizem uma Conferência Internacional Anticapitalista com o objetivo de gerar um espaço para processar essas novas experiências de luta e coordenar esforços para a intervenção das correntes revolucionárias.