Organizar uma jornada combativa e de massas contra Bolsonaro e sua a “reforma” da Previdência
POR ANTONIO SOLER
A “reforma” da Previdência de Bolsonaro quer acabar com a tradição de solidariedade e cuidado mútuo entre as gerações da classe trabalhadora que teve origem nas primeiras grandes lutas operárias durante o século XIX. Essa contrarreforma se configura em um dos maiores ataques à classe trabalhadora e aos oprimidos da nossa histórica, pois acaba com as condições mínimas de existência dos mais pobres, retira direitos e aprofunda as desigualdades. O governo de extrema direita de Bolsonaro quer dar um passo fundamental para quebrar a coluna vertebral dos de baixo, para tal precisa sufocar qualquer resistência e impor uma derrota estrutural aos trabalhadores. Porém, entre a vontade da classe dominante e a realização dos seus projetos existe um hiato que é ocupado pela luta de classes. As contradições internas do governo, seu envolvimento com caixa dois nas eleições, sua política de armamento e extermínio, os ataques ao conjunto dos oprimidos, as divisões internas que começam a surgir entre setores da classe dominante e as suspeitas de envolvimento com a execução política de Marielle Franco têm fragilizado esse governo e colocado condições melhores para que os trabalhadores, as mullheres e a juventude derrotem essa contrarreforma.
PEC 6/2019 é um ataque brutal aos trabalhadores e oprimidos
Para começar a sequência de absurdos, a PEC 6/2019 se aprovada retira a Previdenciárias do âmbito da Constituição Federal, facilitando assim que novas mudanças sejam feitas por meio de leis complementares, o que requer votações com maioria simples na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.
A PEC Institui idade mínima de aposentadoria para todos os trabalhadores de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres. Para obter 60% do benefício será necessário contribuir no mínimo 20 anos, e a aposentadoria integral só será permitida depois de 40 anos de contribuição. Ou seja, esse tempo mínimo para a aposentadoria proporcional ou integral será muito maior, pois é necessário levar em conta os períodos longos de desemprego que a maioria dos trabalhadores têm que enfrentar.
Na aposentadoria rural a regra atual é de 55 anos para mulheres e 60 anos para homens. Agora, a idade mínima da mulher se iguala com a do homem e será de 60 anos. Além disso, institui o caráter contributivo para a previdência rural e a contribuição mínima de 20 anos. Um tremendo ataque ao trabalhador rural que sofre com uma intensa precarização, principalmente à trabalhadora obrigada a cumprir várias jornadas de trabalho.
Para professores será preciso, para ambos sexos, comprovar 30 anos de contribuição exclusivamente exercendo função de professor, seja na educação infantil, ensino fundamental ou médio, dez anos de efetivo exercício de serviço público e cinco anos no cargo efetivo em que for concedida a aposentadoria. Além disso, será necessário ter idade mínima de 60 anos para homens e mulheres. Um ataque absurdo a uma categoria que é submetida a intensa carga de trabalho, estresse crônico e péssimas condições de trabalho.
O cálculo da aposentadoria a ser recebida pelos trabalhadores segundo a proposta do governo considerará a média de 100% das contribuições feitas ao longo da vida. Atualmente, o valor do benefício considera a média de 80% das maiores contribuições, ou seja, 20% delas (as menores) são descartadas.Ou seja, a nova regra dificulta ainda mais que o trabalhador possa receber vencimentos similares ao do final da sua carreira, normalmente mais altos.
O Benefício de Prestação Continuada (BPC) garantia um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais que está em situação de extrema vulnerabilidade social (renda por pessoa do grupo familiar inferior a ¼ de salário mínimo). Mas com a reforma só terá direito a receber o benefício de um salário mínimo aos 70 anos, recebendo um pequeno paliativo de R$ 400,00 a partir dos 60 anos. O que irá tornar a vida dessa parcela mais vulnerável da população ainda mais penosa.
E a crueldade não tem fim, hoje a pensão por morte é de 100% dos vencimentos, com a nova proposta será de apenas 60% do benefício. O beneficiário receberá apenas 60% do benefício mais 10% por dependente. Na Aposentadoria por Incapacidade Permanente a regra de cálculo de benefício representa 100%. Pela proposta o benefício passará a ser de 60% mais 2% por ano de contribuição que exceder 20 anos multiplicado pela média dos salários de contribuição. Com a mudança de alíquota os servidores públicos serão um dos setores mais afetados. A contribuição previdenciária deve aumentar dos 11% cobrados do salário hoje para 14%, com direito a uma taxa extraordinária de até 8% a mais.
A proposta de capitalização não consta do projeto, mas o governo prevê um regime de capitalização para Lei Complementar. O que tem defendido publicamente é que a capitalização será uma medida complementar à chamada “carteira verde-amarela”, um regime com menos direitos trabalhistas que o governo pretende implementar. A capitalização significa o fim da Previdência Social e seu caráter solidário. No Chile, o modelo tornou idosos miseráveis: 90% dos aposentados recebe menos de dois terços do salário mínimo do país. A taxa de suicídio entre octogenários é a maior na América Latina.
Essa contrarreforma é baseada em uma grande mentira
A retórica do governo e de todos os “reformistas” de plantão é a de que é “dramática a situação da previdência” porque a população tende a envelhecer de forma inexorável e, portanto, os jovens não poderiam arcar com os custos do sistema, gerando assim um déficit crescente. Mas uma série de especialistas no tema afirmam que o chamado déficit só aparece quando se retira do cálculo receitas que são previstas na Constituição.
Para financiar a Seguridade Social como um todo a Constituição criou 4 receitas: as empresas contribuem sobre o lucro (CSLL) e pagam a parte patronal da contribuição sobre a folha de salários (INSS); os trabalhadores contribuem sobre seus salários (INSS) e a sociedade como um todo contribui por meio da contribuição embutida em tudo o que adquire (COFINS).
No cálculo do governo o déficit aparece porque só se considera a receita do INSS, as demais receitas são desconsideradas. Ou seja, o governo, os técnicos do grande capital e a mídia de massas se baseiam em uma manobra contábil primária para atacar os trabalhadores e os seus direitos. Sem dizer que os donos do grande capital financeiro a cada ano recebem mais de R$ 300 bilhões por ano de juros e as grandes empresas devem fortunas a previdência – Bradesco R$ 465 milhões, Vale R$ 275 milhões e a JBS R$ 1,8 bilhão.
O centro da argumentação do governo vai no sentido de que sem reforma o país não poderá crescer, novos empregos serem gerados e a renda do trabalhador aumentar. Além disso, que o país irá quebrar pois não poderá financiar suas contas. Cria-se então um estado de emergência fictício para tentar impor a reforma que no fundo visa reservar uma parte maior das verbas da seguridade social para a remuneração do capital financeiro – já fica hoje com 46% do orçamento público – e empurrar mais pessoas para a previdência privada.
Assim, o grande objetivo do governo com a contrarreforma da Previdência é favorecer o capital financeiro em duas frentes: garantir taxas de lucratividade cada vez maiores, mantendo a desoneração das grandes empresas, e transferir paulatinamente todo o montante das contribuições dos trabalhadores para o sistema de previdência privada.
Derrotar a contrarreforma do governo sob suspeita
Assim que se toma conhecimento sobre o teor da PEC 6/2019, resistências começam surgir entre os trabalhadores e na opinião pública em geral, o que começa a influenciar a posição dos parlamentares, governadores e prefeitos. A objeção mais direta no campo institucional veio dos governadores do nordeste que na última terça-feira, 13/03, reuniram-se em São Luis (MR) e se posicionaram quase que unanimemente contra a “reforma”.
Além disso, Deputados Federais e Senadores sabem que a tramitação da PEC não será um passeio, por isso só aceitam fazer o trabalho sujo depois que o governo conceder os cargos do segundo escalão prometidos. Também esperam a proposta de reforma dos militares – muito mais amena do que ao conjunto dos trabalhadores – através de Lei Ordinária para que iniciassem a tramitação da PEC 6/2019.
Mas o que pode de fato impedir a tramitação e a aprovação da PEC é a luta dos trabalhadores e dos oprimidos – particularmente o poderoso movimento de mulheres – que começa a dar provas de resistência. Além disso, depois da prisão dos assassinos de Marielle Franco, Bolsonaro está sob suspeita e não tem a menor condição moral de continuar à frente do governo enquanto esse crime político não for esclarecido.
Precisamos nessa semana jogar todo peso na convocação do primeiro Dia Nacional de Luta em Defesa da Previdência, 22/03, próxima sexta-feira. Esse Dia de Luta está sendo convocado em unidade com todas as centrais sindicais, mas, não podemos deixar na mão da burocracia sindical a convocação e organização dessa jornada de lutas.
É importante organizar pela base os trabalhadores dentro das empresas, escolas e locais de moradia, além de construir Comitês Regionais em Defesa da Previdência Pública para que a burocracia sindical não atrapalhe, freie ou sabote o processo de organização de um poderosa e ativa Greve Geral.
A vanguarda lutadora e independente da burocracia terá um papel decisivo na organização desse Dia de Luta. É preciso assim realizar a mais ampla discussão, convocação e organização dessa data de mobilização entre os trabalhadores, as mulheres e a juventude, organizando panfletagens nos principais locais de trabalho, paralisações onde for possível e caravanas para garantir presença massiva nos atos em todo país.